segunda-feira, março 20, 2006

Strategic Foresight Group 3

As Grandes Questões do Nosso Tempo
- Por Sundeep Waslekar

Parte 3: O Futuro do Poder

Estive recentemente em Waterloo, uma pequena cidade universitária a uma hora de Toronto, Canadá, onde o meu amigo John English criou recentemente o Center for International Governance (CIGI), com o apoio de Jim Balsillie, fundador do sistema de comunicação Blackberry. O pretexto foi a conferência CIGI sobre poderes emergentes.

Os profes presentes na conferência assinalaram a chegada da India, Brasil, África do Sul e México à categoria de novos poderes emergentes, baseando-se nos respectivos PIB e despesas militares, deixando escapar a realidade que os rodeava. (Os profes mencionaram também a China, mas eu creio que a China deixou de ser uma força emergente. Ela já é, de facto, uma grande potência.) O Canadá, onde decorreu a conferência, está a emergir como um dos grandes centros de inovação do futuro. Arnold Toynbee e Paul Kennedy demonstraram nos seus aturados livros de história que os países que inovam ascendem, ao passo que aqueles que se excedem nas despesas militares, declinam. A queda do Império Romano 977 anos antes do império Bizantino, apesar da maior distância face a agressores externos, ficou a dever-se, precisamente, a um atraso na inovação tecnológica e à qualidade da governação.

Os canadianos parecem entender isto bem, sem reclamarem para si qualquer estatuto de futura grande potência. Waterloo, por exemplo, fornece anualmente o maior de número de recrutas à Microsoft. Os fundadores da Blackberry, por sua vez, montaram o CIGI, um Instituto de pesquisa dedicada à física teórica, esperando que o Canadá venha a conseguir no futuro grandes conquistas nesta área do conhecimento. O Governador de Ontário toma pessoalmente conta do departamento de investigação e inovação, dando um sinal inequívoco sobre a importância deste dossiê na política provincial. A região de Waterloo no seu todo vem sendo promovida como um centro de investigação e desenvolvimento, e o governo provincial vai onde for preciso para atrair investimentos de companhias de alta tecnologia.

Os canadianos lançaram-se numa revolução tranquila pelas energias limpas. Encontrei o meu amigo Nicholas Parker ao fim de vários anos e fiquei a saber que ele criara o fórum Cleantech Venture para atrair investidores de capital de risco e pequenos empreendedores para o campo das energias não poluentes. Assim, as empresas de energia da big Alberta estão hoje centradas na investigação e desenvolvimento das energias renováveis e limpas do futuro. Pouco depois da minha visita a Waterloo, o governo federal anunciou uma nova política de imigração destinada a atrair talentos de outras partes do mundo.

Além do Canadá, a ênfase na inovação vem dos países Escandinavos. Voei de Toronto para Estocolmo para jantar com o Dr. Michael Nobel, o presidente da Nobel Family Society. Esta família promove os prémios Nobel em memória de Alfred Nobel, tio bisavô do Dr. Michael Nobel. O Dr. Michael Nobel prepara-se agora para criar um prémio em memória de Ludwig Nobel, o seu bisavô e irmão de Alfred. Este novo prémio servirá para distinguir a inovação nos domínios da energia.
É claro que os prémios Nobel são apenas um símbolo do espírito inovador na Escandinávia, onde várias grandes e pequenas empresas confluem na investigação tecnológica e na inovação governativa. A Nokia e a Eriksson são famosas no sector das comunicações. Mas existem muitas outras experiências tecnológicas a decorrerem nos domínios da agricultura e da energia, ou da medicina e da metalurgia.

Curiosamente, o Canadá, a Suécia, a Noruega e a Finlândia, com menos de 1% da população mundial, desempenham um importante papel nas instituições de governação global. Os seus naturais detêm posições chave no Banco Mundial e em várias agências das Nações Unidas. O seus representantes dirigem muitas comissões multilaterais e comandam a agenda global de modo mais efectivo do que a maioria dos restantes países, excepto, claro está, os poderes P-5 do Conselho de Segurança. À medida que aqueles países ganharem a corrida tecnológica, a sua relevância no comércio transnacional e na economia global não deixará de crescer.

A China já percebeu a importância deste tipo de desenvolvimento. Há alguns meses atrás, o governo de Pequim seleccionou cinco universidades para serem elevadas ao patamar das melhores universidades do mundo — incluindo Harvard, Stanford e MIT —, com especial destaque para os campos científico e tecnológico. Os chineses sabem que os produtos baratos podem ajudar a atrair o investimento e a aumentar as receitas no curto prazo mas que não são a solução no longo prazo. É claro que os chineses têm um grande problema com a sua população agrícola. Se fracassarem na gestão do mesmo, as aspirações de momento poderão desaparecer num milhar de revoluções.

Para aqueles que querem escalar o pico da ciência e tecnologia, muito precisa ainda de ser explorado e inventado. Sir Martin Rees, um cientista britânico de topo, publicou um pequeno livro, Our Final Century, onde enumera aquilo que falta ainda à ciência conseguir. De acordo com este cientista, é ainda demasiado cedo para concluir que existem apenas três dimensões ou que a Terra é o único planeta com biosfera. Conhecemos a história do tempo a partir do segundo momento após o Big Bang, mas falta-nos descobrir o que aconteceu no primeiro momento e imediatamente antes dele. Sabemos como foi criada a vida, de uma célula para entidades multi-celulares e destas até à explosão Cambriana, mas desconhecemos como foi que a primeira célula apareceu. Mais incisivamente, Sir Martin alerta para o facto de ser ainda demasiado cedo para concluir que a nossa evolução biológica já chegou ao fim. Com o advento da biotecnologia e da nano-tecnologia a espécie humana poderá evoluir para uma espécie de semimáquinas capazes de proliferarem e autoreproduzirem-se no espaço (outer space), e talvez mesmo para lá do sistema solar.
Algumas destas ideias podem não passar de ciência-ficção, mas às vezes aquilo que parece impossível imaginar pode tornar-se realidade mais cedo do que esperávamos. Em 1937, um notável grupo de cientistas americanos foi incapaz de prever, o nascimento da energia nuclear, dos computadores e da Internet.

Com um historial destes na previsão do futuro, algumas das fantasias de Sir Martin poderão deixar de o ser mais cedo do que pensamos. Os países e companhias que rompem no campo das energias novas, baratas e limpas, ou na viabilização da vida no espaço (outer space), ou na medicina holística (all purpose mediciene) estão vocacionados para serem mais influentes do que os países que procuram ganhar um pedaço de território aqui e ali, ou se entretêm a derrubar um ou dois pequenos ditadores. Se andasse à procura dos protagonistas dos futuros jogos de poder, preocupar-me-ia menos com sistemas de armas dispendiosos, que se tornarão provavelmente obsoletos antes de serem usados, e manteria os meus olhos e ouvidos bem abertos, tentando descortinar o que andam a fazer os institutos de física teórica na invisível cidade de Waterloo.



Sundeep Waslekar é o Presidente do Strategic Foresight Group, sediado em Mombaim. É um especialista em governação, conflitos, segurança global e regional, economia política — e filosofia política.

OAM #112 20 MAR 2006

segunda-feira, março 13, 2006

Strategic Foresight Group 2

 

Minoo by Hejab Iran

As Grandes Questões do nosso Tempo


- Por Sundeep Waslekar

Parte 2: O Futuro de Deus

O Strategic Foresight Group utiliza o modelo dos 4-G para analisar o futuro dos países. Três dos 4 Gs — Crescimento (Growth), Governação (Governance) e Geopolítica (Geopolitics) — representam mecanismos tradicionais responsáveis pelo destino das nações. O quarto G — Deus (God)—, tem vindo a assumir uma importância crescente nos nossos cálculos.

A ressureição de Deus um século depois de Friedrich Nietzsche ter declarado a sua morte é notável. As expectativas divinas têm andado para cima e para baixo. Nos anos 60, a Time perguntou se Deus não teria mesmo morrido. No fim do milénio, parece que ressuscitou.

A crescente importância de Deus está associada nos dias que correm às mudanças que têm vindo a ter lugar no mundo islâmico. A Turquia elegeu um partido de inspiração religiosa 80 anos depois de ter abolido o Califado. Reparei, numa visita à Turquia no princípio deste ano, que muitas mais mulheres levavam lenço sobre a cabeça (hejab) do que quando fui pela primeira vez àquele país, na década de 80. Em particular, as mulheres associadas à estrutura do poder, tais como esposas de ministros importantes ou responsáveis do partido no poder, ou do governo, mostram-se mais determinadas nas suas preferências pela tradição. Isto não pretende sugerir que a Turquia de hoje é o Irão de ontem. O Primeiro Ministro Erdogan está particularmente empenhado na adesão do seu país à União Europeia, e convidou o Papa a visitar a Turquia em 2006.

O Irão continua a ser governado por um colégio de Ayatollahs e o poder destes foi reafirmado em recentes eleições legislativas e presidenciais. No Iraque pós-Saddam, a religião é uma força importante na política. Quando o Afeganistão escreveu a sua constituição, o aspecto mais significativo da mesma foi ter assegurado a natureza confessional do estado. No Sudeste Asiático, podemos observar uma adesão religiosa crescente na sociedade, apesar de os malaios terem derrotado um partido religioso nas eleições. No Sudeste e na Ásia Central, o Hizb-ut-Tahrir (ver NT) encontra-se em pleno crescimento. Paquistão e Bangladesh, claro, continuam a ser as cidadelas do extremismo religioso.

Enquanto as mudanças em curso no mundo islâmico, acentuando o papel de Deus na sociedade e na política, são destacados pela imprensa mundial, o grande crescimento da popularidade de Deus está a ter lugar nos Estados Unidos e nas zonas cristãs da América Latina, Ásia e África. Estima-se já que 70 a 80 milhões de americanos, de um total populacional de 300 milhões, são evangélicos. Um dos nossos investigadores está a estudar esta evolução e apresentará a seu tempo as conclusões sobre as prospectivas de Deus na sociedade e na política americanas.

As forças religiosas questionam o próprio espírito da constituição americana. Thomas Jefferson e os seus pares passaram um mau bocado para separar a religião da política. O confinamento da religião à esfera privada é aliás considerado um factor essencial da popularidade da Igreja nos Estados Unidos, quando comparada com o respectivo declínio na Europa. Agora, os novos fundamentalistas querem que a religião regresse à vida política e social pela porta grande.

A grande questão do nosso tempo é saber se a política americana será nos próximos 20-30 anos governada por Deus. À medida que a economia americana entrar em declínio e o papel dos EUA como líder da comunidade dos valores for sendo rejeitado pelos europeus ocidentais, canadianos e outros, será que os Estados Unidos virão a precisar de uma âncora para a sua sociedade na forma de uma religião?

Enquanto os Estados Unidos e muitos dos países islâmicos fornecem cenários credíveis para novos regimes de inspiração divina, muitas outras zonas do mundo viraram as costas a Deus, especialmente nos sectores políticos e societários. Na Europa, os partidos democrata-cristãos encontram-se em declínio. O sucesso de um deles na Alemanha tem que ver com a economia e não com a religião. Na India, o Partido Bhartiya Janata, referência do nacionalismo indu (Hindutva), debate-se com a opção de abandonar a política da religião como forma de ganhar a política do poder. Na China, Falun Gong é apenas um movimento espiritual e social. Não tem nada que ver com a introdução da religião na política, ainda que os chineses paranóicos gostem de pensar o contrário. No Japão, Nepal e em muitos outros estados asiáticos, os jovens estão a virar as costas à religião.

