domingo, julho 05, 2009

Por Lisboa 23

"Carta Estratégica de Lisboa", um simulacro?

A venda de carros no Japão tem vindo a diminuir desde 1990. Hoje, menos japoneses possuem ou usam carro do que em 1984! O preço dos terrenos urbanos, por sua vez, desceu em média e paulatinamente 80% ao longo dos últimos 20 anos.

"A Carta Estratégica é um instrumento de orientação que nos permite navegar resolutamente entre 2010 —o centenário da República— e 2024 —o cinquentenário da conquista da liberdade, datas de enorme significado e importância. É para este futuro demarcado por datas simbólicas que a Carta Estratégica propõe um caminho coerente, afirmativo, de oportunidade, de descoberta." — in PEN (bloqueada!) oferecida na sessão de propaganda da dita "Carta Estratégica de Lisboa".

"A Carta Estratégica de Lisboa pretende dar resposta a um conjunto de questões com as quais a cidade de Lisboa se debate e que constituem os actuais desafios estratégicos no planeamento da Cidade, para perspectivar o futuro, planeando e concretizando aquilo que hoje, em conjunto, ambicionamos para Lisboa.

Há seis questões estratégicas que se colocam para o futuro da cidade:
  1. Como recuperar, rejuvenescer e equilibrar socialmente a população?
  2. Como tornar Lisboa uma cidade amigável, segura e inclusiva para todos?
  3. Como tornar Lisboa uma cidade ambientalmente sustentável e energeticamente eficiente?
  4. Como transformar Lisboa numa cidade inovadora, criativa e capaz de competir num contexto global, gerando riqueza e emprego?
  5. Como afirmar a identidade de Lisboa, num Mundo globalizado?
  6. Como criar um modelo de governo eficiente, participado e financeiramente sustentado?" —in sítio web do dita "Carta Estratégica de Lisboa"

Carta de Leipzig, adoptada pela União Europeia em 24-25 de Maio de 2007 (Documento integral - PDF) Principais recomendações:

I. Maior recurso a abordagens de política de desenvolvimento urbano integrado
-- Modernização das redes de infra-estruturas e melhoria da eficiência energética
-- Políticas activas em matéria de inovação e educação

II. Atenção particular aos bairros carenciados no contexto da cidade
-- Prosseguir estratégias para melhorar o ambiente físico
-- Reforçar a economia local e a política local de mercado de trabalho
-- Adoptar políticas activas em matéria de educação e de formação de crianças e jovens
-- Promover transportes urbanos eficientes e a preços razoáveis

Convidaram-me há algumas semanas atrás para integrar, na qualidade de independente e em posição inelegível, a lista de António Costa às próximas Autárquicas, pela Freguesia de Alvalade. Por respeito a quem me convidou, pela simpatia crítica que continuo a nutrir pelo hipotético sucessor de José Sócrates (embora tal virtualidade tenha vindo a ser incompreensivelmente exaurida pelo próprio), e sobretudo por uma incorrigível curiosidade, aceitei!

Claro que após a primeira reunião de estratégia local fiquei imediatamente com vontade de fugir. Não fugi, dei até a minha melhor colaboração —i.e., fiz perguntas e sugeri visões extra-terrestres aos socialistas que há anos perdem — para o PSD, claro!— as eleições em Alvalade, Campo Grande, São João de Brito e São João de Deus. Não me ligaram nenhuma. E um dos motivos da dissociação cognitiva evidente prende-se com a necessidade de atender previamente ao próprio programa eleitoral "do Costa". Creio que estavam, de facto, a referir-se à famosa Carta Estratégica de Lisboa. Convidado, lá me dirigi ao São Luís, para tomar conhecimento da inesperada arma eleitoral do PS contra Pedro Santana Lopes.

Não, não estou a fazer confusão! A proclamada Carta Estratégica de Lisboa, apesar de se apresentar como um instrumento de política municipal, é na verdade um documento partidário, projectado para esta campanha autárquica. A prova é que apenas vi funcionários e borboletas socialistas e pró-socialistas no São Luís.

Na substância, aliás, o que escrevo é verdade, pois a dita Carta começa por eleger as datas da implantação da República e da queda da ditadura Salazarista como principais marcos dum projecto estratégico para a cidade! Como se Lisboa tivesse que ser à força, ou por destino, Jacobina, Monárquica ou Demo-burocrática (como há quase 35 anos ocorre). Ora Lisboa já foi muitas outras coisas —Fenícia, Romana, Árabe, Cristã-guerreira, Cristã-aventureira, Castelhana, Cristã-fundamentalista, Cristã-assassina, Terramoto, Cristã-triste e ditatorial, Cristã revolucionária e alegre, Cristã Demo-burocrática como agora é. Lisboa será ainda tudo aquilo que o futuro reserva a este Grande Estuário. Perceber e respeitar esta natureza essencial e simbiótica é o dever de quem ama este vórtice de civilização. Não é isto, porém, que transluz da operação apressada, vaga, dissimulada e pueril a que chamaram Carta Estratégica de Lisboa.

Depois do oportunismo Jacobino irritante de quem associou esta tradução mal feita da Carta de Leibniz —aprovada pela União Europeia há mais de dois anos— às comemorações do centenário da República —pretexto evidente para renovada especulação imobiliária e enriquecimento ilícito—, o que acaba por desaguar, três meses e não sei quantos euros depois, da deliberação camarária de 8 de Abril passado, é uma proposta pífia, onde fundamentalmente se meteu debaixo do tapete o corpo declarado da acção e propósitos da actual vereação municipal, nomeadamente no que toca à prometida requalificação da Baixa Pombalina, à destruição do Porto de Lisboa, à construção assassina da Ponte Chelas-Barreiro, à idiota localização da futura estação ferroviária central de Lisboa no actual apeadeiro do Oriente, à tentativa frustrada de encerramento do Aeroporto de Lisboa e alarve transformação da Portela, e da chamada Alta de Lisboa, num Casal Ventoso cheio de Casinos, SPAs tailandeses e campos de golfe, recobrindo esta improvável estratégia de submissão política às máfias do betão e da banca, com um manto apressado de alfaces ambientais mal digerido e cabotino.

Dos três meses de pseudo-reflexão burocrática não resultou uma única ideia útil sobre os seis verdadeiros e principais problemas que afligem o presente e o futuro imediato da capital, a saber:
  1. o endividamento insustentável da cidade;
  2. os tremendos impactos económicos, sociais e urbanos da crise energética mundial provocada irremediavelmente pelo fim do petróleo barato;
  3. a atrofia burocrática do governo da cidade, resultado evidente do excesso de serviços e de pessoal com que o Bloco Central e o PCP entupiram a capacidade executiva da Câmara Municipal de Lisboa;
  4. a falta de uma rede metropolitana e citadina de transportes colectivos abrangente, eficiente e barata;
  5. a inexistência de um governo autónomo eleito para toda a região de Lisboa, como o que existe na Comunidade Autónoma de Madrid, em Londres, ou Pequim;
  6. a grande probabilidade de um terramoto semelhante ao de 1755 voltar a arrasar Lisboa, com particular gravidade nas suas zonas ribeirinhas (Parque Expo, etc.), antes de 2050.
Se compararmos estas questões com as seis perguntas escolhidas pelas luminárias contratadas para redigir a pseudo Carta Estratégica de Lisboa, dar-nos-emos facilmente conta de que há um abismo entre estas duas ordens de prioridades.

A primeira, é um rosário onírico de desejos. A segunda, delimita um quadro de verdadeira emergência municipal e regional. A primeira, pela sua vacuidade, ambiguidade e reflexo fugaz da Carta de Leipzig, deixa tudo na mesma —caso António Costa volte a ganhar as eleições — ou seja, deixa as mãos livres aos empreiteiros, banqueiros, cortesãos e burocratas do costume, para insistirem nas suas imorais e egoístas receitas, cujos resultados indecorosos estão à vista de todos. A segunda, pelo contrário, afirma que estamos numa situação muito parecida com uma guerra civil, com uma invasão estrangeira ou com um terramoto, mas sem tiros, nem, por enquanto, demasiadas casas a cair com as pessoas lá dentro!

"Lisboa terá que ser capaz de renovar a sua base de criação da riqueza orientando-a para o mercado mundial. Deverá ser capaz de desbloquear a sua mobilidade e adaptabilidade internas e externas, caminhando para o desenvolvimento de grandes redes metropolitanas, para a viabilização de plataformas de conectividade internacional." — in PEN (bloqueada!) oferecida na sessão de propaganda da dita "Carta Estratégica de Lisboa" (sublinhados meus.)

Embora o silêncio sobre o betão tenha tapado momentaneamente o discurso oficial do PS (estamos em vésperas de dois actos eleitorais de primeira importância), a verdade é que nada mudou aparentemente nas intenções, agora disfarçadas, da tríade de Macau, capitaneada por personalidades "socialistas" do quilate de Jorge Coelho (Mota-Engil, Martifer, etc.) e António Vitorino (Brisa, Banco Santander-Totta, etc.), secundada por cortesãos da laia de António Mexia, Henrique Granadeiro e Mário Lino, já para não falar do allgarve e recém apeado motorista do BES, Manuel Pinho. No relatório-síntese da proclamada Carta Estratégica de Lisboa, o que não se vê, está lá, apesar dos circunlóquios, escarrapachado! Basta ler com atenção, e ter em conta que um dos comissários de mais este projecto de Propaganda é o genial criador do aeromoscas de Beja, e recordista de estudos seja lá para o que for, Augusto Mateus. O aeromoscas de Beja, fruto da sua visionária presciência, está pronto, mas não se inaugura, pois é um fiasco monumental. Só servirá, no futuro, para estacionar as aeronaves da TAP que sobram na Portela, por falta de clientes, atrapalhando a azáfama das companhias Low Cost!

Os maiores problemas portugueses, e de Lisboa por maioria de razão, são efectivamente o endividamento criminoso da nossa economia, a predominância assassina do betão asfaltado e do automóvel individual (estimulado pelo sistemático e especulativo desordenamento do território e pela sub-urbanização das cidades), a falta de uma economia sustentável baseada na partilha de responsabilidades entre os diversos actores sociais, a falta de uma rede de transportes racional e acessível, o excesso de burocracia, a falta de transparência política e administrativa do Estado, a captura do Poder Judicial pela burguesia burocrática que há 30 anos perverte a nossa democracia, e a corrupção. Antes de atacarmos frontalmente estes problemas, nenhum outro cenário estratégico terá qualquer hipótese de vingar.

