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sábado, julho 14, 2012

Banksters e ogres

Le Petit Poucet (o pequeno polegar), Gustave Doré (1832-1883) illustração. in Wikipedia.

Há uma lógica intrinsecamente assassina na luxúria financeira

Con menos de la mitad de la fortuna de los ricos se pagan las deudas de la Eurozona

“Economistas alemanes abogan por que los mas adinerados contribuyan a resolver la crisis de la zona del euro obligándoles a comprar deuda pública, o, como alternativa, estableciendo un impuesto temporal que grave las grandes fortunas.”

“Con menos de la mitad de la fortuna de los ricos, concretamente, con el 40% de su patrimonio, se podría pagar la totalidad de la deuda que acumulan los estados que comparten el euro.”

“La discusión en Alemania tiene su origen en las propuestas presentadas por el prestigioso Instituto Alemán de Estudios Económicos (DIW) de Berlín para que los mas adinerados contribuyan a resolver la crisis de la zona del euro, entre ellas la de la compra forzosa de deuda pública.”

in Público.es

Se 99% da população europeia está a ser progressivamente expropriada de mais de 30% da sua poupança, sob a forma de confisco fiscal, desemprego em massa, inflação dissimulada e desvalorização de ativos, não percebo porque é que este sacrifício não pode ser melhor redistribuído, abrangendo também os 1% de ricos e muito ricos desta envelhecida e decadente Europa.

Mas percebo isto: sem uma enorme pressão popular e em particular das classes médias profissionais, o confisco fiscal e o desemprego em massa prosseguirão, pois os poderes políticos-partidários, legitimados pela preguiça e por uma inacreditável ingenuidade democrática dos povos, foram na sua grande maioria capturados pela armadilha do endividamento, e as criaturas que os exercem são quase sempre mordomos e motoristas atentos e obrigados da grande cleptocracia financeira gerada pela dita "globalização".

Os banksters, que são a versão financeira pós-moderna dos míticos ogres retratados magistralmente por Gustave Doré, não deixarão a sua posição dominante se não à força de novas leis, várias condenações em tribunal, e até alguns encontrões na praça pública.

Por sua vez, as criaturas que simultaneamente exercem o poder e estão na folha de pagamentos da cleptocracia pós-moderna também não desistirão das suas posições privilegiadas enquanto não forem expostos e corridos de onde estão pela fúria democrática que, felizmente, cresce dia a dia.

Se a concentração financeira e a substituição tecnológica do trabalho vieram para ficar, então teremos que rever de alto a baixo o Contrato Social. Colocar o mundo inteiro no desemprego, obrigando-o a pagar as dívidas impostas pelas malhas da especulação montada pelos ogres da globalização é o mesmo que regressar à escravatura e ao arbítrio ilimitado e Kafkiano do poder. A pouco e pouco vamos todos percebendo que é urgente reagir e parar a luxúria insaciável e assassina dos novos ogres.

99% da população europeia corre sérios riscos de cair numa servidão pior do que a servidão da gleba, pois agora já nem um pedaço de terra temos para cultivar as couves, o feijão, o milho e as batatas!

O Capitalismo, como sempre, entrou num período sujo e sangrento de destruição dos excessos de capacidade produtiva e de produção, acrescido agora de um extraordinário excesso de endividamento geral em consequência do acumular de bolhas especulativas engendradas e impostas pelos banksters de Wall Street e da City — Goldman Sachs, JP Morgan, Morgan Stanley, Bank of America, Citibank, HSBC, e alguns mais. Só que desta vez exagerou, e o tiro acabará por sair-lhe pela culatra.

O Capitalismo pensava que tinha dominado finalmente os efeitos indesejáveis da Revolução Francesa. Mas engana-se. As novas guilhotinas populares poderão surgir de um momento para o outro, em qualquer lugar, e alastrar como fogo na pradaria num dia de vento! Até agora, alguns piratas financeiros já foram de cana, nomeadamente nos Estados Unidos. Não tardaremos a saber de fuzilamentos na China a este mesmo propósito. E na Europa, a procissão popular contra o esbulho só agora começou. Temos, pelo menos, mais uma ou duas décadas de fúria cumulativa pela frente.