Porque estará Deus a ganhar terreno nos Estados Unidos, América Latina, partes de África e países islâmicos, quando as populações noutras zonas do mundo estão felizes com a manutenção da religião na esfera privada? Terá que ver com o facto de os países onde Deus está a invadir a esfera política serem precisamente aqueles onde as condições económicas das populações estão em declínio? Ou será que tem antes que ver com o facto de estes países estarem a sentir uma perda relativa do seu poder e precisarem por isso de algo em que acreditar? Será Deus apenas uma cobertura para dinâmicas políticas e sociais em curso?

No princípio deste ano, fui convidado a proferir uma comunicação em Davos sobre Deus e a democracia. Sobre se efectivamente Deus ama ou não a democracia, as tendências mais recentes indicam que, de George Bush a Ayatollah Khamenei e de Gerry Adams a Pervez Musharraf, todos os líderes que acreditam em aproximações autoritárias aos jogos de poder parecem estar a empurrar Deus para a praça pública. O Futuro de Deus fora do domínio íntimo da nossa espiritualidade dependerá assim do fracasso dos economistas e do sucesso dos autocratas e imperialistas. Nietzsche usou a figura de um homem louco para declarar a morte de Deus. Se estivesse hoje vivo, usaria provavelmente a figura de um ditador para declarar o seu renascimento.




Sundeep Waslekar é o Presidente do Strategic Foresight Group, sediado em Mombaim. É um especialista em governação, conflitos, segurança global e regional, economia política — e filosofia política.
NT - Grupo extremista que defende o regresso do Estado Islâmico.
IMG - Minoo by Hejab Iran. Sítio muito sugestivo dedicado à moda islâmica.


OAM #111 13 MAR 2006

domingo, março 12, 2006

Strategic Foresight Group 1

 

Crash by Paul Haggis

As Grandes Questões do nosso Tempo


- Por Sundeep Waslekar

Parte 1: Os Negócios e a Periferia

O Strategic Foresight Group é um resultado da globalização do século 21. Existimos por causa da Internet, das chamadas telefónicas baratas entre continentes, e das baixas tarifas aéreas (ainda que estas últimas possam vir a mudar se se verificarem as expectativas de o barril de petróleo chegar aos $100). Nós temos colaboradores espalhados pelo mundo preocupados com a mudança dos paradigmas globais, e não apenas com as suas próprias geografias. Um deles, o Dr. Frank-Jurgen Richter é um alemão, que vive em França, tem escritório na Suiça, e é especialista em assuntos chineses. O Sr. Sompal tem casa na India e trabalha no Rwanda, viajando constantemente de um país para o outro, para ajudar o Presidente Kagame a fazer reviver a agricultura naquele país. Eu conferencio regularmente com SAR o Príncipe Turki al Faiçal, Embaixador Saudita no Reino Unido, agora provavelmente a caminho dos Estados Unidos, nas reuniões do Forum Económico Mundial em Davos e no Mar Morto. O Sr. Graham Watson, um líder político britânico do Parlamento Europeu em Bruxelas, colabora connosco no envolvimento do Primeiro Ministro Erdogan e outros dirigentes a Turquia.

Nós não somos de forma alguma os únicos a beneficiar da globalização. Recentemente Semu Bhatt, minha asistente especial, que adora ir às compras, decidiu interromper uma conferência sobre terrorismo para espreitar o comércio local. Verificou então que as lojas de Colónia estavam cheias de produtos oriundos da India e dos países vizinhos desta.

Quando o furacão Katrina atingiu a costa do Golfo nos Estados Unidos, o Sri Lanka contribuíu para os esforços de auxílio, ao mesmo tempo que procurava a mediação norueguesa para resolver o seu conflito étnico interno.

Se a globalização gera um mundo de oportunidades, porque é que atrai ao mesmo tempo uma oposição tão virulenta? Há alguns meses, a BBC World Television organizou um debate em telefónico sobre a globalização. Durante os 60 minutos do programa, todas as chamadas sem excepção testemunharam sentimentos de repúdio pela globalização e pelas instituições que a simbolizam.

Para entender as contradições do mundo actual, precisamos de um novo quadro analítico. Cada país individualmente e o mundo no seu conjunto, estão divididos entre a classe dos negócios (business class) e a periferia (periphery). A classe dos negócios inclui as pessoas com acesso à Internet no trabalho e a electrodomésticos nas suas cozinhas, que viajam de avião com regularidade (embora não necessariamente na Classe Executiva) e que têm amigos ou contactos profissionais no estrangeiro. Os restantes formam a periferia. A periferia pode em alguns casos subdividir-se em múltiplas categorias. Mas apenas a classe dos negócios participa na globalização.

Na India e na China — dois países projectados como as novas estrelas da economia mundial — a classe dos negócios constitui uns meros 2.2% e 6% das respectivas populações. Nos Estados Unidos corresponde a 60% da população. Em países como o Bangladesh, Urzebequistão e Nepal, a classe dos negócios não vai além de 1%. Em Dhaka, no Bangladesh, surgiu um novo centro comercial — Vasundhara. À primeira vista ele projecta a imagem de uma economia vibrante, com um mercado dinâmico. Mas observando para lá da superfície apercebemo-nos de que os frequentadores de Vasundhara são senhores feudais oriundos do mundo das ONGs, exportadores, funcionários governamentais e políticos. Um habitante típico e feliz do Bangladesh trabalha numa fábrica de vestuário, rodeada de arame farpado, ganhando um dólar por dia. Um Bangladeshi tipicamente infeliz trabalha num arrozal sonhando com um emprego numa fábrica de vestuário rodeada de arame farpado.

A globalização está confinada à classe dos negócios de cada país. As pessoas incluídas na classe dos negócios de cada país conjugam-se entre si formando uma classe dos negócios global. Cuidam umas das outras para além das suas lealdades nacionalistas e religiosas. Por exemplo, as montras das lojas de Milão exibem alguns dos produtos mais luxuosos que se conhecem. Não muito longe, em colónias residenciais, os italianos vivem em casas degradadas. Claro está que estes italianos não têm dinheiro para comprar imagens de moda (fashion statements). Aquelas lojas existem para fornecer a classe dos negócios que voa de Seul e Dubai para Moscovo e Lagos.

Não é apenas em países como a India e a China ou a Russia e a Nigéria que a pequena e espevitada classe dos negócios causa ressentimento na periferia. Também na Europa e nos Estados Unidos a periferia está confrontada com uma negligência crescente. No entanto, a periferia nestes países é comparativamente menor. Nos Estados Unidos, por exemplo, em 112 milhões de famílias, 30 milhões ganham menos de $2000 por mês. A maioria destas últimas não tem automóvel nem máquinas de lavar. Estamos a falar de um em cada quatro americanos. O furacão Katrina com a sua acção devastadora expôs a situação económica de alguma desta gente que vive na periferia. A verdade sobre a vida de um terço das pessoas que vivem na Louisiana, Mississipi, Kentucky e ainda na maioria das regiões interiores dos Estados Unidos é desconhecida. Mas não é preciso ir tão longe para entendê-la. Basta uma visita aos vários segmentos da classe trabalhadora no Cairo ou Rio de Janeiro.

Uma das grandes questões do nosso tempo é saber como se poderá tornar a globalização relevante para a população marginal do mundo. Não é uma questão de escassez ou de abundância de recursos. Nem sequer é uma questão de distribuição de recursos. A verdadeira questão é saber como criar uma real liberdade de oportunidades, a partir da qual as pessoas, e não apenas o capital, possam retirar benefícios efectivos da sua participação na economia.

Se a globalização das oportunidades continuar divorciada dos mais de 80% das pessoas que vivem na periferia global, a globalização do risco expandir-se-á. Nos últimos dez anos, durante os quais a globalização assistiu a uma expansão sem precedentes, os terroristas infligiram mais de 20 mil ataques. Hoje, existem mais de 190 grupos terroristas, autónomos e fortemente organizados, espalhados pelo mundo, quase tantos quantos os países pousados no assador das Nações Unidas. Esses grupos atraem recursos humanos e financeiros de uma manta de criminosos e extremistas e simpatia de um espectro muito mais amplo de desesperados. Claro está que muitos grupos terroristas são apenas braços executivos de homens poderosos que instrumentalizam as ideologias e o desemprego para protestar contra o poder da classe dos negócios, embora o que realmente desejam seja poder para eles mesmos. A periferia é espremida por todos os lados — pela classe dos negócios global que a negligencia e pela classe criminosa global que lhe presta atenção para depois a explorar severamente.

Nós, no Strategic Foresight Group estamos conscientes da responsabilidade de pertencer à classe dos negócios global. Dedicamo-nos a projectar os pormenores da desgraça, causada pelas distorções dos padrões do crescimento e da governação, para assim alertar os decisores políticos, desejando ardentemente que eles façam tudo para provarem que estamos errados. Mas sabemos também projectar a esperança quando os decisores políticos optam por trajectórias correctivas. É uma estranha tarefa a nossa. Mas vale a pena se for um contributo para reduzir o abismo entre a classe dos negócios global e a periferia.



Sundeep Waslekar é o Presidente do Strategic Foresight Group, sediado em Bombaim. É um especialista em governação, conflitos, segurança global e regional, economia política — e filosofia política.

OAM #110 12 MAR 2006

sábado, março 11, 2006

Cavaco Silva 7

Cavaco eleito presidente

Novo Presidente espevita Sócrates



Convenhamos que o destino estava escrito nas estrelas. Cavaco foi sempre, como escrevi, a melhor expectativa de Sócrates. E irá fazer os impossíveis para que o actual Governo acelere sem hesitações o ciclo político de reformas estruturais iniciado (o seu a seu dono) por Durão Barroso e Manuela Ferreira Leite.

O país progrediu muito desde 1974, sobretudo depois participar na fundação da União Europeia e ter beneficiado, a partir desta decisão histórica, de um caudal de financiamentos estratégicos único e provavelmente irrepetível. Cometeu, porém, alguns erros de palmatória: deixar crescer desmedidamente um Estado burocrático, preguiçoso, inculto, incompetente e irresponsável; alimentar de forma escandalosa o clientelismo político-partidário; fechar os olhos à corrupção; denegar os métodos e os meios à consolidação de um Estado de direito; permitir, em suma, e à laia de compensação pelos pecados anteriores, a persistência de um social-porreirismo nacional, segundo o qual todos nos habituámos a não ter regras de conduta nem respeito pelas leis. A confrangedora ineficácia da Justiça e os carros em cima dos passeios são dois elucidativos exemplos do nosso indisfarçável terceiro-mundismo.