Quando José Sócrates se candidatou para substituir o governo PSD-CDS, prometeu não aumentar os impostos, e prometeu criar 150 mil novos empregos. António Costa prometeu tirar os carros de cima dos passeios e pagar as dívidas da cidade. Nenhum deles cumpriu, seja por excesso de optimismo nas promessas, seja porque a crise financeira mundial —há muito anunciada neste blogue, nomeadamente quando aqui ridicularizei incessantemente o aeroporto da Ota e outras aventuras do género— o impediu, agravando dramaticamente as expectativas para os próximos dez a vinte anos. E no entanto, teremos que mudar, e mudar muito rapidamente, de vida!

O exemplo do Japão, por muitas e diversas razões, deveria ser urgentemente estudado entre nós. No fundo, trata-se de um modelo em muitos aspectos parecido com os modelos de decisão que vigoram nos países nórdicos europeus (Dinamarca, Suécia, Noruega, Finlândia), mas com duas vantagens importantes: ter passado já por um longo período de depressão económica, ao qual se foi adaptando como pôde, e ter sabido incorporar nas soluções de mitigação da sua grave crise demográfica e económica, um verdadeiro e salvífico elemento tecnológico e cognitivo.

Quando visitei o Japão, em 2005, rendi-me àquele país em quatro aspectos que me tocaram especialmente: o sistema de transportes, a amabilidade dos funcionários públicos, municipais e das empresas privadas, a surpreendente limpeza e espectacularidade tecnológica das suas instalações sanitárias e a sofisticação culinária e estética da sua gastronomia. Lá, como na esmagadora maioria dos países civilizados, não se vêem carros estacionados em cima dos passeios, nas curvas, em dupla fila, em frente às portas das garagens, em cima das passadeiras de peões, ou esmagando logradouros e jardins onde os haja — como por cá é trivial, tolerado por polícias e autoridades municipais, e certamente bem-vindo pelo incorrigível oportunismo da nomenclatura partidária que dos nossos impostos e crescente empobrecimento se serve e vive.

Mas para lá destes sinais óbvios de civilização avançada, existe no Japão um pensamento estratégico racional cuja finalidade última é não apenas a felicidade do povo, mas também —et pour cause!— a produtividade global da sociedade japonesa, assim como a sua capacidade de competir com vantagem nos mercados internacionais. Vou dar alguns exemplos recentemente colhidos do blogue de Elaine Meinel Supkis —Culture of Life News—, para que se compreenda até que ponto o atraso de Lisboa na resolução, ou pelo menos mitigação, dos seus mais prementes e graves problemas, não é uma fatalidade, mas tão só resultado de uma entorse da democracia.

  • as autoridades japonesas de saúde pública começaram a medir regularmente o perímetro abdominal dos cidadãos, aconselhando-os, sempre que o mesmo ultrapassa os 86 centímetros, a diminuir o consumo de carne, a absorver vitamina D oriunda da exposição solar moderada, e a praticar exercício diário, nomeadamente insistindo nas caminhadas de 10mn de e para os transportes públicos;
  • todos os trabalhadores recebem das entidades empregadoras um subsídio de transporte quando optem por utilizar regularmente os transportes públicos, usando a combinação mais barata entre casa e emprego — ninguém é pois forçado a buscar uma casa cara perto do seu emprego, nem a recusar emprego por este estar demasiado longe de casa, produzindo-se por esta via um incremento sistemático das redes multi-modais de transporte público, bem como a sua crescente eficiência energética e conforto;
  • a posse de um automóvel está automaticamente indexada à demonstração pelo proprietário de que tem espaço próprio para estacionar a sua viatura no seu local de residência — se não tiver garagem, nem logradouro privado para estacionar, então terá que desistir da sua viatura particular, ou mudar de residência! O mesmo ocorre com o estacionamento junto às empresas: só em zona privada própria.
  • Como resultado destas medidas o Japão tem o melhor —quer dizer, mais amplo, rápido, eficiente, limpo e agradável—sistema de transportes do planeta. Tem uma taxa de sinistralidade rodoviária, fatal ou causadora de ferimentos graves, que é metade da dos Estados Unidos. E a sua população activa mantêm-se plenamente produtiva até aos 75 anos e vive com facilidade para lá dos 80.
  • A democratização do acesso à Banda Larga e o seu baixo preço permitiu ao governo japonês esperar que os 10% da população activa que actualmente comutam electronicamente pelo menos uma parte da sua jornada de trabalho passe já no ano que vem, para 20% — conseguindo por esta via uma importante redução dos consumos energéticos;
  • O sistema de alerta prévio de actividade sísmica intensa e terramotos, através da colocação de milhares de sensores pelo país fora, sobretudo nas cidades e redes de transportes, ligados a um computador central onde existem 100 mil cenários de abalos sísmicos, permite avisar a tempo os cidadãos, de episódios sísmicos graves ou catastróficos, ao mesmo tempo que trava automaticamente os comboios de Alta Velocidade.
  • Sempre que uma pessoa está constipada, vai a uma farmácia e compra um pacote de máscaras profilácticas, tal como nós por cá compramos lenços de papel. Não é preciso assistir ao espectáculo eleitoralista deprimente de uma ministra da saúde que nos tranquiliza pateticamente à medida que o número de casos de Gripe A se multiplica exponencialmente!

Há, como se vê, uma infinidade de coisas lucrativas, socialmente úteis e urgentes para fazer — sem precisarmos de qualquer dirigismo Jacobino. Os habitantes da Grande Lisboa, tal como do resto do país, precisam, antes de mais, de um Rendimento Pessoal Garantido (sem obrigações burocráticas paternalistas), de um sistema de transportes colectivo eficiente, universal e tendencialmente gratuito (suportado por verdadeiras e justas Parcerias Público Privadas), de um sistema de saúde preventiva, antítese do negócio escandaloso em que se transformou o direito universal à saúde, e, por fim, precisam de um plano nacional para saldar as suas dívidas.

Uma Carta Estratégica para Lisboa? Não! Do que precisamos é de um Livro Verde e de uma Carta Constitucional abrangendo a grande cidade-região de Lisboa e os grandes estuários do Tejo e do Sado. Precisamos, isso sim, de criar a Cidade Região dos Grandes Estuários, i.e., uma região autónoma, com o seu parlamento e o seu governo eleitos. Pensar Lisboa, sentado num cadeirão do teatro São Luís, não chega!



OAM 597 05-07-2009 18:00

quarta-feira, julho 01, 2009

Crise Global 68

Quem disse que a crise acabou?!

A Auto-Europa pode mesmo fechar, no Outono ou no Inverno deste ano. Por isso anda José Sócrates que nem uma barata a falar de carros eléctricos! A partir de Agosto vamos assistir a novos e preocupantes sinais de que a crise veio para durar — talvez uns vinte anos!!

A crise e as eleições

01/07/09 00:03 | Vital Moreira — Os recentes indícios, tanto lá fora como internamente, de que a crise económica global pode ter passado o seu pior e que o início da recuperação pode estar próximo, é um dado novo que vai ter seguramente impacto nas eleições parlamentares de Setembro. — in Económico.


Governo: Optimismo face a indicadores divulgados pelo INE
. Ministro decreta o fim da crise

"...como os indicadores têm vindo a acentuar, a crise está a atenuar-se" — Teixeira dos Santos, ministro das finanças de Portugal.

De acordo com os Inquéritos de Conjuntura às Empresas e aos Consumidores, ontem apresentados pelo INE, o indicador de clima económico aumentou nos últimos dois meses, interrompendo o acentuado movimento descendente que se registava desde Maio de 2008.

Segundo o INE, em Junho deste ano, os indicadores de confiança apresentaram uma evolução positiva na construção e obras públicas, comércio e serviços, e um 'ligeiro abrandamento' na indústria transformadora. O mesmo documento revela que o indicador de confiança dos consumidores 'continuou o movimento ascendente iniciado em Abril'. — in Correio da Manhã (30-06-2009).

Alguns bons artigos (1) vêm desmontando a euforia artificial dos analistas a soldo, governos e sobretudo especuladores que não só foram incapazes de prever a crise provocada pelo gigantesco esquema piramidal (Ponzi) da especulação bolsista —nos mercados imobiliários, nas moedas (FOREX) e sobretudo nesse monumental e longe de ser abafado buraco negro conhecido por Mercado de Derivados (Derivatives) (2)—, como se afundaram nela em grandes e espectaculares mergulhos suicidas! Os casos dramáticos abundam e vão continuar a brotar do lamaçal em que o Capitalismo neoliberal se transformou.

A crise do até agora sub-avaliado endividamento excessivo norte-americano, japonês e europeu, que deu lugar a uma economia criminosa de casino —onde o declínio da produção material e a deterioração das balanças comerciais pariram uma economia virtual de liquidez aparente e globalização do crime económico—, está longe de ter chegado ao fim. De facto, apenas começou a revelar as suas ameaçadoras entranhas! O que aí vem será bem pior, e atormentará os países ocidentais pelo menos até 2020, ou mesmo 2030.

Endividados até ao tutano, os países desenvolvidos (EUA, União Europeia, Japão, etc.) dificilmente encontrarão o capital e as energias para proceder à —por sua vez inadiável— mudança dos paradigmas energético e social das suas economias. Foi este simples facto, e não as divergências manifestas entre as araras do governo debilmente socialista de José Sócrates e a actual liderança do PSD, que acabou com o TGV, o NAL da Ota em Alcochete e a Terceira Travessia sobre o Tejo. Mais, duvido até que as anunciadas novas autoestradas e as barragens assassinas da EDP (capitaneada pelo fátuo Mexia) cheguem a ver a luz do dia nas próximas décadas.

Dentro em breve os cofres do Estado português estarão vazios, e nenhum banqueiro, por mais corrupto que seja, ou serviçal a soldo da maioria de momento, se atreverá a emprestar um euro que seja a um país falido. Os spreads entre os juros negativos do BCE e os juros punitivos que os PIGS já estão a pagar por qualquer novo euro que entre em Portugal, Itália, Grécia e Espanha, tornar-se-ão rapidamente insuportáveis. Ou seja, a hiper-inflação vem a caminho e desaguará em breve nas nossas economias — ainda que sob um disfarce até agora desconhecido.

Adeus, portanto, grandes investimentos públicos cujo impacto dominante seja aumentar apenas e mais o nosso já descomunal endividamento. Adeus empresários chulos, adeus burguesia burocrática, adeus construtoras preguiçosas e cada vez mais inúteis ao futuro da economia portuguesa. Adeus José Sócrates. Cuidado PS!

Há dois ou três anos que insisto nesta tecla, mas só agora a prova provada começou a ganhar forma. Mais vale tarde que nunca.

A próxima bomba da actual crise irá começar a deflagrar a partir de Agosto e ao longo de todo o ano de 2010. Trata-se da quase inevitável crise social que o fim dos prazos de vigência dos subsídios de desemprego causará à já pré-catastrófica situação de desemprego e falta de emprego na generalidade dos países europeus. O Welfare State que tantos admiradores criou em todo o mundo está gravemente doente. Sobreviverá a esta crise?

