sábado, janeiro 04, 2014

A próxima revolução industrial


A tecnologia e a cultura low cost vieram para ficar

The Nearly Free University and The Emerging Economy:
The Revolution in Higher Education (Of Two Minds)

Reconnecting higher education, livelihoods and the real economy

[...] modern colleges and universities have collectively become a rent-seeking cartel, an alliance of nominally competitive institutions that maintains a highly profitable monopoly of accreditation. To grasp the power of the cartel, consider a typical Physics I course even at MIT is almost entirely based on Newtonian mechanics, and the subject matter entirely in the public domain. Only a cartel could arrange to charge $1,500 and more per student for tuition and texts, in the face of far lower cost and superior quality materials, for subject matter that is no more recent than the 19th Century.

Charles Hugh Smith

A próxima revolução industrial já começou e poderia chamar-se Low Cost. Um exemplo do efeito low cost na economia é bem conhecido em Portugal. Toda a gente se lembra dos preços caros da TAP e das demais companhias de bandeira que pousavam em Lisboa, no Porto e em Faro. Toda a gente se lembra ainda da falta de ligações aéreas do Porto para fora do país, obrigando os cidadãos e a gente de negócios do Norte a viajarem de carro ou de comboio até Lisboa para poderem ir até Milão e muitas outras cidades europeias trabalhar, ou do preço exorbitante dos voos Porto-Lisboa, cujos passageiros eram frequentemente, para não dizer invariavelmente, subsidiados pelo estado e empresas públicas, pelas fundações, ou por grandes empresas.

No entanto, foi a concorrência dos voos low cost, sistematicamente ignorados ou criticados pelos lordes da TAP e dos governos de turno, que mudou o panorama da mobilidade aérea do país, permitindo um autêntico boom no turismo de fim-de-semana e nos negócios em plena crise financeira, ao mesmo tempo que demonstrava a insanidade e a corrupção que rodearam o embuste do novo aeroporto da Ota, primeiro no leito de cheia do rio Ota, depois na várzea de sobreiros e em cima do lençol freático da bacia do Tejo na zona de Alcochete-Rio Frio-Canha. Basta passear hoje pelo Aeroporto da Portela para ver as centenas de metros de balcões de check-in permanentemente vazios. Já não servem para nada. O mundo low cost, que envolve viagens incomparavelmente mais baratas do que as oferecidas pelas companhias públicas subsidiadas e pelos antigos oligopólios de slots, implica ligações ponto-a-ponto sem pernoita das tripulações fora de casa, implica uma penalização do excesso de bagagem individual, implica o fim dos aperitivos, refeições e refrescos de borla em viagens de médio curso, implica check-in online, implica tripulações menos numerosas e com algum acréscimo de funções, implica estadias nas placas dos aeroportos de menos de uma hora... implica o desenvolvimento paralelo da hotelaria e dos transportes citadinos em conformidade, ou seja, práticos, transparentes, baratos e disponíveis online. Resumindo, o fim da energia barata e a entrada do Médio e Extremo Oriente, Brasil e partes de África na partilha do bolo do desenvolvimento decretou, sem apelo nem agravo, o início de uma economia mais eficiente, mas também uma dieta sem precedentes em todos os setores parasitários ou pouco produtivos da sociedade. O colapso do sistema financeiro associado à acumulação insustentável do endividamento dos estados e suas empresas perdulárias veio apenas acelerar uma tendência anunciada e sem retorno.

Estado low cost, saúde low cost, educação low cost, mobilidade low cost 

Enganam-se, porém, aqueles que julgam que low cost é sinónimo apenas de voos baratos. A mesma lei que forçou o transporte aéreo a um gigantesco esforço de adaptação à energia cara (apesar de ainda beneficiarem de combustíveis altamente subsidiados, ao contrário do transporte rodoviário), está neste momento a forçar os governos a assumirem as suas gigantescas dívidas. Para já, os governos populistas enveredaram por atacar o problema pela linha de menor resistência, ou seja, os velhos e a classe média, usando o fascismo fiscal e a propaganda como armas. Mas esta via é claramente insuficiente!

Como a Troika, e bem, se tem fartado de avisar, sem uma clara e estrutural diminuição do peso do estado na economia e na vida das pessoas, o défice continuará a subir, a dívida não descerá significativamente, e o peso dos juros continuará a somar, ameaçando destruir literalmente os países que não reagirem a tempo à teimosia das elites corruptas que tomaram de assalto as democracias falidas e falhadas, como Portugal, Espanha, a Grécia, ou Chipre.

Em vez da caricata, hipócrita e destrutiva 'luta de classes' que os esqueletos da 'esquerda' pretendem retomar, como se estivéssemos no início da era do carvão, ou no início da era do petróleo, precisamos, sim, de uma visão estratégica para ultrapassar a evidente metamorfose do Capitalismo (mais uma) em curso.

Por razões acumuladas —o fim da energia barata, a deslocação de uma parte significativa do trabalho produtivo ocidental para o Oriente e em geral para os países atrasados, o envelhecimento e a quebra demográfica dos países industriais avançados, o endividamento geral das sociedades e o empobrecimento das classes médias ocidentais— o chamado 'estado social' ruiu. Morreu na forma até agora conhecida e não vai reviver, salvo se houver uma transformação radical alimentada por uma visão semelhante à filosofia low cost que um dia Alfred E Khan teve para atacar o problema do entorpecimento da aviação americana e que Jimmy Carter viria a colocar no papel e nas pistas em 1978. Então o gigante Pan Am faliu, e a Southwest Airlines adaptou-se.

Sem entrar em mais pormenores, que deixarei para outros escritos, diria o seguinte:

— ou, tal como as companhias de aviação, os sistemas sociais, educativos e de saúde que fazem parte do 'estado social' são capazes de caminhar rapidamente para uma transformação profunda, e sobrevivem, ou deixam-se enredar pelos trocadilhos baratos da chicana partidária que entope diariamente os canais da propaganda mediática, e acabam por falir... como a Pan Am faliu, e como a TAP faliu.

Não será por falta de certidões de óbito que as realidades serão diferentes do que são.