Como se não bastasse tudo isto, e ao contrário, por exemplo, do que sucedeu em Espanha (durante a decisiva década de Filipe González), faltou a Portugal uma verdadeira estratégia pós-revolucionária. As diferenças no interior da classe política, e sobretudo a sua extrema imaturidade, foram realmente um obstáculo intransponível a uma definição oportuna das nossas prioridades pós-ditatoriais e pós-colonais. Mário Soares esteve empenhado na transferência de poderes para a sociedade civil democrática (partidos políticos, imprensa, sindicatos, etc.) Cavaco apostou sobretudo na recuperação dos atrasos económicos estruturais e no aligeiramento do excessivo peso do Estado na comunicação social e nalguns sectores económicos. Guterres, contrariando todas as expectativas, deixou o País à deriva. E Durão, goste-se ou não da sua ida para Bruxelas, começou o novo ciclo pedagógico da nossa ainda atribulada democracia (quando a comparamos com os modelos europeus mais avançados, claro). A partir do seu breve governo foi-se impondo a ideia de que o nosso destino colectivo tem que basear-se num regime de verdade, de transparência informativa e de pragmatismo, na co-responsabilização institucional e cívica dos diversos actores do nosso dia-a-dia, e numa rigorosa separação dos poderes (de que o escândalo em redor das práticas de pedofilia com menores da Casa Pia viria a ser o caso simultaneamente mais traumático e revelador). A José Sócrates cabe agora prosseguir (e não deixar regredir) o novo ciclo estratégico da democracia portuguesa. A situação económica e sobretudo financeira do País, mais a falência anunciada do nosso sistema de segurança social, empurram-no na direcção certa. Mas porque os remédios a administrar são amargos e inesperados, ele precisa de um bom apoio na Presidência da República. Quer dizer, de um apoio exigente, do género, quando o Primeiro Ministro diz - mata!, o Presidente diz - esfola!

Mas haverá também, na filosofia social-democrata da actual Presidência da República, algumas diferenças críticas importantes relativamente à filosofia liberal da Presidência do Conselho de Ministros. Por exemplo, a necessidade de respeitar os parceiros sociais na definição de uma estratégia económico-social activamente participada, ou a assunção de que o futuro do País não depende mais de trabalhadores analfabetos auferindo salários de miséria, nem de regimes laborais sem lei nem roque. Por outro lado, na política externa, haverá que afinar o discurso de Freitas do Amaral na direcção certa, isto é, na direcção do nosso original atlantismo (pois não devemos confundir a América com um imbecil chamado George W. Bush). Em matéria de Defesa, por sua vez, teremos que enveredar rapidamente por uma especialização militar que faça sentido (i.e. que passe necessariamente pelo reforço dos meios militares navais e aero-navais). Por fim, no que respeita à dignidade do regime democrático, precisamos de regras claras e de transparência processual na angariação e afectação dos recursos humanos e materiais da Administração Pública.

Eu creio que Cavaco Silva não vai deixar de lutar por estes desideratos. E creio também que o fará usando métodos bem mais eficazes do que as litanias em que acabaram por transformar-ser boa parte dos discursos presidenciais.

Sintomas:

1 - Parlamento electrónico? A miserável página web do nosso parlamento nem sequer publica o discurso de posse de Cavaco Silva, resolvendo antes destacar apenas o discurso do Presidente da Assembleia da República e uma exposição patética chamada "O Poder da Arte". Bem vistas as coisas, um parlamento com menos 10% dos actuais deputados libertaria os recursos (e as necessidades....) suficientes para a criação de um mais do que necessário e eficiente parlamento electrónico. Não haverá uma verbazinha no Plano Tecnológico para isto?
2 - Falta de chá: houve uns deputados mal educados que resolveram ficar sentados e não aplaudir o discurso da tomada de posse do novo Presidente da República. Mas nem por isso faltaram aos pasteis de bacalhau pagos pelos nossos impostos (e bem!) durante a recepção oferecida pelo novo presidente no Palácio da Ajuda.
3 - Já viram o novo sítio Web da Presidência da República? Vale a pena compará-lo com pastelão do Plano Tecnológico

O-A-M #109 11 MAR 2006

quinta-feira, março 02, 2006

2006 crise mundial 1

Maomé e a próxima guerra nuclear

A monetary, financial and economic tsunami will break on the planet at the end of this month. — GEAB n.2

In the past 5 years the dollar has been devalued in terms of gold by more than 50%. — Ron Paul (congressista republicano dos EUA pelo Estado do Texas).

Over the past five years, the US borrowed more money from the rest of the world than it did in its entire history from 1776 to 2000. — GEAB n.3/SFGate — San Francisco Chronicle — 27/11/2005


O Laboratório Europeu de Antecipação Política Europa 2020 (LEAP/E2020) acaba de divulgar partes de um relatório explosivo sobre a situação mundial, no âmbito do qual poderemos encontrar uma explicação menos óbvia para a recente crise das caricaturas de Maomé. Se estas análises se revelarem correctas, seremos levados a rever boa parte das suposições sobre a origem da recente agitação muçulmana contra uns pobres caricaturistas dinamarqueses. Em vez de uma inexplicável e desproporcionada reacção popular contra os inofensivos desenhos publicados meses antes da reacção em cadeia ateada pelos fundamentalistas islâmicos, teremos que colocar a hipótese de tudo não ter passado de uma complexa manobra de provocação, à semelhança do ataque às Twin Towers, destinada a preparar a opinião pública europeia e ocidental para um ataque nuclear preventivo contra o Irão (a desencadear eventualmente por Israel e pela Turquia, sob a direcção camuflada dos Estados Unidos e com a anuência da França e de vários outros países europeus.) Esta hipótese tremendamente paranóica (ou realista...) tornaria Bin Laden, não no grande herói da Jihad islâmica, mas no grande provocador do Ocidente, cujo fim imediato é garantir a qualquer preço o acesso ilimitado ao que resta das reservas petrolíferas do Médio Oriente.

Alguns extractos do artigo:
20 a 26 de Março, 2006: Irão-EUA, início de uma crise mundial de grandes proporções, ou o Fim do Mundo Ocidental tal como o conhecemos desde 1945

O Laboratório europeu de Anticipação Política Europa 2020, LEAP/E2020 estima haver 80% de probabilidades de na semana de 20 a 26 de Março se iniciar a mais importante crise política mundial desde a queda da Cortina de Ferro em 1989, associada a uma crise económica e financeira com um alcance comparável à crise de 1929. Esta última semana de Março de 2006 será assim o ponto de viragem numa série de desenvolvimentos críticos, de que resultará a aceleração de todos os factores conducentes a uma grande crise, independentemente de qualquer intervenção militar, americana ou israelita, contra o Irão. Se esta intervenção militar vier a ocorrer, a probabilidade de assistirmos a uma crise de grandes proporções seria então de 100%, de acordo com o LEAP/E2020.

O anúncio desta grande crise resulta da análise de decisões tomadas por dois actores cruciais da presente tensão internacional: i.e. os Estados Unidos e o Irão;

- por um lado temos, para 20 de Março de 2006, a decisão iraniana de abrir em Teerão a primeira bolsa de petróleo afixada em Euros, acessível a todos os produtores da região;

- e por outro lado, a decisão da Reserva Federal Americana de interromper a publicação, a partir de 23 de Março de 2006, dos chamados M3 (o mais fiável indicador do número de dólares em circulação no mundo).

Estas duas decisões combinadas constituem os indicadores, as causas e as consequências de uma transição histórica em curso entre a ordem criada depois da Segunda Guerra Mundial e o novo equilíbrio em gestação desde o colapso da URSS. A sua magnitude, assim como a respectiva simultaneidade, catalizarão todas as tensões, fraquezas e desiquilíbrios acumulados em mais de uma década por todo o sistema internacional.

Os investigadores e analistas do LEAP/E2020 identificaram 7 crises convergentes que as decisões da última semana de Março de 2006 catalizarão e transformarão numa crise geral, afectando todo o planeta nos campos político, económico e financeiro, bem como, muito provavelmente, no campo militar:

1. Crise de confiança no dólar
2. Crise dos desiquilíbrios orçamentais norte-americanos
3. Crise petrolífera
4. Crise da liderança norte-americana
5. Crise do mundo Árabe-Muçulmano
6. Crise de governabilidade mundial
7. Crise de governabilidade europeia

O processo completo de antecipação desta crise vem descrita pormenorizadamente nos próximos números da edição confidencial do LEAP/E2020 - the Global Europe Anticipation Bulletin, e em particular no número de 16 de Fevereiro de 2006. Estas edições analisarão detalhadamente cada uma destas 7 crises, e proporão um conjunto de recomendações destinadas às várias categorias de actores envolvidas (nomeadamente governos e empresas), bem como um conjunto de conselhos estratégicos e operacionais destinados especificamente à União Europeia.”


Actualização [2006.03.03]: do boletim entretanto recebido, uma passagem realmente preocupante sobre a actual situação económica dos EUA:

Para poder financiar a sua dívida, ou melhor as suas dívidas, os Estados Unidos absorvem 80% da poupança mundial. Esta situação obriga a que a sua economia (taxas de juro, produtividade...) permaneça significativamente mais atractiva perante os capitais internacionais do que qualquer outra economia do mundo (e que a confiança na sua economia e na sua moeda se mantenha forte). O controlo exercido pelos EUA e a sua correia de transmissão inglesa (que está agarrada ao destino do dólar devido aos montantes de créditos e activos nesta moeda) sobre os meios de comunicação internacionais, e em particular sobre a imprensa económica e financeira especializada tenta prolongar esta situação, literalmente uma matéria de segurança nacional. E não deixa de ser significativo que estes mesmos média não mencionem nem a Bolsa de Petróleo Iraniano nem a suspensão da publicação dos agregados M3. Tal como se viu na crise iraquiana, mas também em numerosos casos científicos, como por exemplo o do aquecimento global, a administração Bush mantem uma relação deveras complexa com a verdade, pelo que muitos analistas começam a duvidar da fiabilidade das estatísticas económicas e financeiras dos Estados Unidos. Estaremos na eminência de conhecer um caso ‘Enron’ de magnitude global? Será que o mundo está à beira de descobrir, tal como ocorreu com os números da União Saviética depois da Queda da Cortina de Ferro, que as estatísticas são de facto uma fraude? Não tarda muito para tirar a limpo.

Evitar o pânico

A crise aguda de civilização em que estamos metidos aconselha duas coisas: estar atento e evitar o pânico. A melhor receita para a sobrevivência passa por suprir o atraso e desinformação sistemáticos dos média corporativos com informação proveniente de outras fontes, independentes ou simplesmente distintas do ópio disperso pelos média convencionais. Por outro lado, aconselha-se vivamente muito cuidado na tomada de decisões de investimento de médio e longo prazo. O mais provável é que bens como a terra fértil e as zonas habitacionais próximas dos nós de comunicações se venham a valorizar tremendamente nos próximos anos. Para já, o investimento em metais preciosos (como o ouro e a prata) são bem mais seguros do que quaisquer aplicações financeiras e planos de poupança/reforma e seguros de saúde. O mesmo ocorrerá infelizmente com todos os bens e serviços associados a emergências bélicas, sanitárias e sociais decorrentes do previsível agravamento da presente crise mundial. Num cenário de catástrofe financeira mundial, é de prever a falência de centenas de bancos e sociedades de investimento, já para não falar da falência de algumas dezenas de Estados (congelamento de salários e pensões de reforma, despedimentos nas Administrações Públicas, subidas vertiginosas de impostos, derivas nacionalistas, etc.) Se a crise vier a ocorrer, como se teme, não será fácil evitar o pânico. Mas se estivermos alerta, poderemos evitar o pior, e prepararmo-nos com coragem para uma longa e dolorosa metamorfose. O perigo de uma nova escalada bélica por parte da Administração Bush é eminente. Ninguém sabe, porém, quais poderão ser as suas consequências para o resto do mundo. Fala-se, cada vez mais, de um possível ataque nuclear contra Teerão! O melhor mesmo é começarmos desde já uma grande campanha contra a nova guerra em perspectiva, exigindo aos governos europeus que assumam as suas responsabilidades pela paz, ajudando ao mesmo tempo os EUA a partilharem as suas dificuldades com o resto do mundo.