Uma medida que vem sendo proposta e poderá tornar-se inevitável no futuro —como meio expedito de aliviar os estados europeus da pressão política explosiva exercida pelo colapso económico-financeiro e social em curso— é a criação em toda a Europa (aliás, em todo o Mundo!) de um Rendimento Pessoal Garantido (Basic Income), abrangendo todas as pessoas maiores de idade, sem emprego, desempregadas ou condenadas ao regime intolerável do trabalho temporário. Ou seja, é preciso, primeiro, estancar a hemorragia social. E só depois lançar novas estratégias de reestruturação das economias, i.e. dos seus sistemas de produção, troca e consumo.


NOTAS

  1. O pior já passou? Um "sim" ecoa afoito no mundo dos negócios

    O endividamento em que vem se enredando os Estados Unidos e os outros países do centro e da periferia, na ilusão de assim driblarem a crise, é a bolha do momento. O que são as bolhas se não a geração de capital sem substância, seja pelo mercado, pelo Estado ou simultaneamente pelos dois pólos da sociedade da mercadoria? Isso mostra a impossibilidade do capitalismo em crise terminal desde os anos 80, sustentar-se sem produzir montanha de capital fictício. A expansão monetária global que ora assistimos para segurar a economia, à custa do endividamento dos estados e sem precedente na história do capitalismo, jamais será paga com parcelas de mais valia futura transformada em impostos.

    ...Quando o peso da dívida aumentar o risco de colapso dos estados sem condições fiscais de resolverem o problema do déficit orçamentário, as emissões fiduciárias continuam e a inflação surgirá galopante para infringir a sociedade, principalmente às populações desprotegidas, a fúria do "terceiro cavaleiro do apocalipse". Por enquanto este se mantém a espreita, esperando o momento oportuno para cavalgar cuspindo fogo em todas as direções. — in Rumores da Crise.


    Global systemic crisis in summer 2009 — the cumulative impact of three «rogue waves»


    As anticipated by LEAP/E2020 as early as October 2008, on the eve of summer 2009, the question of the US and UK capacity to finance their unbridled public deficits has become the central question of international debates, thus paving the way for these two countries to default on their debt by the end of this summer.

    At this stage of the global systemic crisis’ process of development, contrary to the dominant political and media stance today, the LEAP/E2020 team does not foresee any economic upsurge after summer 2009 (nor in the following 12 months). On the contrary, because the origins of the crisis remain unaddressed, we estimate that the summer 2009 will be marked by the converging of three very destructive « rogue waves », illustrating the aggravation of the crisis and entailing major upheaval by September/October 2009. As always since this crisis started, each region of the world will be affected neither at the same moment, nor in the same way. However, according to our researchers, all of them will be concerned by a significant deterioration in their situation by the end of summer 20094.

    This evolution is likely to catch large numbers of economic and financial players on the wrong foot who decided to believe in today’s mainstream media operation of “euphorisation”.

    LEAP/E2020 believes that, instead of « green shoots » (those which international media, experts and the politicians who listen to them kept perceiving in every statistical chart6 in the past two months), what will appear on the horizon is a group of three destructive waves of the social and economic fabric expected to converge in the course of summer 2009, illustrating the aggravation of the crisis and entailing major changes by the end of summer 2009... more specifically, debt default events in the US and UK, both countries at the centre of the global system in crisis. These waves appear as follows: 1. Wave of massive unemployment: Three different dates of impact according to the countries in America, Europe, Asia, the Middle East and Africa 2. Wave of serial corporate bankruptcies: companies, banks, housing, states, counties, towns 3. Wave of terminal crisis for the US Dollar, US T-Bond and GBP, and the return of inflation. — in Global European Anticipation Bulletin/ GEAB.


    John Mauldin's Outside the Box on The Casey Report's "A 20-Year Bear Market?"

    A roughly 80 year cycle has been repeating itself for centuries in the Anglophile world, broken up into four generations or turnings. We have begun what Howe called many years ago The Fourth Turning. — John Maulding.


    A 20-Year Bear Market?
    By David Galland, Casey Research

    In November of 1997, my partner and co-editor of The Casey Report, Doug Casey, wrote an article titled "Foundations of Crisis," which leaned heavily on the research of Neil Howe and the late William Strauss.

    Howe and Strauss have written many books on how generations determine the course of history and how they will shape America's future. Their forecasts on a wide variety of indicators have turned out to be amazingly accurate. They were among the first to predict (back in the late 1980s) the rise of Boomer-driven culture wars and the simultaneous rise of Gen-X-driven free agency and distrust of government. And they were completely alone back then in predicting, for the post-X "Millennial Generation" (a label they coined), a decline in youth crime and risk taking and an increase in youth civic engagement that would first become apparent around the year 2000. Guess what? For the last ten years, everyone has been noticing exactly these trends among teens and 20somethings.

    Howe and Strauss also made extensive predictions, based on generational aging, on how America's entire social mood would likely change, in dramatic fashion, during our current 2000-2010 decade. To quote Doug's prescient 1997 article, which was reprinted in Outside the Box late last year...

    "... an excellent case can be made the U.S. is approaching another time of secular crisis, a Fourth Turning, with an expected due date of 2005 – seven years from now – plus or minus a few years in either direction.

    The Stamp Acts catalyzed the American Revolution, the election of Lincoln catalyzed the Civil War, the Crash of '29 catalyzed the Depression/WW II era. What might precipitate the elements now floating in solution? The answer is practically any random event that's sufficiently traumatic. Any of the theses of current disaster/action novels and movies will do nicely. Perhaps the accidental or intentional release of a super plague vector. The crashing of an airliner into the Capitol during a joint session. An all-out assault on the IRS computers by an armed group – or perhaps the computers just melting down due to the Year 2000 Problem. Perhaps a financial disaster that cascades into the Greater Depression. In any of these, or a hundred other scenarios, the federal government would almost certainly act precipitously and with a heavy hand, which would bring on a whole other set of consequences.

    There's no way of telling where the Crisis will lead, or how it will end. That's going to depend not only on exactly who's in control, but what they do, who they're up against, and a hundred other variables we can't even anticipate.

    One thing that seems certain is that real crisis brings out strong leadership. Because of its age and size, it will come from the Boomer generation, and it will be in the mold of Roosevelt or Lincoln – both very dangerous precedents. The boomers in elderhood will be dogmatic, harsh, puritanical, and quite willing to burn down the barn in order to destroy whatever rats they see. Admix that attitude to a time resembling the Revolution, the Civil War, or WW II, overlain with today's ethnic strife, urbanization, financial overextension, and powerful, compact new weaponry in the hands of foreign fanatics out to teach the Great Satan a lesson and it's a real witch's brew.

    As eye-opening as Doug's predictions were, they brought us only to the onset of the current crisis. Consequently, we thought it both timely and important to check back with the source of much of the research he relied on. And so it was that I spent several hours talking with Neil Howe, co-author of the seminal work on generational cycles, The Fourth Turning, and, just recently, the subject of the DVD "The Winter of History." Howe is not just an historian, but also a Washington DC-based economist and demographer. While our conversation covered a great many topics, the overriding focus was on how things are likely to unfold from here.

    Many bullish readers won't be thrilled to hear Howe's latest findings about the future, but given his predictive track record, dismissing them out of hand could be a costly mistake.

    The summary outlook, according to Howe, is that we are in the very early stages of a 20-year period of economic and institutional upheaval – an era denominated by a crisis during which we'll likely witness the tearing down and reconstruction of many aspects of society as we know it. — in John Mauldin's Outside the Box.


    Green Shoots or Green Observers?
    By Ann Pettifor.

    (...) The latest cliché off the economic jargon production line is “Green Shoots of Recovery”. With governments having laid liberal amounts of fertiliser – in the forms of handouts, budget deficits, slashed interest rates and “quantitative easing” (another new piece of jargon for giving good money to bad lenders in return for bad assets) – they now report signs of economic recovery sprouting like alfalfa everywhere. — in Debtonation.


    No, the Recession is Not Over
    . By Ann Pettifor - 11th June 2009 - For the Guardian Online.

    A banker, Alan Clarke of BNP Paribas, citing a NIESR report, confidently tells the Guardian that the recession is over. Should we take the word of any banker – especially one that claims to be an economist – seriously?

    Given that the economics profession was blind-sided by the ‘debtonation’ of 9th August, 2007, I am deeply sceptical. Second, given that this is a banker-induced recession; that reckless and often fraudulent behaviour by bankers led to a loss of $60 trillion of yours and my wealth (in the form of pensions, equities, lost interest on savings, and lost income from job losses) last year, should we believe a banker’s particular spin on the crisis?

    (...) So, while it must be accepted that the economy seems to have slowed its freefall into the abyss; that there are now fewer jobs to lose and fewer businesses to go bust – there is no real cause for confidence in sustained, or even halting recovery. The real economic outlook remains grim.

    All G-7 economies will report negative growth in 2009 for the first time in 100 years, according to the Economist Intelligence Unit’s Senior Vice-president, Dr. Daniel Thorniley in a report to the EIU’s corporate network.

    (...) Foreign direct investment could fall globally by 45% this year, according to the same report, and corporate profits will decline by 20-25%. Global trade is down 25%, and the EIU predicts trade will be down by 10-15% by year end – the worst figure since 1945. — in Debtonation.


    Ignore the scaremongers... Watch out for the truly scary. By Ann Pettifor — 9th June 2009.

    (...) First: 23.6 million Americans out of work, or forced into part-time work. That is truly scary. 23.6 million Americans short of cash, unable to pay off debts; and unable to finance mortgages. 23.6 million Americans citizens that do not participate in the nation’s economic life, and are disillusioned and angry. Many will be devastated, prepared to self-medicate with alcohol or drugs, and many thousands will act out their rage and humiliation. These citizens do not pose a threat just to themselves, to their families and to society. They also pose a threat to the finance sector — because they will default on debts. The Mortgage Bankers Association’s report of record increases in delinquencies and foreclosures by those with prime mortgages is but one example of the impact of unemployment on the banks. To all those bankers celebrating their taxpayer-funded profits that must be truly scary.

    Second: a 40% rise in business bankruptcy filings in May. Small, medium and large businesses destroyed, economic capacity wasted, hopes destroyed, jobs lost. That’s scary.

    Third: a collapse in investment in the first quarter of 2009. According to Global Insight “real spending on equipment and software plummeted 33.8%, the largest percentage drop since the first quarter of 1958.” Green shoots when investment plummets furthest in 50 years? Without investment, there is no future for new economic activity, for green technology, for an end to job losses — for economic hope. — in Debtonation.