Seria, no entanto, conveniente fazer desta fúria um momento construtivo e de inovação civilizacional, em vez de repetirmos os erros e as litanias igualmente assassinas dos epígonos miseráveis do marxismo. Se formos por aqui, persistindo na fé que muitos temos mantido na dita Esquerda, esperam-nos apenas tempos de destruição em massa :(

Se, pelo contrário, aproveitarmos o potencial das novas redes tecnológicas e sociais,  e a cultura cosmopolita e conhecimentos técnicos acumulados ao longo dos últimos cinquenta anos, veremos que o potencial de acomodação da presente crise sistémica do Capitalismo, e sobretudo da sua superação para um patamar civilizacional mais equilibrado e sustentável, sem perder, nem a liberdade, nem a democracia, abre cenários de criatividade social a uma escala nunca vista, nem experimentada.

A globalização dos ogres pós-modernos tem que ser substituída por uma globalização verdadeiramente humana e panteísta.

terça-feira, maio 01, 2012

9999

Aceitará o BCE como colateral de próximos empréstimos o revolucionário papel higiénico preto da RENOVA? É resistente, e dura, dura, dura...


Enquanto não expusermos e enquanto não expulsarmos do sistema a nomenclatura que nos conduziu até este colapso não sairemos do buraco

ECB accepts Portugal Bonds due Dec. 31, 9999
“No joke: the European Central Bank accepts a Portuguese bond from the year 1943 as collateral due for repayment on Dec. 31, 9999. The ECB has turned into the dumping ground for European banks’ junk bonds. The practice could harm the central bank’s reputation as well as the Euro. The ECB issues Euros for almost everything.”

Webcompact

Paul Krugman propõe alegremente que a dívida pública americana chegue até aos 130% do PIB, ou seja, mais do dobro do limite imposto pela Alemanha aos seus parceiros comunitários. Para este neo-freak-neo-keynesiano não há nada melhor para tirar a América do pântano do que copiar o destino trágico do Japão, cuja depressão, que dura há mais de vinte anos, está a conduzir o país, literalmente, ao suicídio demográfico. O Japão conseguiu aguentar até hoje tamanho período de adversidade económica, por um lado, porque se manteve durante décadas como um dos maiores exportadores mundiais, privilégio que começou entretanto a perder, sobretudo depois de os países emergentes terem começado a copiar a sua receita de sucesso (1), e em segundo lugar, porque a sua economia assenta num modelo político inaceitável nas democracias ocidentais. Krugman receita, pois, o desastre tanto para o país que Obama prometeu mudar, como para os incautos e oportunistas da Europa.

O Quantitative Easing da FED e as LTRO (Long Term Refinancing Operations) promovidas pelo BCE, que têm vindo a alimentar sem limite nem vergonha os sistemas bancários e financeiros americano e europeu, têm conseguido até agora adiar o colapso das instituições financeiras e dos governos que se lançaram ao longo das últimas décadas numa fuga em frente, tipicamente especulativa no que toca aos piratas financeiros, e tipicamente populista, corrupta e keynesiana, no que respeita ao deficit spending da esmagadora maioria dos governos europeus. A previsível eleição de François Hollande aponta, infelizmente, para a continuação desta tendência para o abismo.

É que como todos sabemos, milhões de pessoas em todo o mundo estão a pagar com desemprego, falta de emprego, perdas de salário, quebras contratuais de direitos sociais, e falências empresariais e pessoais que não param de aumentar, uma receita que consiste basicamente em continuar a alimentar um buraco negro sem fim, cavado criminosamente pelos chamados derivados financeiros dos mercados paralelos (OTC derivatives). Ou seja, os criminosos estão a ser recompensados pelos seus crimes.

O BCE empresta com base em garantias, diz Mario Draghi. Mas que garantias são essas? Papel higiénico de boa qualidade, serve? Não valerá certamente menos do que os tais títulos emitidos pelo Estado português entre 1940 e 1943, e que constam de documento oficial do BCE (2) como vencendo no ano 9999, sendo, salvo gralha não denunciada, para garantir empréstimos recentes!

EUR    01/02/1942 00:00:00    31/12/9999
EUR    15/03/1943 00:00:00    31/12/9999
EUR    01/01/1940 00:00:00    31/12/9999


A culpa também é da Matemática, mas recai sobretudo em quem contrata os matemáticos da especulação.

Investment Banks & Financial Maths

“Are financial mathematicians responsible?

Incredibly, the ‘blame’ is limited to losing trillions. The debate focussed on whether the mathematical models or data they used as input were good enough; the question of whether it is ethical to provide the mathematical instruments for creating credits out of repackaged debts and to gamble with people’s live savings and livelihoods never entered into consideration. As one investment banker was quoted saying: “Banks need high level maths skills because that is how the bank makes money.” Those deals that spiralled so badly out of control would not have been possible in the first place without the collusion of financial maths and financial mathematicians, known affectionately and awe-inspiringly as “quants” in the trade, commanding salaries typically in millions and above.”