LINKS

O boletim do LEAP/E2020 publica-se em Inglês e Francês, esperando-se para breve versões em Espanhol e Alemão.
LINK 1 (artigo citado na versão francesa e comentários);
LINK 2 (versão inglesa e comentários)
LEAP/E2020 PUBLIC COMMUNICATION, March 15, 2006. USA-Dollar-Iran / Confirmation of Global Systemic Crisis end of March 2006

Outras fontes sobre o mesmo tema:

Petrodólares, Petroeuros e a Dívida dos EUA

Asia must prepare for dollar collapse [Al Jazeera, Tuesday 28 March 2006]
Masahiro Kawai, the ADB's head of regional economic integration, said on Tuesday: ‘Any shock hitting the US economy or the global market may change investors' perceptions given the existing global current account imbalance.
(...) Our suggestion to Asian countries is: Don't take this continuous financing of the US current account deficit as given. If something happens then East Asian economies have to be prepared.’

Discontinuance of M3 [March 23, 2006 - H.6 (508)]
As previously announced on November 10, 2005, the Board of Governors ceased publication of the M3 monetary aggregate with today's release. The Board also ceased publishing the following components: large-denomination time deposits, repurchase agreements (RPs), and Eurodollars. The Board will continue to publish institutional money market mutual funds as a memorandum item in this release.

US$: Forget Iran, the problem's at home - by John Berthelsen, Asia Times online [20-3-2006]
Of all the things that could wreck the US dollar - and there are many - the projected Tehran oil bourse, which is tentatively scheduled to open on March 20 to trade Iran's crude and other petroleum products in euros rather than US dollars, is probably not among them.
The much greater threat to the US currency is the US current account deficit, which ballooned to 7% of gross domestic product in the fourth quarter of 2005. The announcement drove the euro up to 1.202 against the US dollar as skittish traders renewed their concerns about the world's fiat currency.

How China creates American jobs. - by John Plender, Finantial Times [20-3-2006]
(...) I find it hard to believe that we are about to see a dollar collapse and an over-abrupt adjustment of global imbalances. Oil producers have to find a home for their surpluses. They may like the idea of turning the euro into a petrocurrency, but the euro and eurozone bond market cannot compete on liquidity with dollar markets.
(...) despite being a net debtor the US generates a big income surplues.
In a forthcoming paper for Lombard Street Research, Brian Reading argues that the US has not fallen into the widely predicted debt trap largely because its net income has been growing so much faster than net debt. Here is part of the explanation fo the dollar's failure to collapse despite the burgeoning current account deficit.

The Lesson Drawn from Investing in US Ports — by Jawad Anani, Al-Hayat [16/03/2006]
(...) the damage is already done and cannot be reversed. This lesson comes to remind us, we the Arabs, that the United States only wants us to deposit our funds at its banks or smoothly invest them in some hotels and real estates.

No, the Iran Oil Bourse is not a casus belli... - by F. William Engdahl [10-3-2006]
(...) the status of the dollar as reserve currency depends on the status of the United States as the world's unchallenged military superpower. In a sense, since August 1971 the dollar is no longer backed by gold. Instead, it is backed by F-16's and MI Abrams battle tanks, operating in some 130 US bases around the world, defending liberty and the dollar.
...

Until some combination of those Eurasian powers congeal in a cohesive challenge to the unbridled domination of the USA as sole superpower, there will be no Euro or Yen or even Chinese Yuan challenging the role of the dollar. The issue is of enormous importance, as it is vital to understand the true dynamics bringing the world to the brink of possible nuclear catastrophe today.

The End of Dollar Hegemony - by Hon. Ron Paul of Texas. Um relatório clarificador sobre a actual crise financeira mundial, apresentado à Câmara de Representantes dos EUA em 15 de Fevereiro de 2006. Indispensável. [ Documento vídeo em linha desta comunicação (Windows Media Player) ]


Extracto da comunicação de Ron Paul à Câmara de Representantes dos EUA:
For the most part the true victims aren't aware of how they pay the bills. The license to create money out of thin air allows the bills to be paid through price inflation. American citizens, as well as average citizens of Japan, China, and other countries suffer from price inflation, which represents the "tax" that pays the bills for our military adventures. That is until the fraud is discovered, and the foreign producers decide not to take dollars nor hold them very long in payment for their goods. Everything possible is done to prevent the fraud of the monetary system from being exposed to the masses who suffer from it. If oil markets replace dollars with Euros, it would in time curtail our ability to continue to print, without restraint, the world's reserve currency.

(...) the effort between 1980 and 2000 to fool the market as to the true value of the dollar proved unsuccessful. In the past 5 years the dollar has been devalued in terms of gold by more than 50%. You just can't fool all the people all the time, even with the power of the mighty printing press and money creating system of the Federal Reserve.

It is an unbelievable benefit to us to import valuable goods and export depreciating dollars. The exporting countries have become addicted to our purchases for their economic growth. This dependency makes them allies in continuing the fraud, and their participation keeps the dollar's value artificially high. If this system were workable long term, American citizens would never have to work again. We too could enjoy "bread and circuses" just as the Romans did, but their gold finally ran out and the inability of Rome to continue to plunder conquered nations brought an end to her empire.

The same thing will happen to us if we don't change our ways. Though we don't occupy foreign countries to directly plunder, we nevertheless have spread our troops across 130 nations of the world. Our intense effort to spread our power in the oil-rich Middle East is not a coincidence. But unlike the old days, we don't declare direct ownership of the natural resources-- we just insist that we can buy what we want and pay for it with our paper money. Any country that challenges our authority does so at great risk.

John Williams' Shadow Government Statistics
The 2005 to 2007 recession almost broke to the surface recently, with the Commerce Department's "advance" estimate of fourth-quarter 2005 GDP. The report was about as honest a one as Commerce has published in a number of years. Somehow, though, considering the Labor Department's increasing reporting shenanigans last month, the chances of the dawning of a new era of straight-forward economic reports at this time are nil. It is beyond common sense that the current political hacks will allow recession reporting to surface prior to the November election. What almost broke to the surface in the recent GDP reporting most certainly will be beaten back with a club in the months ahead. In general, our broad economic outlook has not changed. The 2005 to 2007 inflationary recession continues to deepen, and the approaching recession, inflation and risks of heavy dollar selling will offer a nightmarish environment for the still Pollyannaish financial markets. However, negative GDP growth is not likely to surface in regular government reporting until after the November 2006 election, given the rampant political manipulation of most key government numbers.

The Global Class War - by Jeff Faux
(...) “it is not ‘China’ that is challenging the United States; it is a partnership between Chinese commissars who deliver the labor and American CEOs who deliver the capital and the technology.

The Proposed Iranian Oil Bourse - by Krassimir Petrov
A nation-state taxes its own citizens, while an empire taxes other nation-states. The history of empires, from Greek and Roman, to Ottoman and British, teaches that the economic foundation of every single empire is the taxation of other nations. The imperial ability to tax has always rested on a better and stronger economy, and as a consequence, a better and stronger military. One part of the subject taxes went to improve the living standards of the empire; the other part went to strengthen the military dominance necessary to enforce the collection of those taxes.

Iran's Euro-denominated Oil Bourse to Open in March; US$ Crash Imminent! - by William Clark
Similar to the Iraq war, military operations against Iran relate to the macroeconomics of 'petrodollar recycling' and the unpublicized but real challenge to US$ supremacy from the euro as an alternative oil transaction currency.

Vancouver, Iran, Russia, Europe - by Jim Willie CB [January 30, 2006]
The entire nuclear story is the disinformation about Iran. Can anyone remember the incessant drumbeat of Weapons of Mass Destruction concerning Iraq? Have we learned anything? It is a sad observation for me that Americans and their leaders do not learn from history, when it comes to bubbles, to dealing with tyrants who opposed communism, to misunderstanding cultures abroad. We were made fools (not me) about WMD in Iraq. We are being made fools about nuclear proliferation in Iran now. Few even at the Vancouver Gold Show seemed to identify the vast disinformation on the Iranian threat. The threat is to the Petro-Dollar superstructure banking system.

(...)

My view is that removal of the Petro-Dollar system could mean an increase of 2% to long-term US interest rates, a 2% increase to long-term US mortgage loan rates, a 20% decline in the USDollar exchange rates, a 20% decline in the S&P500 index, and a 20% decline in US housing prices. The end, or even the sunset, of this system would mean a gigantic lift to the gold price and crude oil price, likely to rise by at least 50%.

Dick Cheney Speech at the Institute of Petroleum, Autumn 1999
By some estimates there will be an average of two per cent annual growth in global oil demand over the years ahead along with conservatively a three per cent natural decline in production from existing reserves. That means by 2010 we will need on the order of an additional fifty million barrels a day. So where is the oil going to come from? Governments and the national oil companies are obviously controlling about ninety per cent of the assets. Oil remains fundamentally a government business. While many regions of the world offer great oil opportunities, the Middle East with two thirds of the world's oil and the lowest cost, is still where the prize ultimately lies, even though companies are anxious lor greater access there, progress continues to be slow.

Planos de guerra

Petrodollar Warfare: Dollars, Euros and the Upcoming Iranian Oil Bourse - by William Clark
Indeed, there are good reasons for U.S. military commanders to be ‘horrified’ at the prospects of attacking Iran. In the December 2004 issue of the Atlantic Monthly, James Fallows reported that numerous high-level war-gaming sessions had recently been completed by Sam Gardiner, a retired Air Force colonel who has run war games at the National War College for the past two decades. Col. Gardiner summarized the outcome of these war games with this statement, ‘After all this effort, I am left with two simple sentences for policymakers: You have no military solution for the issues of Iran. And you have to make diplomacy work.’

Is the Bush Administration Planning a Nuclear Holocaust? - by Michel Chossudovsky [2006-02-22]
Will the US launch "Mini-nukes" against Iran in Retaliation for Tehran's "Non-compliance"?

The Dangers of a Middle East Nuclear War - by Michel Chossudovsky [2006-02-17]
The Pentagon has blurred the distinction between conventional battlefield weapons & nuclear bombs. The nuclear bunker buster bomb is presented as an instrument of peace-making & regime change, which will enhance global security.

Petrodollars and Nuclear Weapons Proliferation: Understanding the Planned Assault on Iran - by Michael Keefer [2006-02-10]
It is important to understand the scale of the war crimes that are being planned as well the fraudulent pretexts being advanced to legitimize this intended aggression.

The hidden stakes in the Iran crisis - by Thierry Meyssan [2006-02-04]
At the end of this operation, Washington should have complete control over the world's main hydrocarbon production and reserves. It will control the world economy without the need to share power.