    Talk to the Fabian Forum: The Global Financial Crisis: How bad will it get? By Steve Keen. Debtwatch, Money dynamics, RBA. Published in April 13th, 2009.


    Eurozone Meltdown - Eight Scenarios how the unthinkable might happen. Euro Intelligence
    , Briefing Note Nº1, 3, April 2009.

    We have long dismissed the probability of a breakup of the euro area as idle talk among the chattering classes and speculators. Anyone who would have placed a bet on this proposition would have lost heavily during the first ten years of the euro’s existence. The financial crisis and the way European governments responded to it have changed the odds in our view. We still believe a breakup of the euro area to be unlikely, but the probability is no longer trivial. This is still true after the stock market rally in March 2009 and the ensuing temporary fall in risk aversion among investors. The danger is not over. The aim of this briefing note is to assess this probability in some detail.


    A Tale of Two Depressions

    ... the world is currently undergoing an economic shock every bit as big as the Great Depression shock of 1929-30. Looking just at the US leads one to overlook how alarming the current situation is even in comparison with 1929-30. — in Voxeau.


  2. The $700 trillion elephant. By Thomas Kostigen. MarketWatch. Published in March 6, 2009.

    SANTA MONICA, Calif. (MarketWatch) -- There's a $700 trillion elephant in the room and it's time we found out how much it really weighs on the economy.

    Derivative contracts total about three-quarters of a quadrillion dollars in "notional" amounts, according to the Bank for International Settlements. These contracts are tallied in notional values because no one really can say how much they are worth.


    Banks brace for derivatives 'big bang'
    Credit default swap dealers are cleaning up a dark corner of the derivatives market, but the risk of a blowup remains. By Colin Barr, senior writer. Last Updated: April 8, 2009: 3:45 AM ET (CNNMoney.com)

    U.S. commercial banks' net current credit exposure -- a measure used by regulators to estimate possible losses on outstanding derivatives contracts -- more than doubled last year, to $800 billion, the Office of the Comptroller of the Currency said last month. Total credit exposure, which reflects how derivatives exposure could rise over time, hit $1.58 trillion - up 50% from 2007 levels and in line with the 2006 all-time high.

OAM 596 01-07-2009 18:00

segunda-feira, junho 29, 2009

Premio Lemniscata

Obrigado!




O blog O valor das ideias atribuiu a O António Maria, o Prémio Lemniscata.

Este prémio foi criado "a pensar nos blogs que demonstram talento, seja nas artes, nas letras, nas ciências, na poesia ou em qualquer outra área e que, com isso, enriquecem a blogosfera e a vida dos seus leitores."

O António Maria agradece com natural regozijo a distinção.

Seguindo as regras deste prémio, 1 - O premiado deverá expor o selo no seu blog e atribuí-lo a 7 outros blogs que considere merecedores; 2 - O premiado deverá responder à seguinte pergunta: O que significa para si ser um Homo sapiens?

Assim, e por ordem alfabética, aqui ficam os blogues que decidi distinguir:

BioTerra — pela dedicação à casa comum
Do Portugal Profundo — pela forma como demonstrou ser possível ultrapassar a comunicação social que temos.
Futuro Comprometido — por ser um excelente repositório de referências sobre a crise ecológica global.
Ladrões de bicicletas — por ser um leitor de notícias colectivo muito animado estimulante.
Norteamos — por ser um defensor sistemático da região Norte, que sempre ouço.
O valor das ideias — por ser uma demonstração de activismo intelectual, imprescindível nos dias que correm.
Rumores da Crise — por ser um notável analista brasileiro das tendências suicidas do Capitalismo.

Quanto à pergunta, a minha resposta é: andar com a cabeça levantada!


OAM 595 29-06-2009 19:53

quinta-feira, junho 25, 2009

Portugal 112

Conversa entre Zapatero e Sócrates
Manuela Ferreira enterra Pinóquio e encosta Mexia às boxes

Prisa confirma negociações com a Portugal Telecom
"O grupo Prisa mantém actualmente negociações com a Portugal Telecom, empresa líder de telecomunicações em Portugal, para a definição duma aliança que reforce as posições competitivas das ditas empresas e favoreça as condições necessárias para impulsionar os seus planos de futuro da media Capital e potenciar as suas possibilidades de expansão nos mercados internacionais, particularmente nos países de língua portuguesa", lê-se no comunicado enviado à CMVM. — in RTP (25-06- 2009, 19:51)


Quinta fase da guerra para o controlo socratino da TVI
A reacção, ontem, 24-6-2009, à tarde no inoportuno debate parlamentar, do CDS-PP e do Bloco de Esquerda e, à noite na entrevista na SIC, de Manuela Ferreira Leite, contra a intervenção do Governo na «linha editorial» da TVI, mediante a compra de 30% da Media Capital pela governamentalizada PT, e a própria inábil resposta sub-consciente de Sócrates, tornaram muito difícil esta manobra para o controlo da restante comunicação social de significado. Desalojar José Eduardo Moniz e Manuela Moura Guedes, que era o objectivo declarado profusamente nos media, tornou-se agora muito complicado com o teste de algodão de demonstração do motivo da manobra: se Moniz for demitido/substituído/rescindido/removido isso expõe o propósito do negócio socratino-bávico.

Convencido da viabilidade do negócio, após a reacção suave em 23-6-2009 (em que avultou o silêncio dos media e... demasiados blogues) à notícia-balão desse dia no «i», Sócrates deu ordem para o negócio avançar rapidamente, sonhando ainda com a ilusão de reverter o resultado das europeias em vitória tangente em Outubro. Porém, a reacção política cresceu a um nível inimaginável, as casas de investimento, até ligadas a accionistas de referência (como o BES) deram parecer negativo, e puseram em causa o prémio político de preço adicional pela compra por 150-200 milhões de euros de uma quota que vale cerca de metade, e movimentos da sociedade civil ameaçaram com providência cautelar para impedir o negócio. — in Do Portugal Profundo (25-06-2009)

O jovem yuppie que gere o semi-monopólio de telecomunicações chamado Portugal Telecom, Zeinal Bava, meteu os pés pelas mãos durante uma entrevista de emergência dada a Judite de Sousa há poucos minutos na RTP. Omitiu sem graça nem jeito a verdade do frete encomendado por Zapatero e Sócrates, que era o de a PT comprar por um valor exorbitante e descaradamente político boa parte da Média Capital. O jovem Zeinal gaguejou, pois, ao povo português —que é dono da Golden Share da PT—, bem como aos demais accionistas da própria empresa — Caixa Geral de Depósitos e privados incluídos.

Como esclarece a Prisa e era óbvio para toda a gente, incluindo os socialistas avisados que começam a abandonar a nau Catrineta do papagaio Sócrates, houve mesmo uma tentativa relâmpago de assalto à TVI, a contento do senhor Zapatero, que tenta a todo o custo salvar o grupo de comunicação pró-socialista Prisa (com um passivo superior a 5 mil milhões de euros!), e para gáudio salivar antecipado de José Sócrates, que por este postigo inesperado vira a grande oportunidade de correr a pontapé José Eduardo Moniz, e sobretudo Manuela Moura Guedes, da paisagem mediática lusitana. Mas a manobra saiu-lhes, por agora (1), pela culatra. Em grande medida, diga-se de passagem, graças à estocada mortal que Manuela Ferreira Leite desferiu ontem à noite sobre o cada vez mais desamparado primeiro ministro "socialista".

Manuela Ferreira Leite, na entrevista que deu ontem a Ana Lourenço, confirma aliás as minhas expectativas e previsões de há um ano, ou mais: será primeira ministra de Portugal a partir das próximas eleições legislativas.

Muita coisa irá forçosamente mudar, começando pela inevitável dança de cadeiras tão ao gosto dos boys&girls do Bloco Central. António Mexia, o grande CEO da EDP —que tem um passivo acumulado de mais de 13 mil milhões de euros!!— já começou a ganir, e tem razões para isso. Vai mesmo ter que mudar de poleiro no fim do ano, e assim talvez sejam suspensas algumas barragens assassinas que o imbecil alegremente vem anunciando por aí como coisa consensual que nunca foi!

Mas voltando ao negócio partidário Prisa-Média Capital, não posso deixar de imaginar a conversa ao telemóvel entre Zapatero e Sócrates.

— Pepe, perdón, Jose, es decir Socrates, como estas?
— José?! perdon Sapateiro, quer decir, Zapatero, si soy yo... bueno, vamos andando... y tu?
— Socrates, tengo un problemita... de que te queria hablar un ratito. Tienes un minuto para mí?
— Claro que tenho un minutito para tí. Por supuesto! Nada de saúde espero!
— Algo de nuestra salud partidaria, más bien, no se si me entiendes...
— Oh sim, sim! Nostra salude partidaria anda un poco mala, para no dizer una mierda! Pero como posso ajudarte?
— Bueno, de echo, tu me puedes ayudar, y yo te puedo ayudar tambien!
— Ah síííííí.......!! Cuentame ya!
— La cuestión es la siguiente: el grupo Prisa, ya sabes, los dueños d'El País y de tu odiada TVI, y de muchas otras cosas más, tiene un problema de fondos bastante serio. Y ya sabes, tengo que ayudarlos. Dependo de ellos para casi todo y la cosa no esta nada fácil para nosotros. La Derecha, ya sabes, el PP, sube continuamente en las encuestas... y por este camino nos hecharan del poder. No puede ser! Vamos a tener el caos en España! Y el caos en mí país, ya sabes, es el caos en tu país...
— Es verdade! Pero no vejo como posso ajudarte... no tengo dinero ni para mandar cantar un ciego. No vas a pedirme dinero, no?
— Tranquilo Socrates, claro que no! La idea es otra. Bastaria que la telefonica portuguesa, es decir la PT, comprara una parte de Média Capital, que ahorita pertenence al Grupo Prisa, para que yo quedara bien delante de Juan Luis — Cébrian, lo conoces, no? — y tu, a la vez, podrás hechar a la chica esa que no te larga... Como se llama ella, que no me acuerdo?
— La put...., no, Manuela Moura Guedes, essa grande put..., perdón, gaja, te refieres, no?
— "Gaja", que significa "gaja"?
— No sei la palavra en español... "tipa"?
— Ah..., a una golfa te refieres, no?
— No, es más bien una put...., bueno una golfa, sí. Le gusta el golf, seguramente!
— Qué dices?
— No, nada, nada...
— Que te parece entonces la idea? Un buen negocio para los dos, o no es así?
— Claro, claro. Mataríamos uma put... e um coelho a la vez!
— Curioso, en mi país, tambien tenemos un refrán parecido: matar dos conejos de un tiro!
— Si, si es lo mesmo! Matar dois coelhos de uma cajadada!
— Cajadada?
— Sí, quer decir, con un cajado, ... un pau, ... un palo,, bueno es un proverbio alentejano!
— Proverbio, Socrates?
— Sí, un proverbio. No sabes lo que es?
— No....
— Bueno Zapatero, y que tengo que facer para sacar fora la put... que no me larga, de TVI?
— Si hablas con ese alentejano simpatico que manda en la PT...
— Quién, el jovem Zeinal Bava?
— No, Socrates! El alentejano ese, como se llama? Granada, o algo así....
— Hummmm... voy a preguntar y ya te llamo, vale?
— Haceme ese favor. Te agradezco un montón! Un abrazo!
— Controlar la TVI... com um único "palo"... Que grande ideia! Que grande dia! Vou contar ao Pedro! Tra-la-la... tra-la-la..., tra-la-la.....