(...)

Tim Johnson, Academic Fellow in Financial Mathematics based at Heriot-Watt University and the Maxwell Institute for Mathematical Sciences in Edinburgh, said in his own defence [10]: “I was drawn into financial maths not because I was interested in finance, but because I was interested in making good decisions in the face of uncertainty...One of the key objectives of financial maths is to understand how to construct the best investment strategies that minimise risks in the real world.”  But he has not asked himself: minimise risks for whom and for what purpose that would serve humanity, or at least do them no harm.

ISIS

O debate ideológico destas questões é essencial para evitarmos o pior. Mas o silêncio sobre Ron Paul, entre muitos outros silêncios —como, por exemplo, sobre a confissão de um suposto co-autor do assassínio de um primeiro-ministro e de um ministro da defesa portugueses (3)—, é mais uma prova da clara insuficiência e falta de independência de um dos principais instrumentos do diálogo democrático: a nossa imprensa.





NOTAS
  1. O Japão descobriu uma fórmula para tornar-se um dos maiores exportadores mundiais ao longo das últimas décadas: manter a sua moeda escandalosamente subavaliada, emprestar ao exterior a juros próximos de zero (promovendo por esta via o célebre yen carry-trade), deslocalizar as suas indústrias para países com mão-de-obra muito barata, quase sem direitos sociais e com fraca ou nenhuma legislação ambiental e sanitária, boicotar pela via burocrática as importações (apesar de subscrever todas as regras do livre comércio), e manter uma economia de emprego muito paternalista, apoiada basicamente em dois pilares: o Estado, que alberga 1% da população (em Portugal, convém lembrar, a burocracia estatal corresponde a mais de 5% da população, 512 424 em Dezembro de 2011 — um dos pecados originais do nosso subdesenvolvimento endémico) e as corporações familiares que dominam o país, o sistema partidário rotativo e o aparelho estatal. As grandes obras públicas (que servem para substituir os empregos exportados para países baratos) e a fuga fiscal das corporações são os principais responsáveis pela gigantesca dívida pública do Japão, a maior do mundo, per capita, e em percentagem do PIB. Não deixa se ser curioso e trágico assistirmos à réplica deste modelo de capitalismo simultaneamente paternalista, autoritário e suicida nos Estados Unidos da América, e mais recentemente, na Europa!
  2. É impressionante o número de operações realizadas com o Banco Santander Totta, SA. (ver mapa do BCE)
  3. Duas citações da confissão de Farinha Simões:

    "Volto a Portugal, cerca de 5 ou 6 dias antes do atentado. É marcado por Oliver North um jantar no hotel Sheraton. Necesse jantar aparece e participa um indivíduo que não conhecia e que me é apresentado por Oliver North, chamado Penaguião. Penaguião afirma ser segurança pessoal de Sá Carneiro. Oliver North refere que Penaguião faz parte da segurança pessoal de Sá Carneiro e que é o homem que conseguirá meter Sá Carneiro no Avião. Penaguião afirma, de forma fria e directa que sá Carneiro também iria no avião, "pois dessa forma matavam dois coelhos de uma cajadada!" Afirma que a sua eliminação era necessária, uma vez que Sá Carneiro era anti-americano, e apoiava incondicionalmente Adelino Amaro da Costa na denúncia do trático de armas, e na descoberta do chamado saco azul do Fundo de Defesa do Ultramar, pelo que tudo estava, desde o início, preparado para incluir as duas pessoas. Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa. Fico muito receoso, pois só nesse momento fiquei a conhecer a inclusão de Sá Carneiro no atentado. Pergunto a Penaguião como é que ele pode ter a certeza de que Sá Carneiro irá no avião, ao que Penaguião responde de que eu não me preocupasse pois que ele, com mais alguém, se encarregaria de colocar Sá Carneiro naquele avião naquele dia e naquela hora, pois ele coordenava a segurança e a sua palavra era sempre escutadda. No final do jantar, juntam-se a nós três o General Diogo Neto e o Coronel Vinhas.

    Fico estarrecido com esta nova informação sobre Sá Carneiro, e decido ir, nessa mesma noite, à residência do embaixador dos EUA, na Lapa, onde estava Frank Carlucci, a quem conto o que ouvi. Frank Carlucci responde que não me preocupasse, pois este plano já estava determinado há muito tempo. Disse-me que o homem dos EUA era Mário Soares, e que Sá Carneiro, devido à sua maneira de ser, teimoso e anti-americano, não servia os interesses estratégicos dos EUA. Mário Soares seria o futuro apoio da política americana em Portugal, junto com outros lideres do PSD e do PS. Aceito então esta situação, uma vez que Frank Carlucci já me havia dito antes que tudo estava assegurado, inclusivamente se algo corresse mal, como a minha saída de Portugal, a cobertura total para mim e para mais alguém que eu indicasse, e que pudesse vir a estar em perigo. Isto é a usual "realpolitik" dos Estados Unidos, e suspeito que sempre será."

