terça-feira, janeiro 29, 2013

1,2,3, Portugal

A barreira energética é a verdadeira causa da metamorfose em curso...

Os dados estão lançados. Cabe-nos, como ao resto mundo, tentar a transição par uma espécie de futuro-anterior

O Crescimento potencial do PIB mundial previsto pela OCDE (1) em 2012 é, no período 2012-2017, de 3,4%, em 2018-2030, de 3,3%, e entre 2031 e 2050, de 2,4%. Os crescimento do emprego nos mesmos períodos será de 0,9%, 0,6% e 0,1%. Tendo em conta o crescimento acelerado dos países mais populosos, menos industrializados, menos protegidos socialmente, e também menos instruídos da OCDE —Turquia, China, Indonésia, Índia e Chile (com taxas anuais médias de crescimento acima dos 5%)— é evidente que os países mais desenvolvidos tenderão a crescer abaixo dos valores médios acima indicados.

Assim, para Portugal, as previsões da OCDE em matéria de crescimento do PIB são de 0,7% no intervalo 2012-2017, de 1,9%, entre 2018 e 2030 e de 1,6% de 2031 a 2050. O crescimento potencial do emprego nos mesmos períodos será sucessivamente de 0,1%, 0,1% e -0,4%.

Ou seja, quer a nível global, quer no cantinho luso-galaico, nos próximos trinta e sete anos é sempre a descer. O ritmo do crescimento abranda, incluindo na China, onde a OCDE prevê que passe de um crescimento potencial na ordem dos 8,9% em 2012, para 2,8% em 2050. Esta tendência é também verdadeira para a demografia mundial, cujo pico de crescimento deverá ocorrer, segundo a ONU, por volta de 2030-2040.

Se houver erro neste cenário da OCDE, será por excesso (de otimismo), e não por defeito.

A algazarra mediática interminável a que temos assistido não passa, portanto, de uma cortina de fumo que é preciso desfazer, sob pena de não vermos o que realmente aí vem: o fim de uma era de crescimento e inflação (2); um longo período de estagnação económica e empobrecimento, eventualmente acompanhado por guerras sucessivas em volta dos principais recursos energéticos da nossa civilização industrial: carvão, petróleo, gás natural e urânio; e depois desta grande contração que poderá só bater no fundo por volta de 2030 —se tivermos sabido evitar a mesma sorte dos habitantes da Ilha da Páscoa— iniciar então uma nova era de equilíbrio mundial.

Chegou o momento de afastarmos as dicotomias confortáveis. José Sócrates foi um irresponsável, mas o que está a cair em cima de todos nós não é fundamentalmente obra sua. Vem de trás, vem, pelo menos, dos anos 70 do século passado, e até foi previsto por um geólogo americano em 1956 —M. King Hubbert (3).

Os números acima citados do relatório da OCDE (1) ajustam-se que nem uma luva negra a este quadro sobre a evolução das taxas médias de crescimento mundial ao longo dos últimos sete mil anos (4):

A grande aceleração deu-se entre 1950 e 1970.

Estamos neste preciso momento a entrar à escala global numa fase muito perigosa.

Não é possível crescer sem consumir mais energia. Crescer pela via do endividamento (usando o consumo como falácia do crescimento) é um falso crescimento e uma solução tentada desde a década de 1970, mas que chegou ao fim. As principais fontes energéticas do crescimento real acelerado —carvão, petróleo, gás natural e urânio—estão à beira de deixarem de ser abundantes e baratas.

Por duas vezes a Alemanha foi travada no seu dinamismo industrial, precisamente pela via da limitação do seu acesso à energia petrolífera. O mesmo sucedeu ao Japão durante a Segunda Guerra Mundial, inicialmente desencadeada para travar a Alemanha, mas que serviu também para condicionar manu militare a expansão já então iminente da Ásia. A recente criação do Africon, por iniciativa e comando dos Estados Unidos da América, a par da desestabilização árabe, e da recente operação especial montada no Mali (principal fornecedor de urânio à França e à China—que nos próximos vinte anos poderá ter que passar das atuais onze centrais nucleares para... 245!), ou ainda a guerra movida pelo dólar contra o euro desde 2008, são sinais evidentes de um novo e próximo choque das placas geopolíticas mundiais. O motivo é um só: assegurar o acesso ao último atum, ao último barril de petróleo, e ao último átomo de urânio!