NOTAS
  1. Ao contrário do que o Público anunciou, com manifesto exagero, horas depois deste post, na edição de 26 de Junho —Acordo para o negócio da PT com a TVI quase concluído. José Eduardo Moniz fica na estação—, o negócio morreu mesmo depois da entrevista a Manuela Ferreira Leite, secundada posteriormente pelas palavras sem regresso do Presidente da República.


OAM 594 25-06-2009 23:55 (última actualização: 29-06-2009 18:36)

quarta-feira, junho 24, 2009

Portugal 111

Investir, sim ou não?

Consórcios entregam hoje propostas finais
Mota-Engil, Soares da Costa e Brisa na corrida à Pinhal Interior
Os agrupamentos liderados pela Edifer, Mota-Engil, Soares da Costa e Brisa entregam hoje as suas propostas finais para a concessão Pinhal Interior. — in Jornal de Negócios (24-06-2009).

O défice orçamental da França oscilará entre 7 e 7,5% do PIB, em 2009 e ainda em 2010, i.e. mais do dobro do limite tolerado pela União Europeia. Em Portugal, quando se fizerem as contas a sério, constataremos que os 6% agora anunciados por alguns observadores económicos andarão bem mais perto das estatísticas francesas.

Portugal tinha em finais de 2007, entre 126 países analisados, a 19ª maior dívida externa bruta do mundo —$461,2 mil milhões—, a 19ª maior dívida pública do planeta em percentagem do PIB —64,2% (est. 2008)—, sendo que as suas reservas em divisas e ouro não iam além de $11,55 mil milhões, e em matéria de PIB per capita ($22.000) continua a cair, tendo ficado em 2008 na posição 54 entre 229 países considerados. Continuamos, por outro lado, a divergir perigosamente do PIB per capita espanhol ($34.660), superior ao nosso em 34,5%!

Tudo somado e contado, percebemos porque motivo o Bloco Central continua a apostar nas acessibilidades rodoviárias e em grandes projectos: precisamos de aumentar o PIB, por causa da Europa e sobretudo por causa da Espanha, e talvez haja inesperadamente alguma margem de manobra relativa para continuar por mais uma legislatura a pisar o pedal do endividamento — sobretudo se compararmos o calote lusitano com o estado pré-coma dos EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Espanha, Holanda, Irlanda, Japão, Suíça, etc..., ou com as extraordinárias dívidas públicas da Bélgica, Grécia, França e mesmo da Alemanha!

As eleições legislativas estão à porta e os programas eleitorais dos partidos terão que se pronunciar claramente sobre este decisivo capítulo do futuro programa de governo.

Por mim, tenho algumas ideias claras, mas não todas...
  • Um grande Plano Nacional de Eficiência Energética? Já!
  • Modernização da linha férrea portuguesa: bitola ibérica, electrificação onde falte e novos sistemas de sinalização? Uma decisão acertada e urgente!
  • Velocidade Elevada entre Badajoz e Pinhal Novo? Já!
  • Velocidade Elevada entre o Porto e Vigo? Já!
  • Electrificação e modernização da Linha do Douro (bitola europeia)? Já!
  • Ligação ferroviária do Porto de Sines a Badajoz? Só depois de construída as linhas de VE entre Badajoz e Lisboa, entre Porto e Vigo, e entre Aveiro e Salamanca!
  • Novo Aeroporto de Lisboa em Alcochete — adiar a decisão até 2014.
  • Nova travessia do Tejo —adiar a decisão até 2014.
  • Adaptação da Base Aérea do Montijo para base Low Cost? Já!
  • Novas auto-estradas do Centro e do dito Pinhal Interior? Não tenho posição definida... mas se a ideia é continuar a apostar no turismo... talvez... faça algum sentido...
  • Novas barragens hidroeléctricas, sobretudo as do Alto Douro e rio Tâmega? Nunca!
Que dizem o PSD e o Bloco de Esquerda sobre isto?
Ficamos à espera. Mas não por muito tempo.


OAM 594 24-06-2009 13:40 (última actualização: 29-06-2009 18:29)

terça-feira, junho 23, 2009

Crise Global 67

Bolha mediática prestes a rebentar

Está esclarecido o mistério da candidatura de José Eduardo Moniz à direcção do Benfica: o homem sabe que o porta aviões da TVI, isto é o Grupo Prisa, vai a pique, tal como o Titanic!


Dívidas obrigam Grupo Prisa a procurar sócios minoritários


O grupo Prisa, proprietário do jornal espanhol ‘El País’, já tem mais de cinco mil milhões de euros em dívida acumulada.

Esta situação obriga à procura de sócios para vender participações minoritárias dos seus negócios, incluindo da Media Capital, que detém a TVI e a editora Santillana.

Encarando as dificuldades em fechar o acordo com a Vivendi e a Telefónica para vender a Digital +, o grupo Prisa duplicou os esforços para procurar novos sócios para as suas empresas. — in Económico.

PT sozinha na corrida para comprar a TVI

A Portugal Telecom (PT) está em negociações para comprar 30% da Media Capital, a empresa que detém a TVI. Segundo o jornal Expresso, a Ongoing saiu do negócio por só aceitar uma posição maioritária. — in DN TV&Media.

Spain's Prisa to cut pay, dividends

MADRID, June 18 (Reuters) - Debt-burdened Spanish media group Prisa (PRS.MC) will ask staff to take pay cuts and is suspending dividends probably until 2011 as it steps up its restructuring efforts, its CEO said on Thursday.

The owner of newspaper El Pais did not rule out a capital hike, as shareholders approved last year, and will press to find business partners, Juan Luis Cebrian told the company's annual shareholders' meeting, as the group battles a heavy debt burden and a downturn in advertising.

... "We are going through an extremely difficult situation, but it is not desperate ... nor is the group's future threatened," Cebrian said. — in Reuters.

Quem haveria de dizer que a estrela luminosa do jornalismo e da comunicação mediática global saída desse extraordinário diário espanhol chamado El País não passa neste momento de uma estrela cadente? Que se passou? Deixou de fazer bom jornalismo? Perdeu audiências? Não resistiu às quebras de receita no sector publicitário? Cresceu demais?

Bom jornalismo e audiências não perdeu certamente. Basta comprar o El País do próximo Sábado, ou ouvir a Manuela Moura Guedes na Sexta, para concluir que continuam em alta em matéria de bem confeccionar notícias e capacidade de atrair audiências.

Já que no que se refere a receitas de publicidade, excesso de endividamento e grandes perdas em bolsa, a coisa muda de figura.

Depois de ter batido no fundo em 9 de Março deste ano (ver Bolsa PT), as acções da Prisa lá se foram levantando até chegar ao máximo deste ano —4,34 euros— no passado dia 8 de Junho, estando desde aquela data em queda. Mas o pior pode estar por vir! Há quem sussurre sobre o colapso a curto prazo do altamente endividado sector mediático espanhol, que como o resto da economia espanhola viveu anos de ouro à sombra da especulação imobiliária e bolsista, endividando-se ruidosamente, como se o mundo não tivesse fim, ou parte do explorado terceiro mundo e algumas ex-colónias europeias não tivessem emergido como pujantes economias do século 21, declaradamente indispostas a mimar por muito mais tempo um Ocidente consumista, cheio de retórica humanista, mas cada vez mais endividado e a perder hábitos de trabalho.

As televisões autonómicas espanholas estão virtualmente falidas. Mas sobretudo só agora começamos a conhecer os enormes estragos que a Internet veio e continuará a provocar no grande sistema mediático inventado na América, por volta de 1928, depois da publicação do decisivo e pouco conhecido livro Propaganda, de Edward Bernays, sobrinho de Sigmund Freud e fundador do conceito de Relações Públicas. O Broadcast big-brotheriano tem vindo a ser paulatinamente substituído por uma nova e radical turba multa mediática chamada Netcast, muito mais democrática e incontrolável, como se tem visto nos recentes conflitos bélicos internacionais e nas manifestações contra o autoritarismo e a criminalidade de Estado por esse mudo fora: Bush, Iraque, Líbano, Afeganistão, Irão, etc.

Há quinze anos que falo disto. Mas nem o Pinto Balsemão, nem alguns governos autonómicos do país vizinho ligaram às minhas palavras quando amigavelmente as transmiti em modo de aviso. O problema agora é que os governos estão falidos, sobretudo depois de injectarem biliões de dólares e euros nas economias americana e europeia para salvar a obsoleta indústria automóvel e as máfias banqueiras. Não vai haver igual benesse para salvar os jornais e as televisões, até porque haverá outras prioridades no futuro imediato: empresas energéticas com passivos gigantescos (veja-se o caso patético da EDP), sistemas de segurança social à beira do colapso e um incomensurável buraco negro financeiro chamado Derivados, ou Derivatives, cujo valor nocional, i.e. de potencial desastre, corresponde a qualquer coisa como quatro vezes o PIB mundial!

A única saída para evitar o colapso dos governos será muito provavelmente imprimir dinheiro à toa, de onde sairá, se o fizerem, uma inevitável onda de hiperinflação. Mugabe já deve estar a rir-se à gargalhada. Até lá, contem com mais falências —a bolha mediática pode ser a próxima a rebentar—, mais impostos, mais desemprego, escassez e subida generalizada do preço do dinheiro, hipotecas a subir, e uma viragem das vossas vidas como nunca imaginaram.

Sobretudo não dêem crédito aos governantes, que continuarão a mentir como mentiram até agora — isto é, com todos os dentes!