The Next War: Crossing the Rubicon - by John Pilger
At present the dollar is, on paper, a worthless currency bearing the burden of a national debt exceeding $8 trillion and a trade deficit of more than 600 billion dollars. The cost of the Iraq adventure alone, according to the Nobel Prizewinning economist Joseph Stiglitz, could be $2 trillion. America's military empire, with its wars and 700-plus bases and limitless intrigues, is funded by creditors in Asia, principally China.

Who Will Blow the Whistle Before We Attack Iran? - by Ray McGovern
Anyone who has been near a TV in recent weeks has heard the drumbeat for war on Iran. The best guess for timing is next month.

A piece of wisdom by Thomas Jefferson
If the American people ever allow private banks to control the issue of their money, first by inflation and then by deflation, the banks and corporations that will grow up around them (around the banks), will deprive the people of their property until their children will wake up homeless on the continent their fathers conquered.
Thomas Jefferson (1743-1826), US Founding Father


OAM #108 02 MAR 2006

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

Portugal nuclear 1

Hubbert Prediction

O fim do banquete petrolífero



O relatório apresentado nos dias 7-8-9 de Março de 1956, por M. King Hubbert, Consultor Chefe de Geologia da Shell Development Company, ao Encontro de Primavera da Southern District Division of Production do American Petroleum Institute, deve ter soado como uma visão muito pessimista do que então parecia ser o nascimento de uma inesgotável fonte de energia e matéria prima, essencial ao segundo grande bang do Capitalismo. No rescaldo das grandes tragédias mundiais que foram a guerra civil espanhola e a segunda guerra mundial, o petróleo e o gás natural viriam a ser os principais motores da chamada segunda revolução industrial. Foi este estudo de Hubbert —fundamental ainda hoje para entender o ciclo das três grandes fontes de energia carbónica (carvão, petróleo e gás natural)—, que primeiro previu a crise económica de 1973, que se seguiu ao pico da produção petrolífera nos Estados Unidos. Hubbert previu também a crise energética actual, desespoletada pelo cume da produção petrolífera no Mar do Norte. E previu finalmente o retomar inevitável da opção nuclear para fins energéticos quando já nada nem ninguém conseguir evitar a turbulência bélica crescente causada pelas disputas geo-estratégicas em volta do chamado "peak of oil production" — i.e. o ponto a partir do qual todo o petróleo e todo o gás natural disponíveis no planeta não demorarão mais do que escassos 30-50 anos a desaparecer do horizonte energético da humanidade.

Hubbert Bell Curve
"Se o mundo continuar a depender dos combustíveis fósseis como sua principal fonte energética, podemos esperar que o auge da produção de carvão ocorra daqui a uns 200 anos. De acordo com as estimativas actuais das reservas remanescentes de petróleo e gás natural, parece que a culminação da produção mundial destes produtos possa ocorrer dentro de meio século, enquanto que o pico da produção do petróleo e gás natural, quer nos Estados Unidos, quer no estado do Texas deva ocorrer nas próximas duas décadas" — 1956. Nuclear Energy and The Fossil Fuels by M. King Hubbert (p.38).

O pico da produção de petróleo e gás natural ocorreu nos Estados Unidos em 1970. O pico da produção petrolífera do Mar do Norte ocorreu em 1999-2001. E o pico mundial, se não ocorreu já, deverá surgir entre 2006 e 2007. Tudo somado, temos 30 a 50 anos de petróleo e gás natural pela frente, cada vez mais caro... e com muito sangue à mistura!

A opção pela energia nuclear parece, para muitos, irremediável. Chegará a tempo? Qual o preço que teremos que pagar por ela? Portugal deveria pensar, antes de tomar qualquer decisão, nas consequências terríveis que um acidente nuclear poderia ter sobre a faixa estreita de território onde vivemos. Deveria pensar, sobretudo, num mundo com menos energia e mais feliz!

Como escreve John Howard Kunstler em The Long Emergency (2005), a energia nuclear serve para muitas coisas menos para alimentar o estilo de vida ocidental dos últimos 50 anos. Não podemos fazer voar os aviões a partir da fissão nuclear, não podemos substituir o petróleo pelas energias nuclear, pelo hidrogéneo, pela energia solar, ou pelo vento, na produção de toda a espécie de plásticos, remédios e adubos de que actualmente dependemos. Em suma, o festim da era carbónica, em que nos fomos deixando embriagar desde os primórdios da Revolução Francesa, está prestes a terminar. Menos de 50 anos pela frente e uma inércia capitalista imparável (de que o consumismo e a hiper-concentração financeira são os epifenómenos mais doentios) vão conduzir-nos ao desastre. A um pequeno país como Portugal, inserido numa ilha europeia chamada Ibéria, resta-lhe a perspectiva de uma modificação drástica do seu modelo de crescimento. Isto é, uma revolução económica, política e social (em nome da razão e da sustentabilidade), capaz de controlar a derrapagem em que já entrou e evitar o pior. O pior seria, por exemplo, deixar o país resvalar para uma lenta guerra civil pelo controlo dos recursos imediatamente disponíveis, numa lógica terrível de exaustão acelerada das florestas, dos terrenos agrícolas e da generalidade dos recursos capazes de gerar receitas imediatas, até ao desaparecimento da nossa própria existência nacional. Para evitar o destino que tiveram os povos da ilha da Páscoa (ou deixar-nos envolver numa possível balcanização da Espanha), resta-nos levar a cabo uma discussão urgente sobre o nosso futuro, inverter drasticamente (i.e. através de imposições legais meta-comunitárias) o nosso estilo de vida, e construir um sistema de segurança alimentar e energético organizado em rede. O Estado e as autarquias podem e devem ser os pilares determinantes desta melindrosa operação. Mas para aí chegar terão que passar por uma reforma política radical. Precisamos de uma democracia electrónica poderosa, transparente e em rede, capaz de discutir, legislar e executar, muito para além do actual panorama de atavismo estratégico e corrupção generalizada que ameaça implodir o edifício institucional da nossa própria identidade.

Link 1 (Energy Bulletin)
Link 2 (Limits to Growth)
Peaking Of Oil World Production: Impacts, Mitigation, & Risk Management. Robert L. Hirsch. 2005. PDF (1,2 Mb)
World Petroleum Availability. Office of Technology Assessment (OTA). 1980. PDF (420Kb)
Exponential Growth (fac-símile). M. King Hubbert.1976. PDF (332 Kb)
On The Nature Of Growth. M. King Hubbert 1974. PDF (500 Kb)
Nuclear Energy and The Fossil Fuels (fac-símile). M. King Hubbert. 1956. PDF (2.6 Mb)

O-A-M #107 24 FEV 2006

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Coleccao Berardo

Das duas uma...


A trapalhada da colecção Berardo (cerca de 1500 obras de arte do século 20) parece-se cada vez mais com uma novela mexicana. Já se percebeu que a ministra da Cultura não quer nada com o capitalista madeirense. No entanto, de cada vez que soa o telefone de São Bento, Isabel Pires de Lima afirma apressada o seu afã em conseguir um bom contrato com o Comendador. O Primeiro Ministro, por sua vez, deixa que o seu nome seja, nesta matéria, sistematicamente invocado pelo Comendador, que pelos vistos lhe telefona por dá cá aquela palha, fazendo queixinhas da Sra Ministra. Por fim, não se percebe porque é que um homem tão rico, com uma colecção de arte tão importante, se presta a estas andanças caricatas.

Das duas uma, ou a colecção é mesmo excepcional, e não faltarão públicos que paguem os custos da sua conservação e exibição pública — e neste caso o Senhor Comendador não precisaria do CCB para coisa nenhuma — ou então, pelo contrário, a colecção fica aquém do circo intelectual e mediático que em sua volta tem vindo a ser montado — e neste caso, daria muito jeito a Joe Berardo comprometer o Estado português e uma das suas principais instituições culturais nos custos e trabalhos da sua conservação, exibição e legitimação...

A verdade é que, como se sabe (ou deveriam saber os nossos agentes culturais) os públicos da chamada "arte contemporânea" têm vindo a diminuir em todo o mundo, e nada augura uma inversão desta tendência. As excepções ocorrem apenas nas grandes instituições historicamente consolidadas da cultura moderna do século passado: MoMA, Guggenheim de Nova Iorque, Tate e Centre Pompidou. E mesmo nestes casos, só à custa de grandes orçamentos e grandes investimentos em arquitectura, publicidade e merchandizing. Estamos no século 21 e a cultura que ai vem é outra. Não creio, sinceramente, que as mil e quinhentas obras de arte do Senhor Berardo fossem capazes de, por si sós, alterar o panorama deficitário do CCB (ver nota de rodapé). E daí...

Seja como for, talvez fizesse sentido o Estado português negociar com o Comendador a reabilitação de um dos muitos edifícios que possui na cidade de Lisboa, convidando para tal um jovem nome sonante da arquitectura mundial (Herzog & De Meuron, Kasuyo Sejima, François Roche, Asymptote, etc...). A zona de Santos-Alcântara seria uma excelente localização para tal operação. O Estado faria a sua parte, i.e. um novo edifício simbólico para a cidade de Lisboa, que não teria que custar mais de 6 a 10 milhões de Euros, e o Senhor Comendador comprometer-se-ia por contrato a depositar a sua colecção nas novas instalações por um período nunca inferior a 25 anos. A administração (muito tansparente) do novo espaço ficaria naturalmente a cargo de uma fundação expressamente criada para o efeito, e da qual fariam parte o Senhor Berardo e o Estado português. A direcção artística do novo museu deveria, por sua vez, ser atribuída a pessoa competente, escolhida em concurso internacional expressamente convocado para o efeito, e não a dedo, como continua a suceder no círculo endogâmico da cultura lusitana.

Com muita energia e imaginação, até poderia resultar. Como se afigura na telenovela em curso, só podemos esperar o pior. A imortalidade do Senhor Comendador está por um fio!



NOTA — A petição que corre a seu favor desde Novembro passado não conseguiu até hoje mais do que umas magras 283 assinaturas, e a exposição Construir Desconstruir Habitar (realizada com base nalgumas das melhores obras da colecção) atraíu apenas o ridículo número de 8100 visitantes (contra os 24 mil que acorreram à World Press Photo). Vale a pena ler sobre este potencial fiasco os seguintes artigos: Peças de Berardo foram um "fracasso" e Não sabemos o valor das peças da Colecção Berardo


[actualização 03 AGO 2006]
ESTAREI ENGANADO?
Ouvi hoje o comendador Joe Berardo falar, pela enésima vez na SIC, sobre a excelência da sua colecção e sobre a bondade absoluta das suas intenções. Tudo a propósito das objecções do Presidente da República sobre o decreto-Lei que cria a nova Fundação de Arte Moderna e Contemporânea - Colecção Berardo. O comentário, publicado no sítio web da Presidência (um bom sinal de e-government...) sublinha o seguinte sobre o citado decreto-Lei:

“O referido diploma suscita dúvidas, principalmente no que se refere à distribuição de poderes entre o Estado e o coleccionador ou pessoas por ele designadas, no caso de o Estado Português efectuar a opção de compra da Colecção Berardo, a qual será feita, conforme previsto, de acordo com o valor de mercado.
Com efeito, mesmo após o exercício daquela opção de compra, o coleccionador continuará a dispor de poderes muito amplos de intervenção na gestão de um acervo de bens do património do Estado, podendo citar-se, a título meramente exemplificativo, a prerrogativa vitalícia relativa à nomeação do director do museu.&#148

Do ponto de vista dos princípios da legalidade, parece claro que, no caso de o Estado vir a comprar a totalidade ou parte da colecção de Joe Berardo, a posse lhe dá automaticamente o direito de gerir e dispor da propriedade como entender. Caso diverso seria se o comendador oferecesse as obras de arte ao Estado. Nesta hipótese, sim, seria razoável haver no contrato de doação determinadas cláusulas de garantia da vontade do doador. Mas não é este o caso, pois não? Ou será que ouvi hoje, na SIC, Joe Berardo referir-se à hipótese de uma doação? Seria bom conhecer o decreto-Lei e perceber quais são de facto as intenções do comendador, antes de a comunicação social indendiar o assunto. Por mim, se houver a intenção de doar, então Joe Berardo pode e deve impôr as suas condições (pois não estou a ver como é que uma instituição tão falida e volúvel como o CCB poderá algum dia dar conta deste recado). Se, pelo contrário, a intenção é vender as obras de arte ao Estado, então eu dria que o melhor é deixar o assunto em banho-maria, até ver o que tudo isto realmente significa.