Se não houver vontade nem imaginação suficientes, a correção do excesso de procura agregada mundial será realizada uma vez mais pela via da destruição maciça da capacidade produtiva global e de milhões de vidas humanas inocentes.

Portugal, uma sociedade a caminho da transição?

Admitindo que cada país pode e deve fazer o seu trabalho de casa, creio que entre nós é cada vez mais urgente tomar consciência de uma realidade: o nosso sistema político está esgotado e não pode ultrapassar a inércia que o tolhe se não rasgar a presente Constituição e escrever uma outra, mais inteligente, menos ideológica, menos autoritária, menos orientada para a defesa económica e institucional das burocracias e da casta partidária, e mais estimulante do ponto de vista cultural.

O país está prisioneiro de uma nomenclatura burocrática, partidária e rentista, que não só agravou irresponsavelmente o sobre-endividamento do país —o quinto maior do planeta (5)— como resiste de todas as formas e feitios à mudança necessária, usando nomeadamente a constituição, o parlamento, os juízes e o presidente da república como armas de arremesso. A nomenclatura partidocrata, burocrática e rentista portuguesa age contra a própria economia, induzindo mesmo, pelo bloqueio que ergue à ação do governo, maior austeridade sobre a generalidade dos portugueses. Vale tudo para defender os seus indecorosos privilégios e mordomias. Esta realidade tem que mudar!

Neste ponto, como na situação mundial, não sabemos se o ajustamento que ainda falta fazer será conseguido de forma caótica, pela via da destruição social e da guerra civil, ou se, pelo contrário, seremos capazes de desenhar uma via de partilha efetiva de dificuldades e de cooperação criativa no desenho da sociedade de transição para que devemos caminhar em alternativa ao modelo de extinção da Ilha da Páscoa.

Temos que refundar o nosso modelo constitucional, de desenvolvimento e de sociedade. Por menos do que isto não iremos a parte nenhuma. O caminho passa por três decisões estratégicas fundamentais e urgentes:
  1. menos Estado
  2. eficiência económica
  3. fim do fascismo fiscal
O diagrama que se segue é sobretudo uma agenda de discussão que proponho à sociedade numa altura em que o sistema resiste como pode à adaptação e às necessárias mudanças.



NOTAS
  1. OECD Economic Outlook,
    Volume 2012/1
    Chapter 4
    MEDIUM AND LONG-TERM SCENARIOS
    FOR GLOBAL GROWTH
    AND IMBALANCES 
  2. Vale a pena ler a este propósito, de uma ponta à outra, The Great Wave—Price Revolution and the Rhythm of History, de David Hackett Fischer (1996); e ainda The End of Growth—Adapting to Our New Economic Reality, de Richard Heinberg (2011).
  3. Não há como ir às fontes, em vez de perdermos tempo com os Roubini e os Krugman da farsa mediática em curso. E a principal fonte é esta: M. King Hubbert, “Nuclear Energy and the Fossil Fuels”. Presented before the Spring Meeting of the Southern District, American Petroleum Institute, Plaza Hotel, San Antonio, Texas, March 7–8-9, 1956 (PDF).
  4. As décadas sombreada a verde (1950-1970) correspondem ao período de ouro negro abundante e barato. O crescimento em contra tendência da primeira década deste século corresponde ao grande endividamento da América e da Europa e ao período das maiores bolhas especulativas de sempre na história da economia mundial.
  5. As estatísticas variam consoante as fontes de informação e os métodos de estimativa utilizados. Todas elas, porém, colocam Portugal entre os cinco países mais endividados do mundo. Citamos, para o efeito, a estatística porventura menos desfavorável das que tenho consultado: “Total Debt in Selected Countries Around the World”, Global Finance, 2012.


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