OAM 593 23-06-2009 23:07

sexta-feira, junho 19, 2009

Portugal 110

Cultura e Terceiro Sector
nas sociedades pós-contemporâneas


Sobre o muito badalado arrependimento cultural de José Sócrates, confessado pelo próprio no âmbito da humilde vestimenta que decidiu envergar após a recente e humilhante derrota eleitoral, republico o artigo que enviei à revista L+Arte de maio último. Sublinho entretanto que uma autocrítica sem consequências práticas não passa de um exercício de fingimento. Que eu saiba, o senhor Alexandre Melo, além de assessor cultural do PM foi um dos compradores exuberantes de João Rendeiro e da sua Ellipse Foundation, aliás tal como o ainda director do Museu do Chiado, Pedro Lapa. Dois casos flagrantes de incompatibilidades funcionais, conflito de interesses e comprovada incompetência. Um eclipse de ideias, de estilos e de carácter a que urge pôr termo.

Cultura e Terceiro Sector nas sociedades pós-contemporâneas
[Texto enviado à revista L+Arte em 17-05-2009 e actualizado em 30-05-2009]

Li recentemente uma notícia sobre a vontade do antigo ministro da cultura, Manuel Maria Carrilho (MMC), de voltar às lides. O ar de Paris fez-lhe bem! Ao contrário dos detractores da sua passagem pela política, eu alinho com muitos funcionários públicos modestos que por esse país fora o saúdam como o único responsável governamental que em muitas décadas assumiu sem receio a vontade de envolver o Estado na protecção e estímulo da actividade cultural. Ao que parece está com vontade de regressar, começando desde já por erguer de novo a bandeira do 1% do orçamento de Estado para o sector cultural. Seja bem-vindo. Mas eu vou mais longe: são precisos 3%!

Para este ano, o ministério da cultura contempla uma despesa de 212,6 milhões de euros (M€), para uma despesa global da administração central de 54.381,6 M€ — ou seja, menos de metade dos famigerados 1% recomendados por MMC (0,39%). Pois bem, eu proponho que sejam retirados ao conjunto dos demais ministérios, de forma proporcional, os 1.418,848 M€ que faltariam para o orçamento do ministério da cultura atingir em 2009 os 3% do orçamento da administração central que proponho para as artes em geral.

Porquê e para quê, perguntar-se-à. Respondo assim: para colocar a cultura onde ela terá que passar a estar nas sociedades pós-contemporâneas, fazendo o que nenhuma outra instância governamental está vocacionada e muito menos preparada para fazer, ou seja, responder de forma criativa às sociedades tecnológicas em formação, nas quais o "fim do trabalho" (Jeremy Rifkin) e a emergência do chamado "terceiro sector" são evidências, que a não serem convenientemente tratadas provocarão uma sucessão de colapsos sociais precedidos por crises financeiras e económicas de dimensões idênticas ou ainda mais dramáticas e prolongadas do que a que desde Fevereiro de 2007 começou por afligir o sistema financeiro, a economia e a sociedade dos Estados Unidos, estendendo-se depois ao resto do planeta.

Os programas de "novas oportunidades" e suposta formação profissional não passam de medidas paliativas ilusórias que em nada modificarão a tendência para a destruição estrutural do emprego assalariado induzida pela lógica intrínseca da produção tecnologicamente assistida em todos os seus segmentos: desde a extracção das matérias primas, à respectiva transformação, distribuição, promoção e venda.

O mesmo sucede nas políticas de subsídio à crescente e irrecuperável massa de desempregados atirados para o desespero pelas tendências cada vez mais acentuadas para a automação e desmaterialização dos processos produtivos, de gestão e da própria interacção social.

Ao contrário do que muitos crêem, a deslocação do capital e do trabalho para os países emergentes (Brasil, Rússia, Índia, China, etc.), em busca, num primeiro momento, da proximidade aos recursos naturais e aos baixos salários, tem um impacto meramente conjuntural na mudança dos termos de troca à escala global. Na China, a crise financeira e económica mundial irá provocar em 2009 o despedimento e migrações, no interior do seu vasto território, de mais de 20 milhões de pessoas (2). A ONU, por sua vez, prevê que o desemprego mundial possa chegar aos 230 milhões de pessoas em 2010!

Ora os governos continuam a responder a esta emergência como se a mesma fosse episódica e passageira, em vez de sistémica e porventura irreversível. Os instrumentos postos à disposição, por exemplo, do nosso ministério do trabalho e da solidariedade social, são completamente inadequados à natureza da crise em curso. Gerir pensões e tomar algumas medidas avulsas são caminhos para responder a problemas de uma época que já não existe.

A resposta à crise sistémica em curso terá forçosamente que ser uma resposta cultural. Quer dizer, uma resposta que convoque o melhor das energias criativas da comunidade para, em primeiro lugar, perceber a verdadeira causa das coisas, e depois, colocar em marcha uma verdadeira coligação de vontades, conhecimentos e energias criativas capaz de atalhar estruturalmente os múltiplos colapsos do sistema, avançando simultaneamente com modelos experimentais de interacção e cooperação social que possam ajudar a encontrar o paradigma social de que as sociedades cognitivas e tecnológicas em formação precisam para continuarem a permanecer humanas e civilizadas. Uma sociedade de velhos e alguns jovens estéreis guiada por "robots" e nano-tecnologias ao serviço de uma qualquer decrépita e corrupta aristocracia atulhada de dívidas — ainda que tais dívidas pareçam riqueza acumulada — não é o que todos queremos, certamente.

Embora os sistemas educativos sejam um desastre na esmagadora maioria dos países, e estejam aliás enredados numa cornucópia perversa de reformas cuja principal finalidade é reproduzir com os menores custos possíveis um descomunal exército de gente desempregada ou que jamais encontrará emprego estável, boa parte das mudanças que no futuro permitirão adaptar as sociedades humanas à radicalização da era tecnológica, muitíssimo mais distributiva do que a actual, passará por uma verdadeira revolução educativa. Só que esta revolução precisa de um campo experimental prévio, onde seja possível montar um acelerador de criatividade social. É aqui que eu vejo a nova importância das práticas culturais entendidas em sentido lato, i.e. abrangendo as ciências, as filosofias e as artes, naquilo que seria a re-fundação da veterana "techne". Ora, por incrível que pareça, são as vanguardas artísticas, da reflexão filosófica e da investigação científica quem melhor pode confluir para esta tempestade mental, de onde sairão, esperemos que a tempo, visões inovadoras e possíveis para esse mundo por vir a que chamo pós-contemporâneo.

Mas para que tudo isto ganhe momento seria da máxima importância fazer perceber aos políticos a necessidade de aceitarem reduzir o seu grau de omnipotência decisória, cujos resultados têm sido manifestamente medíocres. Pedimos-lhes um pouco de humildade neste transe difícil da civilização!

Que faria eu, enfim, aos 3% do orçamento da administração central atribuídos à Cultura numa próxima legislatura? Pois bem, faria isto: o primeiro 1% iria para a manutenção e divulgação do património cultural, abrangendo o longo período que vai desde os testemunhos originários da espécie humana até ao fim do século 20; o segundo 1% iria para a criação de um grande acelerador de partículas criativas multi-disciplinar, poli-nuclear, desburocratizado, autónomo e responsável, tendo por finalidade estudar e propor à sociedade modelos experimentais de convivência e simbiose criativa pós-laboral (considerando que o trabalho assalariado tenderá a desaparecer); e o terceiro 1%, finalmente, iria para o desenvolvimento de programas de responsabilidade social activa, orientados para o estabelecimento de parcerias entre os sectores público, privado e comunitário.

Por menos, não iremos lá.


NOTAS

  1. "Terceiro setor é uma terminologia sociológica que dá significado a todas as iniciativas privadas de utilidade pública com origem na sociedade civil. A palavra é uma tradução de Third Sector, um vocábulo muito utilizado nos Estados Unidos para definir as diversas organizações sem vínculos diretos com o Primeiro setor (Público, o Estado) e o Segundo setor (Privado, o Mercado).

    Apesar de várias definições encontradas sobre o Terceiro Setor, existe uma definição que é amplamente utilizada como referência, inclusive por organizações multilaterais e governos. Proposta em 1992, por Salamon & Anheier, trata-se de uma definição “estrutural/operacional”, composta por cinco atributos estruturais ou operacionais que distinguem as organizações do Terceiro Setor de outros tipos de instituições sociais. São eles:

    — Formalmente constituídas: alguma forma de institucionalização, legal ou não, com um nível de formalização de regras e procedimentos, para assegurar a sua permanência por um período mínimo de tempo.
    — Estrutura básica não governamental são privadas, ou seja, não são ligadas institucionalmente a governos.
    — Gestão própria: realiza sua própria gestão, não sendo controladas externamente.
    — Sem fins lucrativos: a geração de lucros ou excedentes financeiros deve ser reinvestida integralmente na organização. Estas entidades não podem distribuir dividendos de lucros aos seus dirigentes.
    — Trabalho voluntário: possui algum grau de mão-de-obra voluntária, ou seja, não remunerada ou o uso voluntário de equipamentos, como a computação voluntária." — in Wikipedia/ Terceiro Sector.

  2. 20 Million Laid-off Migrant Workers May Send China's Unemployment Rate to 10%. February 06, 2009 — China Stakes.com.

REFERÊNCIAS
  1. Religare
  2. The End of Technology
  3. Arte e Política


OAM 592 19-06-2009 16:56

quinta-feira, junho 18, 2009

Portugal 109

Verão quente, Outono perigoso

Vitorino explicou a Sócrates que o tempo não está para mais malabarismos, e que só reconhecendo a seriedade da crise actual se poderá dialogar seriamente com o eleitorado.




  • Cinco das dez maiores falências da história tiveram lugar nos últimos doze meses (1).
  • Esta é a maior e mais duradoura recessão mundial desde 1929.
  • Os mercados emergentes tornaram-se entretanto exportadores de capital.
  • A crise vai piorar durante este Verão e sobretudo no Outono, ao contrário do que sopram as sereias da banca e da especulação financeira através dos submissos órgãos de propaganda que financiam. Proteja-se da bolsa e dos bancos!!
  • As eleições legislativas e autárquicas portuguesas decorrerão num clima económico sombrio, que poderá provocar uma inesperada explosão social.
Se me tivesse lido com atenção, a tríade de Macau teria há muito explicado a José Sócrates que estamos no meio de um naufrágio, onde arengar propaganda barata em volta dos grandes hubs aeroportuários que faltam, pontes assassinas sobre o estuário do Tejo, altas velocidades ferroviárias, barragens criminosamente inúteis e mais não sei quantas autoestradas vazias, além de afastar o PS dos eleitores, acabaria por exibir o lado ridículo da inglória maioria absoluta que nos governa. Por falta de financiamento, por falta de procura, e sobretudo por causa do colapso inevitável do modelo económico e social das chamadas sociedades afluentes ocidentais, o business as usual acabou. Manuela Ferreira Leite percebeu-o a tempo. O PS precisou de uma humilhante derrota para lá chegar!