    (...)

    "A este respeito gostaria de acrescentar que numa reunião que tive, a sós, em 1986, com Lencastre Bernardo, num restaurante ao pé do edifício da PJ na Rua Gomes Freire, ele garantiu-me que Pinto Balsemão estava a par do que se ia passar em 4 de Dezembro. No restaurante Fouchet's, em Paris, Kissinger tinha-me dito, “por alto”, que o futuro Primeiro Ministro de Portugal seria pinto Balsemão. E importante referir que tanto Henry Kissinger como Pinto Balsemão eram já, em 1980, membros destacados do grupo Bilderberg, sendo certo que estas duas pessoas levavam convidados às reuniões anuais desta organização."

    Comentário: se a confissão é um delírio, a Embaixada dos EUA e o nosso governo devem desmentir. Se não podem desmentir, então é o maior escândalo imaginável nas relações entre dois aliados. Terá a CIA encomendado o assassínio de um primeiro-ministro e de um ministro da defesa de Portugal? Como classificariam os EUA tal ação se os alvos fossem o seu presidente e o seu secretário de estado da defesa? Terrorismo, certo?

sábado, julho 09, 2011

O fim de uma era

Verão 2011: depois do sonho, um pesadelo inesperado - I



A corrida espacial foi iniciada pelos russos e tudo leva a crer que serão os últimos a fechar a porta. Mais de 8000 despedimentos, directos e indirectos, são esperados na NASA. Até que a promessa de Obama, à laia de compensação, se cumpra —levar os americanos a Marte e a mais um asteróide qualquer— a América andará à boleia do vai-e-vem russo, fazendo ao mesmo tempo muitos votos para que o turismo espacial arranque!

É possível que os bilionários globais do futuro ganhem massa crítica suficiente para sustentar um tal negócio imbecil. Tenho, porém, sérias dúvidas de que tal venha a ocorrer. O que na realidade este último lançamento da nave espacial Atlantis assinala é o fim de uma era e o prenúncio de uma longa e desconhecida crise social à escala planetária, de que o colapso do sistema financeiro mundial, em curso desde 2007-2008, é o epifenómeno.

As causas deste colapso são de ordem sistémica, sendo por isso impossível travar semelhante derrocada. Ao longo dos últimos duzentos anos a humanidade cresceu demais, envelheceu e tornou-se uma espécie predadora perigosa para todas as demais formas de vida, à excepção das bactérias e dos vírus, além de assustadoramente autofágica. O empinar da sua longa curva de crescimento demográfico deveu-se principalmente ao descobrimento e aproveitamento tecnológico de três fontes de energia abundantes e baratas até meados da década de 1970: o carvão, o petróleo e o gás natural. Mas à medida que, por um lado, o consumo humano das reservas energéticas, dos recursos minerais e dos solos vivos da Terra crescia exponencialmente, acompanhando a explosão demográfica e o enriquecimento de uma parte da humanidade, por outro, estas mesma base finita do desenvolvimento desigual cedo começaria a dar sinais de esgotamento.

Lentamente, entre 1973 e 2007, até chegar ao pára-arranca actual da economia mundial, as previsões de Thomas Malthus, M. King Hubbert, Rachel Carson, do trio Donella Meadows, Jorgen Randers e Dennis L. Meadows, ou ainda do médico, ornitólogo e ambientalista Jared Diamond, ganharam uma actualidade crítica dificilmente disputável. As subidas dos custos da energia fóssil afectam imediatamente o crescimento, obrigando este a ajoelhar até à recessão; a recessão baixa temporariamente o preço do petróleo, até que a economia dá sinais de melhoria, mas à medida que estes sinais se traduzem em mais encomendas de matérias primas e consumo humano à escala global, a pressão da procura sobre as reservas energéticas acaba por reenviar as economias para taxas de crescimento anémicas e para a estagnação, provocando finalmente novas recessões. Mas ao contrário deste sobe-e-desce, o desemprego, a falta de emprego, a inflação real e a perda imparável do poder de compra da esmagadora maioria das pessoas, de que a destruição das classes médias no Ocidente é um sinal mais do que evidente e dramático, instalaram-se como os novos e reveladores invariantes do declínio cada vez mais evidente do paradigma de desenvolvimento humano decorrente do abuso sem precedentes das riquezas naturais disponíveis à face da Terra.