[actualização 05 ABR 2006]
NÃO PODIA TER SIDO MAIS HILARIANTE
O anúncio bombástico do novo Museu Joe Berardo de arte moderna e contemporânea, que irá instalar-se no Centro Cultural de Belém (CCB), em Lisboa, que é dele (do Joe Berardo), mas também do Estado Português, em regime de comodato, até 2016. Para o comendador, vai ser o museu mais visitado do mundo (sic!) Para o comissário político Mega Ferreira, actual administrador do CCB, basta que seja o mais visitado de Lisboa (pois já seria bom se ultrapassasse o número de visitantes do Museu dos Coches, mesmo ali ao lado...) Para o Primeiro Ministro, está tudo bem porque fez a vontade ao seu assessor cultural (que é quem sabe destas coisas). Para a antiga Presidente do Instituto Português dos Museus, o homem da Madeira entrou definitivamente no caminho da beatificação cultural e... da IMORTALIDADE!! Em suma, a Fundação que presidirá a tão esperada boda, vai dispor da exorbitante quantia de 1 milhão de euros por ano, a meias, claro, entre o Joe e a Fundação (adivinhem lá os apelidos...), para comprar postais ilustrados de arte contemporânea. Só fica uma dúvida angustiante: se se zangarem pelo caminho (dez anos é muito tempo...), e se se desfizer a tal fundação, quem irá gerir o comodato? Quem é que fica com os postais?

[actualização 04 MAR 2006]
Joe Berardo quer negócio fechado c/ José Sócrates antes de 23/3. Saiba porquê...
Os sucessivos ultimatos do Senhor Berardo ao Governo (devidamente amplificados pelo Expresso...) não só incomodam, como começam a suscitar interrogações e suspeitas sobre o que está realmente em causa nesta telenovela! Ameaçar o Governo, na pessoa do próprio Primeiro Ministro, sobre matéria tão nebulosa como os investimentos em arte de um reconhecido especulador financeiro, é um desses sound bites que dão que pensar ao mais distraído cidadão. Gostaríamos todos de saber exactamente que raio de negócio o Comendador quer fazer com o Senhor Sócrates, às custas da ministra responsável pelo assunto e, sabe-se lá, do País... Qual o papel desempenhado pelo Senhor Melo, melro do nosso Primeiro em matérias de corte & costura e outras relevantes matérias culturais, nesta intriga de pacotilha? Uma coisa é certa: excepto Raquel Henriques da Silva, estamo-nos todos nas tintas para a imortalidade do Joe Berardo e eu, pessoalmente, duvido da excelência da sua colecção de arte (aliás mal conhecida), além de ter dúvidas ainda maiores sobre a sua rentabilidade cultural... e económica. Enfim, só encontro uma explicação para o ultimato de 23 de Março, dirigido pelo Comendador ao Primeiro Ministro: ele leu o meu blogue sobre o crash global previsto para o próximo dia 26!



O-A-M #106 21 FEV 2006

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Barajas T4

Barajas Terminal 4 - Servicios

O pior novo aeroporto do mundo?



O efeito borboleta provocado no tráfego aéreo europeu e mundial pela desastrada inauguração do chamado Terminal 4 do aeroporto madrileno de Barajas continua ao fim de quinze dias de confusão. Os prejuízos económicos e transtornos emocionais causados aos milhares de passageiros que perderam malas, voos e paciência desde o passado dia 5 de Fevereiro, são grandes e significam um monumental fiasco público e empresarial. Há praticamente 15 dias que os desgraçados clientes da Ibéria, que transitam pelas duas novíssimas instalações aeroportuárias, vêm os seus voos atrasados, as portas de embarque alteradas entre o check-in (facturación) e o embarque, e as malas desaparecidas ou enviadas para outro país. Perdem os voos, entre outros motivos, porque a megafonia do aeroporto é completamente inútil na sua extrema dedicação à campanha anti-tabágica, porque são induzidos em erro por uma sinalização contra-intuitiva, ou porque as distâncias a percorrer se medem em milhares de passos, elevadores lentos e escadarias.

Barajas Terminal 4

Usabilidade zero



Só por erro crasso de programa, desenho, usabilidade e comunicação se vem chamando "Terminal 4" ao que na realidade são dois edifícios desproporcionados distando entre si mais de 1Km. No mínimo, haveria que apelidá-los de Terminal 4A e Terminal 4B, para que todos soubessem, sem mais explicações, que há duas realidades físicas inevitáveis quando se chega ou se parte da nova zona aeroportuária de Barajas. Ao que parece a facturación faz-se apenas num dos edifícios. A ser verdade (pois estive apenas no Terminal 4-A), aposto que não haverá sossego em Barajas 4 tão cedo.

19 de Fevereiro. Um pai de família lamenta-se no apinhado balcão de reclamações do Terminal 4-A. Não sabe de onde sai o seu avião para La Habana. A resposta, decepcionante, foi a seguinte: "el vuelo ha salido ya; y además, la puerta de embarque es en el otro edifício". Isto é, duzenos metros a passo, uma viagem de autocarro e 30 minutos depois!

Quinze dias de confusão deveriam ter chegado para perceber que os passageiros andam perdidos no gigantesco labirinto em que se transformaram dois edifícios tão aparentemente interessantes. E que portanto alguém, ou alguma solução, terá que ajudá-los, pois o cretinismo topográfico não é deles...

No dia 6 cheguei a Madrid via Lisboa, em voo Iberia. O edifício, à medida que se dava a conhecer, impressionava pelo cheirinho a novo, pelo contraste face ao velho edifício de Barajas, pela estética de Richard Rogers e pela escala. Passaram uns minutos, depois meia hora, uma, duas... e meia, antes que o tapete metálico se resolvesse a expulsar as nossas malas. No chão de mármore luzidio, um saco de viagem esventrado, do qual saíam um sapato de salto alto, várias meias de senhora e um pacote de batatas fritas aberto, davam uma nota sinistra a um décor digno de Monsieur Hulo. Funcionários sem missão aparente cruzavam apressados espaços infindáveis e de improvável destino, parecendo apenas fugir das nossas inocentes perguntas. Quando consegui placar um deles, balbuciou envergonhado: "es que ni si quiera tenemos telefonos para comunicar". Percebi então a gravidade da situação. Percebi também porque é que meia dúzia de funcionárrios de limpeza se perfilavam diante de turistas e passageiros sem mover um pé, esperando aparentemente por uma ordem mais do que improvável. Percebi, enfim, o motivo porque o pessoal técnico que cruzava aquela espécie de teatro de guerra desolador, nem sequer olhava para as batatas fritas esparramadas sobre o estreado mármore de Barajas. Não havia cibernética do Terminal 4, apenas um filme de Jacques Tati.

Hotel Silken Puerta de America. Habitación

Chiquérrimo!



Elisabeth, colega e amiga, pouco disposta a esperar por umas bagagens sem hora previsível de chegada, resolvera reclamar. Forneceu os dados e solicitou que lhe enviassem a mala ao hotel, a qual seria previsivelmente entregue 6 a 12 horas depois. Eu, desconfiado, e porque tinha uma câmara Canon Digital reflex na mala (que me custara os olhos da cara), decidi esperar como um andino que o monstro de lâminas de aço inox começasse a mover-se, relativizando desportivamente a importância do tempo e da minha agenda profissional. A grande mala amarela acabou enfim por assomar. Estava intacta. Decidi apanhar um táxi, experimentando desta vez as sevícias de um imenso túnel de refrigeração brilhantemente concebido pelos arquitectos que desenharam esta espécie de Escorial pós-contemporâneo. A minha amiga acabaria por receber a sua mala no hotel mais fashion de Madrid, o Silken Puerta de America, onde a mesma voltaria a perder-se por mais umas 18 horas, desta vez devido a falhas de booking e incompetência dos recepcionistas, dois dias depois de desembarcar no quarto maior aeroporto da Europa.

19 de Fevereiro. 19h50. Estou a escrever este desabafo junto à porta J59 do Terminal 4, onde se espera pelo voo atrasado IB 3106, previsto para as 18:50. Depois de esperar diante de um painel luminoso de informação, junto a uma cafetaria, durante 2 horas, perdi pela primeira vez na vida uma ligação aérea. Quando reparei no aviso de embarque, já piscava ULTIMA LLAMADA! Puerta K58. Os letreiros dizem, da esquerda para a direita, J K L. Corri para a direita, buscando as portas K. As portas reais seguem-se, porém, ao invés: L J K! Teria pois que inverter a marcha e correr agora para a esquerda... uns quatrocentos metros! Cheguei ao balcão que controla o acesso ao avião com o coração aos saltos. A aeronave estava onde se esperava que estivesse. Três outros ofegantes passageiros esperavam como eu a oportunidade de embarcar. As portas do IB 3106 ainda estavam abertas, mas nós já não entraríamos. Porquê? Nunca chegaremos a saber.

Dirigi-me irritado ao balcão de reclamações, para obter novo bilhete e para protestar contra o manifesto desprezo pela economia alheia. Havia umas boas 3 dezenas de reclamantes furiosos. Fotografei-os, para me ater aos factos. Pela dificuldade que tive na entrega da minha queixa, e pelo visível volume de queixas perceptível no grosso livro de reclamações, posso imaginar as centenas ou mesmo milhares de indignações que ficaram no tinteiro.

Como desabafava um norte-americano depois de obter a muito custo um reconhecimento escrito de que perdera o seu voo para Miami por culpa do estuporado Terminal 4 de Barajas, "Iberia sucks!" E no entanto, a grande culpada chama-se, ao que parece, AENA — a entidade pública responsável pela administração dos aeroportos espanhóis. Lá como cá, tudo na mesma, sempre que falamos de paquidermes burocráticos de Estado.