GEAB #36 — LEAP/E2020 believes that, instead of « green shoots » (those which international media, experts and the politicians who listen to them kept perceiving in every statistical chart in the past two months), what will appear on the horizon is a group of three destructive waves of the social and economic fabric expected to converge in the course of summer 2009, illustrating the aggravation of the crisis and entailing major changes by the end of summer 2009... more specifically, debt default events in the US and UK, both countries at the centre of the global system in crisis. These waves appear as follows:

1. Wave of massive unemployment: Three different dates of impact according to the countries in America, Europe, Asia, the Middle East and Africa
2. Wave of serial corporate bankruptcies: companies, banks, housing, states, counties, towns
3. Wave of terminal crisis for the US Dollar, US T-Bond and GBP, and the return of inflation.
As empresas financeiras, industriais e de serviços vão continuar a falir. Sobretudo aquelas que cresceram à custa da especulação bolsista e à sombra do endividamento público. A tentativa —promovida por políticas governamentais irresponsáveis— de as salvar, com mais impostos e mais endividamento público, só irá agravar uma situação já de si extremamente grave.

O bluff dos grandes investimentos serviu sobretudo, como aqui escrevi, para dissimular as reais dificuldades de empresas habituadas à mama orçamental pública e ao dinheiro barato oriundo da especulação bolsista. Empresas como a Mota-Engil, a Teixeira Duarte, a EDP e a generalidade da banca portuguesa estão literalmente à rasca. A falta de competitividade real, as imparidades, as ocultações de resultados, a falta de liquidez, as dívidas, os branqueamentos de capitais e as fraudes vão aflorar rapidamente perante um eleitorado incrédulo. Alguns ícones empolados da nossa economia e finanças não tardarão a colapsar. Os demónios soltaram-se. A bicha em direcção ao calabouço só agora começou a formar-se!

Mas como uma desgraça nunca vem só, temos que nos preparar para o colapso iminente do sector público —administração central, regional e local—, de onde decorrerão duas ameaças explosivas: a falência das cidades e o colapso do sistema de segurança social.

A massa de desempregados sem subsídios (porque a eles não têm acesso, ou porque se esgotou o prazo de validade do mesmo), é um actor altamente imprevisível nas eleições que irão decorrer neste Outono. Ou muito me engano, ou a tendência revelada pela recente pugna europeia vai acentuar-se entre nós. A substituição do Bloco Central —de todas as desilusões— por um fenómeno novo de bipolarização social e político-partidária matura, a meu ver, nas entranhas da crise de paradigmas que levou ao estertor do actual sistema partidário. Não creio, enfim, que o acto de contrição da actual maioria socratintas venha a ter os efeitos desejados.

NOTAS
  1. E as maiores fraudes também. O caso Madoff, e entre nós o "caso de polícia" chamado BPN, ou a estranha novela do Banco Privado, cujo presidente continua a passear a sua falta de vergonha nas barbas de quem já devia tê-lo enviado para junto de Rui Oliveira e Costa, não deixam de ser instrutivos. Mas a maior fraude da história parece estar ainda a caminho de ser revelada (obrigado André Cruz!) Trata-se da estranha e abortada tentativa de dois senhores japoneses de contrabandearem 134,5 mil milhões de dólares americanos —em US bearer bonds— na fronteira entre a Itália e a Suiça. Este valor equivale a mais de metade do PIB português, e cerca de três vezes o custo das olimpíadas de Pequim! Esta extraordinária história, e possível episódio da guerra financeira actualmente em curso entre quem tem dólares a mais e quem continua a imprimi-los com total descaramento e impunidade, acaba de levantar voo nos média. A nossa atarantada imprensa lá chegará, com o tempo...

    Smuggling Or Counterfeit-Printing?

    Ok, this was rumored several days ago, but now I can find actual news reports - at least, outside the US:

    Milan (AsiaNews) – Italy’s financial police (Guardia italiana di Finanza) has seized US bonds worth US 134.5 billion from two Japanese nationals at Chiasso (40 km from Milan) on the border between Italy and Switzerland. They include 249 US Federal Reserve bonds worth US$ 500 million each, plus ten Kennedy bonds and other US government securities worth a billion dollar each.

    Those sound like Bearer Bonds - at least the Kennedy ones do.


    Suitcase With $134 Billion Puts Dollar on Edge: William Pesek

    Commentary by William Pesek
    June 17 (Bloomberg) -- It’s a plot better suited for a John Le Carre novel.

    Two Japanese men are detained in Italy after allegedly attempting to take $134 billion worth of U.S. bonds over the border into Switzerland. Details are maddeningly sketchy, so naturally the global rumor mill is kicking into high gear.
    Are these would-be smugglers agents of Kim Jong Il stashing North Korea’s cash in a Swiss vault? Bagmen for Nigerian Internet scammers? Was the money meant for terrorists looking to buy nuclear warheads? Is Japan dumping its dollars secretly? Are the bonds real or counterfeit?


    ...Think about it: These two guys were carrying the gross domestic product of New Zealand or enough for three Beijing Olympics.

    ...These men carrying bonds concealed in the bottom of their luggage also would be the fourth-largest U.S. creditors. It makes you wonder if some of the time Treasury Secretary Timothy Geithner spends keeping the Chinese and Japanese invested in dollars should be devoted to well-financed men crossing the Italian-Swiss border.


    Strange Inconsistencies in the $134.5 Billion Bearer Bond Mystery

    J.S. Kim
    Seeking Alpha
    Thursday, June 18, 2009 (Prison Planet)

    Here’s yet another huge financial story that has been virtually blacked out by the US financial media. Although on the surface, this story appears to be a non-event, if we consider some of the released facts about this case, you will understand why I consider it to be a huge story. On June 8th, the Asia News reported the following story:

    “Italy’s financial police (Guardia italiana di Finanza) has seized US bonds worth US 134.5 billion from two Japanese nationals at Chiasso (40 km from Milan) on the border between Italy and Switzerland. They include 249 US Federal Reserve bonds worth US$ 500 million each, plus ten Kennedy bonds and other US government securities worth a billion dollars each. Italian authorities have not yet determined whether they are real or fake, but if they are real the attempt to take them into Switzerland would be the largest financial smuggling operation in history; if they are fake, the matter would be even more mind-boggling because the quality of the counterfeit work is such that the fake bonds are undistinguishable from the real ones.”

    ...Given that the discovery of $134.5 billion of bearer bonds in the suitcases of two Japanese nationals in Chiasso, Italy on the border of Switzerland qualifies as one of the largest smuggling operations in history, and given the various implications of such an act and the possible players involved, the silence regarding this huge story is simply stunning. It is not a huge story, per se, because of the counterfeiting operation, because accusations and revelations of massive money counterfeiting operations have occured in the past. It is a huge story, rather, due to all the inconsistencies of the story and the potential explanations that could explain these inconsistencies. The larger story at hand is, who are the players (nations) involved, and what was the intention of this likely counterfeiting operation?


OAM 591 18-06-2009 20:18 (última actualização: 18-06-2009 16:30)

domingo, junho 14, 2009

Portugal 108

A quem compete defender o Atlântico?
Governo dá acordo de princípio a treino de F-22 dos EUA nas Lajes
13.06.2009 - 09h26 Nuno Simas (Público)

É o primeiro passo para o acordo. O Governo comunicou ontem ao secretário da Defesa dos Estados Unidos, Robert Gates, a posição de princípio de Portugal favorável à utilização das Lajes, nos Açores, como base de treino dos F-22 e, no futuro, os F-35, disse ao PÚBLICO fonte governamental.

... Ainda os contactos eram apenas exploratórios e já o Bloco de Esquerda (BE) contestava mais esta possível cedência aos Estados Unidos. Os bloquistas açorianos chegaram a defender, no início deste ano, um referendo regional sobre o assunto nas ilhas.

Parece que o Bloco de Esquerda não tem emenda. Como qualquer pupilo maoísta desmiolado, ou trotsquista pueril, os bloquistas, ao que parece, tencionam lançar um cavalo de batalha contra o aluguer temporário de uma parte do estratégico espaço territorial lusitano à força aérea aos Estados Unidos da América. Como se a tontice destes oportunistas de esquerda não fosse já de si preocupante (e eu votei neles, para derrotar o papagaio Sócrates!), alguém do arquipélago açoriano, certamente embalado pela demagogia autonomista do oportunismo partidário em curso, sugeriu que o assunto fosse entregue a um referendo local!

A pergunta simples que devemos fazer ao senhor Louçã é esta: quem, na sua douta opinião, deve defender o Atlântico Norte da progressão chinesa? A Alemanha? A França? Espanha?! Ou pelo contrário, esse velho triângulo de interdependências, interesses comuns e alianças há muito formado pela Inglaterra, Estados Unidos da América e Portugal?

Dir-me-à, o douto Louçã, que é pela paz. Também eu — caramba!

Estará no entanto o douto Louçã a par da actual geo-estratégia chinesa? E se está, acha mesmo que é melhor encomendar a alma portuguesa a Nossa Senhora de Fátima e rezar uns tantos terços pela paz — em vez de termos uma política externa? Qual é a política externa do Bloco, douto Louçã? E já agora, fará o senhor alguma ideia das implicações que a inflexão atlantista operada pela Espanha, na célebre Cimeira dos Açores, poderá ter num Portugal distraído?

Gostaria muito de ouvir o douto Louçã responder a estas perguntas singelas, antes de começar, eu próprio, uma batalha de palavras contra o que temo ser a incapacidade congénita do actual Bloco de Esquerda para ganhar juízo.

O BE necessita urgentemente de uma nova geração de políticos de esquerda, pragmáticos, patriotas e europeístas, que rapidamente passe à frente e substitua os fossilizados ideólogos que continuam a prevalecer num partido que tem pela frente todas as condições para substituir um PS porventura vitimado de doença terminal. Quando o PS que foi corroído pelo egoísmo, pela imbecilidade e pela corrupção, sucumbir, estará o Bloco de Esquerda preparado para o substituir — ou sucumbirá com o próprio PS, vítima de incorrigível entorse genética?

Eu não digo que a proposta americana deva ser aceite estupidamente e sem negociação dura, como parece decorrer do anúncio patético do pateta que o papagaio Sócrates colocou no Ministério da Defesa. Antes pelo contrário! Defendo obviamente uma negociação dura, inteligente e estratégica com a América, sobretudo neste complicado momento de reajustamento das placas tectónicas dos poderes mundiais. A prioridade de um pequeno país como Portugal, a par da integração europeia, é saber tirar o máximo partido das suas vantagens específicas. Ora o maior activo estratégico de Portugal é o seu imenso e decisivo território marítimo, a que se segue o decisivo polígono da Lusofonia formado por Lisboa, Brazília, Luanda, Cidade da Praia e Maputo.