Sem este cenário de fundo corremos o risco de ir simplesmente atrás da espuma dos dias e das intrigas palacianas a que a propaganda mediática se entrega como sua própria condição de sobrevivência.

À medida que os salários e em geral os custos sociais do trabalho foram aumentando nos Estados Unidos e na Europa, sobretudo após a guerra mundial de 1939-1945, a par de uma subida paulatina dos preços da energia, das matérias-primas e dos alimentos oriundos das antigas colónias americanas, asiáticas, do Médio Oriente e africanas, as economias ocidentais, embora muito competitivas e produtivas no interior dos respectivos países e alianças de comércio livre, viram baixar drasticamente a competitividade das suas exportações para o resto do mundo. As mesmas moedas fortes —o dólar, a libra inglesa, o franco suíço e o marco alemão— que serviam para controlar os preços das importações de preciosos recursos oriundos dos países pobres, manipulando-os enquanto pareciam sem fim, impediam as nações mais fracas de aceder às manufacturas cada vez mais tecnológicas do Ocidente.

A opção dos Estados Unidos e da Europa foi então, sobretudo depois da longa crise económico-financeira que vai do colapso de 1929 até ao fim da Segunda Guerra Mundial, expandir a procura interna e o consumo popular nos seus grandes espaços económicos. Mas para atingir este desiderato, a principal medida de estratégia económica e financeira adoptada foi expandir consistentemente a oferta e a circulação monetárias, aumentando ao mesmo tempo para níveis sem precedentes em tempo de paz os tectos do endividamento público. O chamado deficit spending não nasceu, portanto, neste século, mas com o New Deal (1933-1936) de Roosevelt, e com o Plano Marshall (1948-1951).

O que aconteceu entretanto foi que esta estratégia deixou, sobretudo a partir da década de 1960 (por alturas da formação da OPEP), de assentar num certo equilíbrio entre produção e consumo, passando a estar ancorada cada vez mais na combinação fatal entre dois tipos de inflação inusitada: a inflação do consumo (elevada entretanto a uma verdadeira cultura do consumo conspícuo), e a inflação do crédito, conseguida através do abandono do padrão ouro e de uma imparável política de diminuição das taxas de juro. Mas os preços crescentes das matérias primas solicitadas por uma demografia planetária em crescimento explosivo, apoiada nos equilíbrios diplomáticos saídos da derrota da Alemanha (bipolarização EUA-Europa versus URSS, ou EUA-Europa versus URSS+China), começaram a erodir de forma grave as expectativas de lucro das empresas e dos investidores ocidentais, tornando-os cada vez mais sensíveis aos custos directos e indirectos do trabalho que dentro dos EUA e na Europa esmagavam de forma imparável as suas margens de lucro. Numa primeira fase, Washington, Londres e Berlim começaram a abrir as suas fronteiras aos produtos industriais —nomeadamente os automóveis, máquinas e material electrónico em geral— muito mais baratos, oriundos do Japão. Depois abriram-se aos produtos coreanos, e finalmente aos chineses. A fase seguinte, na realidade uma decisão fatal, foi a imposição estratégica do processo da globalização comercial e financeira, promovendo através desta destruição das barreiras alfandegárias à escala mundial, três processos destinados a atrasar o declínio social do Ocidente, sem atacar verdadeiramente as suas causas:
  1. transferência dos processos produtivos, tecnologias e marcas para os países de trabalho barato, ausência de regras e moedas subavaliadas;
  2. aumento exponencial da disponibilidade de liquidez no sistema financeiro, nomeadamente através da diminuição deslizante dos rácios de solvabilidade dos bancos e sociedades de investimento não reguladas —ver aqui a longa série (1975-2011) do stock de moeda da Reserva Federal, conhecido por M1;
  3. criação de produtos derivados financeiros cada vez mais complexos, com o objectivo inconfessável de expandir até limites inimagináveis a capacidade de endividamento das antigas potências coloniais: o valor nocional do mercado de derivados financeiros OTC era em Dezembro de 2010 de aproximadamente 10xPIB mundial (BIS).
Resumindo: a humanidade, liderada por um Ocidente irresponsável, atingiu o planalto insustentável de três curvas de exaustão: o Pico do Petróleo, o Pico Demográfico e o Pico da Liquidez Especulativa. Para sair daqui não bastam os Memorandos de Entendimento com o FMI, o BCE e a Comissão Europeia. É preciso muito mais!

(continua)