O-A-M #105 20 FEV 2006

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Cavaco Silva 6

intolerancia

Cavaco e Sócrates: coabitar


A vitória de Cavaco foi à tangente. Mas provou que o Centro Inteligente (CI) é uma realidade. Com o passar das décadas foi amadurecendo, deixou evaporar os excessos de pátina ideológica, tornou-se, em suma, um fiel pragmático da balança política lusitana. Ficámos também a saber que o PCP, muito por causa do seu novo líder (ex-proletário, simpático e nada cinzento), fixou por mais uma década o seu eleitorado. O dito bloco central (PS+PSD) está bem e recomenda-se (basta ver as excelentes relações entre o actual Presidente da Câmara Municipal de Lisboa e Jorge Coelho...), apesar das agitadas águas que correm debaixo das suas pontes. Manuel Alegre, pelo contrário, não passou, pelos vistos, de um epifenómeno. Louçã não convence, nem poderá convencer, enquanto não produzir ideias novas e concretas, muita para além das generalidades propagandísticas do seu já irreconhecível trotskismo. Esperamos que a nova coabitação permita salvar o país da imbecilidade, da arrogância institucional, da ineficiência patriótica, da paquidermia burocrática e da corrupção pandémica que corrói o futuro deste país. Esperamos, em suma, por quatro anos de transparência estratégica, justiça, coragem, visão cultural e decisão política. Foi para isso que votámos! Resolvam-se pois, quanto antes, as dúvidas sobre a honorabilidade dos políticos e das demais celebridades do tempo. Pedófilos e corruptos para a prisão! Promiscuidade entre política e negociatas, nunca mais! Ronha burocrática, chega! Cabotinismo, nepotismo, sindicatos sexuais e endogamias são tudo o que não queremos e contribui para nos apequenar. Coragem Portugueses! Confiem no vosso CI...

Mahome: Stop stop We Ran Out of Virgins!

Civilização ou barbárie?


A autosuficiência energética, suportável a prazo pelo crescimento das energias naturais não poluentes (solar, eólica, marítima e hídrica); a autosuficiência alimentar, potenciada por uma nova revolução agrícola à escala europeia (que substitua os cultivos intensivos baseados na erosão criminosa dos solos biológicos, nos pesticidas e adubos químicos oriundos do petróleo e do gás natural, por uma agricultura extensiva, bio-ambiental e socialmente partilhada); a coesão ibérica, de Lisboa a Barcelona; a descentralização política e o conhecimento, são as cinco prioridades do nosso futuro imediato. Não há margem de manobra para hesitações! O petróleo chegará em breve aos 100 USD/barril. Como responderemos a esse desafio quando ele se puser cruamente diante dos nossos decisores políticos e da população em geral? Estaremos preparados para fechar os olhos ao genocídio de 1/3 ou mais da humanidade, em nome da sobrevivência dos mais fortes? E haverá alternativa se continuarmos a dormir sobre os problemas inadiáveis? Os radicais islâmicos (que de facto nos declararam guerra) estão a pedi-las. Os povos ocidentais começam a preparar-se para uma colisão inevitável. O mais provável é que, no rescaldo de uma guerra nuclear limitada, desespoletada muito provavelmente pela imprudência iraniana, todo o Islão venha a pagar, injustamente, pelo radicalismo que deixaram germinar e crescer nas suas entranhas atávicas. Civilização ou barbárie?!

A tecnosfera é incompatível com a corrupção galopante e com o atavismo religioso. Mas, por outro lado, a civilização não é digna desse nome se continuar a ser um campo de rosas alimentado pelo sangue, suor e lágrimas de milhões de despossuídos, explorados e oprimidos. Eis o principal dilema do século 21.

O-A-M #104 03 FEV 2006

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Souto Moura

El Souto Moura

Procurador tenaz


Explica-me, como se eu fosse muito burro!

Sou daqueles que, ao contrário do Sr. Jorge Van Krieken (do reporterX.net) --responsável pelo recente furo jornalístico dum pasquim chamado 24 Horas--, creio que não há fumo sem fogo. E no caso que tem revolvido a Justiça Portuguesa, em volta, como se sabe, do escândalo de pedofilia da Casa Pia (no qual, ao contrário do caso Kincora, há um prevaricador confesso --Bibi-- e dezenas de jovens abusados), aquilo que o povinho, como eu, sabe, é que se tem feito a vida negra a todos os operadores jornalísticos e judiciários que se atreveram e atrevem a prosseguir, contra ventos e marés, no caminho do esclarecimento factual e jurídico dos crimes que, com toda a verosimilhança, foram praticados. O povinho também sabe que nenhum pedófilo pobre poderia sustentar advogados a pão de ló, como parece suceder neste caso. Por sua vez, o número de incidentes processuais veio revelar que quem tem dinheiro pode, afinal, entorpecer, vilipendiar e finalmente abafar a justiça, contando para tal com as mais inacreditáveis ajudas. O caso das listas de chamadas detalhadas que cirurgicamente atiraram para cima da secretária de Jorge Sampaio nas derradeiras semanas do seu mandato, mostra, como é bom de ver, um grande desespero por parte de alguns dos intervenientes no processo sujo em que o caso da Casa Pia se transformou. Alguém alguma vez se preocupou com os deslizes técnicos e processuais da Justiça Portuguesa antes deste caso? Lembram-se do caso UGT? Lembram-se do caso Partex? Lembram-se do caso das Facturas Falsas? Lembram-se do Caso Felgueiras? Lembram-se das dívidas fiscais dos clubes de futebol? Lembram-se do caso (que nem sequer levantou voo) das operações de lavagem de dinheiro a que, parece, se vêm dedicando alegremente algumas seriíssimas instituições bancárias lusitanas? Lembram-se do Apito Dourado? E do Isaltino? Não há ainda jurisprudência em tudo o que refere a julgar os poderosos deste país. É um facto. Mas já é tempo de a ter!

Ficámos a saber que há uma data de gente importante que tem telefones secretos (coisa de status, claro) numa mesma conta do Estado, e que nem todos são Ministros ou Secretários de Estado. Ficámos a saber que a PT é descuidada (mas sempre foi e daí nunca veio grande mal ao mundo). Ficámos a saber que a parte encriptada da lista de facturação detalhada não foi usada nem achada pelos operadores de justiça que operaram com a disquete do envelope 9. Ficámos também a saber que a dita parte encriptada do documento digital foi violada agora por uma certa fúria jornalística muito empenhada em demonstrar a incompetência do actual Procurador-Geral da República. Entretanto, paulatinamente, o actual Ministro da Justiça tece uma teia muito perigosa, cujo objectivo óbvio é controlar o poder judicial, com o pretexto de que é ao mesmo, e não aos governos e parlamento, que compete em primeiro e último lugar ter uma estratégia, legislar e fazer aplicar uma política de Justiça. Atirar para cima do sorridente Souto Moura o fardo pesado das culpas que aos partidos em primeiro lugar cabe, é um sinal de grande insensatez e cobardia. O Manuel Alegre tem falado muito nesta campanha eleitoral do bloco central dos interesses, do nepotismo e do concubinato entre o poder empresarial e a tropa política. Diz o óbvio, mas foi o suficiente para deixar Mário Soares pelo caminho na actual corrida presidencial. Depois da humilhante derrota do candidato do PS, creio que os seus militantes mais sérios e ambiciosos farão o devido funeral a quem, sem o menor escrúpulo pela idade, prestígio e situação institucional de Mário Soares, lançou o partido do Governo num autêntico fiasco. Eu sempre disse que Cavaco seria o melhor candidato de Sócrates, mas agora convém também acentuar que uma boa votação em Manuel Alegre será a via mais expedita para resolver a crise de valores e de estratégia que actualmente grassa no interior do Partido Socialista.

A poeira que tentaram atirar-nos aos olhos através do Repórter X já assentou e viu-se que resultou apenas de um tiro de pólvora seca. Esperemos tranquilamente que Sampaio evite sair de Belém em bicos de pés. O presidencialismo poderá revelar-se como a única alternativa democrática a um regime que, como o nosso, se encontra ameaçado de escorbuto político até à medula. Sampaio fez boa parte desse caminho. Resta saber se pretende agora empurrar Cavaco Silva para o desfecho lógico desta tendência institucional mais rapidamente do que seria aconselhável nas presentes circunstâncias. Seria de facto um mau serviço à actual maioria e à evolução previsível do nosso regime democrático.

PS -- As notícias das nomeações da filha do antigo Ministro dos Negócios Estrangeiros, António Monteiro, para Londres, à razão de 9000 euros/mês, pagos pelo erário público, e da filha do actual Ministro da Justiça, Alberto Costa, ao serviço do seu próprio gabinete, à razão de 3000 e tal euros/mês, que viajam pela Net a velocidades estonteantes, são ou não verdade? Vão ou não merecer desmentidos? Vão ou não merecer o escândalo dos sempre imprevisíveis e neurasténicos órgãos de informação social que temos? Humm.... :~!

CORRECÇÃO E PEDIDO DE DESCULPAS (12-02-2008) -- acabo de verificar que o caso da suposta filha de Alberto Costa, supostamente contratada para o seu gabinete, não passou de uma atoarda. Transcreve-se o correspondente desmentido, que apesar de tardio, visa repor a verdade dos factos. Peço desculpa aos visados pela pergunta que formulei sobre o assunto. -- OAM

Nota - Contratação de Susana Dutra

"Em relação à contratação de Susana Dutra como assessora do gabinete do ministro da Justiça, cumpre esclarecer o seguinte:
  1. Susana Dutra foi contratada tendo em vista, em primeira linha, a substituição do actual website do Ministério da Justiça por um portal de serviços e informações aos cidadãos e às empresas para a área da Justiça.
  2. Este novo portal, que já está on-line, exigiu a contratação de Susana Dutra, de modo a acompanhar desde já o processo de implementação técnica do portal e a sua gestão editorial.
  3. O novo portal será tecnicamente desenvolvido pelos serviços do Ministério, sem que isso envolva qualquer custo adicional.
  4. Pelo contrário, até ao momento a concepção técnica e a gestão editorial do actual website estavam a cargo de uma empresa externa, contratada pelo anterior Governo, com os custos financeiros e dificuldades de comunicação inerentes a esta situação.
  5. A contratação de Susana Dutra como assessora do Gabinete foi feita com integral respeito dos procedimentos legais e o seu vencimento decorre da lei, sendo até do ponto de vista financeiro mais vantajosa que a manutenção do contrato com uma entidade externa ao Ministério.
  6. Paralelamente ao seu trabalho na gestão editorial do novo portal da Justiça, a Susana Dutra, jornalista com experiência na imprensa escrita e na gestão editorial de websites, colaborará igualmente no trabalho regular de assessoria de imprensa.
  7. O Ministério da Justiça desmente de forma categórica a existência de qualquer relação de parentesco entre o ministro da Justiça, Alberto Costa, e a assessora de imprensa, Susana Isabel Costa Dutra.
09 de Fevereiro de 2006"

in Portal da Justiça

O-A-M #102 15 JAN 2006

domingo, janeiro 08, 2006

desNorte Cultural

Isabel Pires de Lima ao Expresso

PREC de regresso ao MC: vou a uma manif :-)


Domingo, 08.01.2006, às 20h00, junto ao Teatro Dona Maria, no Rossio, em Lisboa

I
O boy Antonio Mega Ferreira, o boy Antonio Campos Rosado e a girl Margarida Veiga, apesar de serem boys & girls do PS há uma data de anos, tomaram de assalto o CCB com uma sofreguidão que já não víamos há muito. Este elefante branco (o CCB), falido e completamente falho de imaginação, tornou-se agora no principal emblema cultural de um Estado pedinte (o Português).
II
Em vez de ter negociado a tempo e horas um protocolo decente e conveniente para ambas as partes, com o comendador Berardo, o MC deixou, pela mão de uma Ministra que não sei o que fez nem o que faz, apodrecer a tal ponto o dito protocolo, que foi preciso o Primeiro Ministro salvar, in extremis, a possibilidade de o património artístico da Colecção Berardo se manter por cá mais alguns anos. Daqui resultou uma farsa em três actos, de onde ninguém saíu ileso: o nosso Primeiro desautorizou a azoada Ministra, senhora confusa que não soube tirar dali as devidas ilacções (demitindo-se em vez de esperar que a demitam na primeira ocasião); o Sr Fraústo empunhou o único argumento que verdadeiramente pareceu movê-lo neste caso: o direito à indemnização de 40 mil euros!; e, por fim, consumou-se a programada e compassada entrada da dupla António Campos Rosado-Mega Ferreira numa missão afinal tão desprezível quanto seja administrar e dirigir um centro cultural do Estado sem dinheiro, programaticamente à deriva desde que existe, inutilmente caro e sem nenhuma possibilidade de ser outra coisa no futuro que não a sala de visitas pomposa de uma classe política cada vez mais indigente e corrompida.