Portugal pode ser o honest broker de uma nova aliança atlântica global, ao mesmo tempo que medeia e modera a natural progressão de Pequim em direcção às fontes de abastecimento energético e alimentar. Deve por isso esmerar-se neste desígnio e tecer as necessárias redes de influência. Eleger cuidadosamente e potenciar os seus nichos de poder e saber é, em suma, algo que o país não pode sacrificar no altar da imbecilidade esquerdista de que o doutor Francisco Louçã não sabe ou não quer libertar-se.

A nossa pequenez acompanha há muito o nosso instinto de sobrevivência e a qualidade de uma diplomacia com mais de 800 anos. Não desvalorizemos este património por causa de uma qualquer distracção imperdoável, ou em nome do que não passou duma trágica moda intelectual: o chamado marxismo-leninismo.


OAM 590 14-06-2009 16:11

segunda-feira, junho 08, 2009

Portugal 107

A vitória do voto inteligente

O Bloco Central da ganância, dos interesses, da incompetência, da chulice e da corrupção começou a ruir nestas eleições europeias. O temível papão da "ingovernabilidade" agitado pelos opinocratas de serviço à nossa indolente democracia não é mais do que o feliz anúncio do possível fim de três décadas de democracia endogâmica e subdesenvolvida.

Em termos globais, todos os grupos partidários candidatos ao parlamento europeu (ver quadros) à excepção dos Verdes e dos micro-partidos (uma míriade de novas propostas) perderam votos. Por sua vez, em Portugal (ver quadros) o padrão partidário começa efectivamente a mudar a partir destas eleições: o Bloco Central desfaz-se, o PCP perdeu a terceira posição que detinha no espectro parlamentar, o Bloco de Esquerda substitui-o na posição de terceira força eleitoral do país, o CDS-PP tem uma recuperação notável e, tal como sucedeu no resto da Europa, os micro-partidos arrecadaram em conjunto uma apreciável votação: 12,2% no território europeu; 11,98% em Portugal (1). Os novos partidos estão a caminho!

Em termos simples, a principal conclusão a retirar destas eleições é esta: a cidadania europeia procura e quer alternativas justas, credíveis e viáveis ao pântano neoliberal que mergulhou a economia e as sociedades europeias num deserto de areias movediças sem fim à vista. Os partidos socialistas de Portugal, Espanha e Reino Unido sofreram todos derrotas humilhantes, por um e claro motivo: a traição neoliberal indecorosa às suas próprias ideologias e programas, em nome da avidez, da cupidez, do oportunismo pessoal e dos interesses mafiosos que se apoderaram destes partidos. Chegou a hora de correr sem cerimónias com esta canalha e restaurar a identidade da social-democracia socialista europeia.

As vitórias saborosas do PSD e do CDS-PP devem-se em grande medida aos protagonistas Paulo Rangel e Nuno Melo. Ou seja, é preciso renovar a classe política! A síndroma salazarista que pariu uma gerontocracia vazia de ideias, mas agarrada ao poder, nos partidos políticos e nas organizações sindicais, deve ser posta a nu em todo o espectro partidário e por esta via induzir a emergência de caras novas, e sobretudo de novos estilos de fazer política e de comunicar. Paulo Rangel e Nuno Melo revelaram-se dois bons exemplos do político por vir. Tal como estes novos protagonistas, Francisco Louçã tem sabido fazer a diferença. Vamos estar muito atentos ao comportamentos destas novas estrelas do firmamento partidário lusitano, pois da qualidade das suas prestações dependerá certamente a velocidade da renovação do actual espectro partidário.

Quem venceu estas eleições foi de facto um protagonista inesperado, mas que cada vez mais determina a marcha do regime: o voto inteligente. O voto inteligente é um voto táctico com uma intenção estratégica. Dou-vos o meu exemplo: votei no Bloco de Esquerda, quando em circunstâncias diversas teria votado no PS. Voltarei a votar no Bloco nas Legislativas que se aproximam. Mas já no que toca às eleições autárquicas, fiz ultimamente uma mudança de agulha: irei apoiar António Costa contra Santana Lopes. Será um apoio crítico e exigente, mas na verdade é-me intolerável pensar na hipótese do regresso do teddy boy das avenidas ao Largo do Município. Esta acepção do exercício do direito e dever de votar, como um jogo de estratégia, é uma tendência que tem vindo a consolidar-se e que supera em muito o mero "voto útil". Voltaremos ao tema em próximos textos.

O pinóquio que temos como primeiro ministro cerrou os dentes e tocou a reunir o governo. Duvido que surta grande efeito. Espero até que o dito des-governo comece a ruir em breve. Para já, há que travar a fundo a sua alarve subserviência diante dos agarrados à mama dos grandes investimentos (Mota-Engil, Teixeira Duarte, Grupo BES, Soares da Costa, Grupo Lena e quejandos). Chegou o momento de despachar o inenarrável fumador de cachimbo Mário Lino para qualquer lugarejo perdido do Atlas. Chegou o momento de travar o bacoco líder da EDP, António Mexia, da sua criminosa sanha barragista. Chegou o momento de colocar o actual governo, que dura inexplicavelmente para lá do tempo para que foi eleito, em velocidade de gestão.

Post scriptum — depois do PS, o maior derrotado destas eleições foram as vergonhosas empresas de sondagens que temos, a começar pelo canina Eurosondagem. A subserviência oportunista destas empresas de algibeira ficou escancarada. Só falta metê-las nos eixos da probidade profissional, quanto antes! Ou encerrá-las, como o Gago fez às universidades incómodas!!


NOTAS
  1. Os votos nulos e brancos registados nestas eleições em Portugal (6,53%) somados aos 11,98% de votos em micro-partidos — aproximam-se já dos 19% — ou seja, um partido virtual situado na terceira posição do nosso espectro eleitoral! Há por conseguinte muito caminho pela frente na reestruturação do sistema partidário português. Só faltam mesmo protagonistas credíveis.


OAM 589 08-06-2009 10:40 (última actualização: 16:01)

sexta-feira, junho 05, 2009

Portugal 106

Votar contra esta maioria absoluta

A esperada derrota de Sócrates anuncia dois novos líderes promissores nas respectivas áreas ideológicas: Paulo Rangel e Nuno Melo.

Para quem não sabe, eu explico: a reeleição de José Manuel Durão Barroso para o cargo de presidente da Comissão Europeia, e a campanha para levar Tony Blair ao posto de primeiro presidente do Conselho Europeu, fazem parte dum mesmo objectivo: impedir a concentração de poderes no eixo franco-alemão, e prolongar por mais algum tempo o predominância secular das potências atlânticas no seu conjunto.

A China tornou-se este ano o principal parceiro comercial do Brasil, o que, como bem observou o boletim do GEAB de Maio passado (1) na sequência de uma notícia do The Latin Americanist, assinala a deslocação efectiva do centro de gravidade da economia mundial, de Nova Iorque, Londres e Frankfurt para Xangai, Seul e Tóquio. Os grandes parceiros comerciais do Brasil foram sucessivamente Portugal, Inglaterra e Estados Unidos. A chegada da China a idêntico estatuto é um facto histórico que marcará porventura todo o século 21.

Ou seja, o oceano Atlântico é cada vez mais sulcado por aquela que será em breve a maior armada comercial e militar do mundo — a armada chinesa. Tal como os navios portugueses, holandeses, franceses, ingleses e estado-unidenses há muito sulcam os mares da China (alguns dos países, desde o século 15 que por lá andam), o reconstituído poder marítimo chinês, auto limitado desde 1415 (2), colocará ao longo deste século o Atlântico Sul e o Atlântico Norte sob uma pressão económico-diplomática sem precedentes.

Dito doutro modo, nunca como neste século as alianças anglo-portuguesa, luso-americanas e anglo-americana, fizeram tanto sentido. Delas depende em boa parte a acomodação graciosa do Ocidente ao novo Sol Nascente, e ainda a capacidade de lidar pacificamente com o novo Islão, sobretudo se a mole fundamentalista produzir os previsíveis efeitos de unificação estratégica em todo o Médio Oriente.

Por tudo isto, e tendo em conta o bom trabalho realizado até agora pelo ministro dos negócios estrangeiros do governo de José Sócrates, Luís Amado, não devemos confundir a necessidade urgente de substituir o actual primeiro ministro, ou mesmo as vantagens de acabarmos com a actual maioria absoluta do PS socratino, com entregar sem mais o ouro ao outro partido do imprestável Bloco Central.

A situação é complexa e não se compadece com juízos assassinos, nem populistas. Temos que ser mais prudentes nas avaliações políticas. Reafirmo, porém, algumas das convicções que me levaram a recomendar o voto nestas eleições europeias contra o actual PS e sobretudo contra a actual maioria absoluta:
  1. Embora aceite que a tríade de Macau tem uma geo-estratégia globalmente correcta para o país e para a Europa, não aceito de maneira nenhuma o seu indecoroso modus operandi.
  2. Rejeito em absoluto a deriva autoritária, intrusiva e policial da actual maioria socratina, de que as figuras indigentes de Augusto Santos Silva, Rui Pereira, Alberto Costa, José Magalhães e o idiota chapado da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, são exemplo intolerável que urge enviar para o grande caixote do lixo inquisitorial da nossa História.
  3. O Bloco Central é o grande cancro do actual regime, pelo que urge removê-lo e provocar a emergência de novos partidos (3), bem como o crescimento de alguns já existentes, como sejam o Bloco de Esquerda e o PP de Nuno Melo, e ainda a reforma interna do PS e do PSD. A surpresa churchilliana chamada Paulo Rangel é seguramente o facto mais relevante do ano eleitoral que agora começa. Vamos ver como termina....
  4. Recomendo o voto no PSD e no Bloco e Esquerda, para abater de vez a maioria socratina.
  5. A nuvem de novas propostas partidárias parece-me para já pífia, sem imaginação e sem protagonistas convincentes. Precisamos de um verdadeiro boomerang, ou seja de um Partido Pirata!
  6. Vou votar no Bloco de Esquerda, fazendo votos para que os seus principais protagonistas saiam do armário.
  7. Continuo a ser um socialista fora do baralho.


NOTAS
  1. In April 2009, China became Brazil’s leading trade partner, an event which has always announced major changes in global leadership. This is only the second time that this has happened since the UK put an end to three centuries of Portuguese hegemony two hundred years ago. The US then supplanted UK as Brazil’s leading trade partner at the beginning of the 1930s. — in GEAB #35.
  2. Curiosamente o ano da conquista de Ceuta pelos portugueses, anglo-iluminados por Philippa of Lancaster!
  3. Suécia: Partido Pirata tem quase garantido assento no Parlamento Europeu (Público.) E por cá, que falta para criar novos partidos? Criatividade? Coragem?

OAM 588 05-06-2009 12:26