Entretanto, como uma desgraça nunca vem só, a alucinada Ministra, com o conluío do seu Secretário de Estado (espécie de ex-comunista ansioso), demitiram sem pré-aviso nem explicação o director do Dona Maria, António Lagarto, pessoa de quem tive sempre uma excelente impressão e sei que sabe do seu ofício. Os dois compinchas governamentais preparam-se agora para demitir o Ricardo Paes, que dirige com êxito o São João, no Porto. Os comunistas e os ex-comunistas, quando lhes dá para a censura e para o autoritarismo não passam de criaturas autistas: vêm sempre os estragos que causam como actos justos de uma justiça revolucionária acima de toda a ética terrena! Nem o simpático operário que agora os governa poderá salvá-los desta triste condenação.

Não sei se já repararm que a página de boas vindas do sítio do Ministério da Cultura se encontra em actualização desde que as mencionadas criaturas tomaram posse. Não sei se já repararm que a dita Ministra, acreditando no mesmo sítio web, apenas fez dois discursos até à data. Não sei se repararam que o orçamento ministerial exibido nesta espécie de exemplar caricato do célebre plano tecnológico ainda é o de 2004! Onde vivem, de facto, estes extra-terrestres?

É tudo demasiado lamentável e risível.
Vou até ao Rossio dar um abraço ao António Lagarto e vociferar contra os néscios que, certamente por lapso, governam o pelourinho da cultura portuguesa.

O-A-M #101 08 JAN 2006

sábado, dezembro 17, 2005

Cavaco Silva 5

O Centro Inteligente


As sondagens vêm confirmando aquilo que toda a gente já sabia: o centro social e político do País está farto dos partidos que formam o arco do poder, e acha que os ditos são largamente responsáveis pelo actual estado de coisas. As acções, as omissões e sobretudo a irresponsabilidade do Partido Socialista e do Partido Social Democrata, mas também a permanente estupidez analítica e o comodismo das oposições (do PCP ao PP, passando pelo Bloco), permitiram que alguns se servissem indecentemente das riquezas à mão de semear (Orçamento de Estado e Fundos Comunitários), sem a contrapartida de organizarem o país para os desafios que, todos sabiam, a integração europeia e a globalização iriam impôr.

O estado actual da nossa comunidade não deixa pois de ser paradoxal: temos uma democracia de pleno direito, temos partidos da situação e partidos da oposição, temos liberdade de imprensa, estamos integrados numa vasta associação de nações e Estados (seguramente a mais rica e a mais democrática do planeta), mas Portugal encontra-se à beira da falência económica, sem Justiça que funcione, com as corporações à solta, sem uma classe política comprometida com o seu País, sem lucidez, sem estratégia. O centro, o centro inteligente, faz o que pode, votando à “esquerda” (PS) e à “direita” (PSD), na busca incessante de alguém que tenha a inteligência, a vontade e a coragem de enfrentar simultaneamente a sonolência nacional e os poderes ilegítimos, em nome, já não digo de um sonho, mas tão só de uma visão realista dos nossos deveres, dos nossos interesses e das nossas reais potencialidades. O mundo caminha para uma mutação dramática do seu modelo energético. Deixaremos em breve o paradigma do desenvolvimento e do progresso assentes na afluência de energias baratas. Vale a pena ler, a este propósito, The Oil Depletion Protocol, proposto à discussão por Richard Heinberg. No mundo que espreita ao virar da esquina teremos que saber redefinir drástica e corajosamente o sentido da vida e as nossas metafísicas. Poderão Cavaco Silva e José Sócrates dar uma ajuda neste transe? Creio que o sentido de voto do centro inteligente alimenta, pelo menos, essa esperança desesperada!

A aposta actual dos eleitores não é pois uma aposta na Esquerda ou na Direita (de que nos rimos todos), mas uma aposta de confiança pessoalmente depositada, outrora em António Guterres, e agora em José Sócrates e Cavaco Silva. Os portugueses esperam sobretudo decisões corajosas, transparência, uma estratégia clara para Portugal e uma autoridade sem hesitações na aplicação dos programas e das leis. Se estes dois políticos tiverem a coragem e a lucidez de seguirem este caminho, o povo não lhes faltará. Mas atenção: há que apertar desde já o freio à corrupção e ao caciquismo que campeiam impunemente pela estepe lusitana!

Ao contrário do que dizem por aí, o nosso futuro não é o Turismo, ou pelo menos não será o turismo de massas, porque este não resistirá ao colapso energético que se aproxima. O nosso futuro passa, neste aspecto particular, por oferecer aos futuros residentes fugidos das crises energéticas, climáticas e bélicas de outros países, um refúgio ecologicamente remendado, com uma relativa autonomia energética e alimentar, pacífico e capaz de vigiar as suas fronteiras terrestres, marítimas e aéreas.

O ano de 2007 poderá trazer notícias muito más nos planos energéticos e imobiliário, com consequências inimagináveis no que se refere ao agravamento do desemprego, do ritmo das falências empresariais e do crescimento das nossas dívidas, pessoais e nacionais, internas e externas. É por isso que as aventuras da Ota e do TGV poderão afocinhar muito antes de começar. É por isso, insisto, que as nossas prioridades estratégicas passam por assegurar, doa a quem doer, segurança energética e alimentar. É por isso que o famoso plano tecnológico não poderá ser mais uma anedota política e um mero pretexto para desviar e desbaratar os fundos nacionais e comunitários. A nossa inteligência, o nosso conhecimento e os recursos financeiros disponíveis devem confluir nos três objectivos estratégicos prioritários mencionados: autonomia energética, autonomia alimentar e capacidade de vigiar e controlar as nossas fronteiras, sobretudo marítimas.
Precisamos de diminuir o desperdício energético em todos os segmentos da nossa actividade. Precisamos de reformar imediatamente o modelo de financiamento das autarquias locais (elos essenciais da sustentabilidade que teremos que adoptar mais cedo do que pensavamos). Precisamos de lançar um vasto movimento agrícola de proximidade, que inclua, entre outros objectivos imediatos, a recuperação radical das cinturas verdes de todos os aglomerados urbanos com mais de 10 mil habitantes e um vasto plano educacional dirigido a toda a população. Precisamos de recuperar e estimular os circuitos de distribuição local, apoiando-os, desta vez, contra as condenadas mega-superfícies que quase destruiram o comércio (e a produção) local e nacional deste País. Precisamos, finalmente, de atrair conhecimento e financiamentos externos, dando como contrapartidas efectivas um período de 20 anos de isenção de impostos e um quadro legislativo que aponte sem ambiguidades para um modelo de sustentabilidade ecológica à escala nacional.

Aos meus concidadãos um conselho de Natal: gastem pouco (nada de telemóveis novos!) e sobretudo apostem no comércio de proximidade. Se tiverem uns dinheiritos poupados, não o desbaratem em planos de poupança cantados pelas sereias bancárias, mas antes na compra de terra, de terra agrícola, se possível perto de onde vivem. Depois vão pensando em frequentar uns workshops sobre a origem dos nossos alimentos. Por exemplo, os mini cursos de jardinagem promovidos pelo Jardim Botânico da Ajuda, Lisboa (contacto: Enriqueta Coelho). Além de divertidos, ser-vos-ão muito úteis no futuro que ainda conhecereis.

Bom Natal!

Post Scriptum (24 dez 05) — Que se passa na cabecinha deste Primeiro-Ministro? Desatou a despachar compromissos irrealizáveis: Ota e TGV. Desdiz por dá cá aquela palha as posições do PS sobre uma questão energética tão sensível como a anunciada barragem do rio Sabor (depois da campanha que alimentaram contra Foz Coa). Atropela uma ministra no fim-de-semana, em nome de um acordo obscuro com um putativo benemérito das artes (algum melro lhe anda a dar muito maus conselhos...). Em suma, autoriza ou pressiona o seu ministro das obras públicas a fazer sucessivamente uma figura cabotina no dossier dos transportes (a última pessegada foi esconder do festival burlesco da Gare Marítima um estudo fundamental da ANA, realizado em 1994, sobre as alternativas possíveis para o novo Aeroporto Internacional de Lisboa). Como se isto não bastasse, o dossier tecnológico, objecto de encenações igualmente festivas, continua encalhado no jogo do empurra, afundando ministros e sucessivos responáveis que não chegam a sentar-se no lugar. O famoso plano foi agora chamado para a área de competência directa do Primeiro Ministro. Que sucederá quando voltarmos a perceber que não há nenhuma ideia decente para o mesmo? Entretanto, o essencial, i.e. a defesa imediata da nossa autonomia energética, alimentar e territorial, parece um assunto ausente da agenda de Sócrates. Grave! Muito grave, Senhor Primeiro Ministro! Talvez venha a tombar da sua cadeira por causa de tamanha distracção. E já agora, mais um aviso: não antecipe decisões cuja importância crucial para o País merecem, e sobretudo precisam, de um bom entendimento entre o Governo e o futuro Presidente da República. Quem avisa, seu amigo é...

Post Scriptum (20 dez 05) — Não gostei nada do modo obcecado como Soares atacou Cavaco no debate desta noite. Fez um triste papel de demagogo barato, de agressor indelicado e de velho senil (é preciso dizê-lo!), agitando espantalhos ridículos sobre a perigosidade de Cavaco Silva e lançando suspeitas indecentes sobre a legitimidade democrática das eleições que aí vêm. Não disse nada sobre o futuro (seguramente, porque não pensa fazer coisa alguma), enquanto o seu adversário explicou pacientemente como espera não defraudar os seus eleitores, se for eleito. Cavaco já disse que não vai cortar fitas, nem deixar os Governos, a Assembleia da República e os Tribunais descansados na doce incompetência que conduziu o País ao lamentável estado de irresponsabilidade, corrupção e indecência em que se encontra. Toda a gente percebeu há muito o que ele pretende, menos os candidatos que se lhe opõem. Repito: a sua eleição é a melhor notícia que os eleitores poderão dar a Sócrates na longa e dolorosa caminhada que o espera nos próximos três anos.

O-A-M #100 17 DEZ 2005