domingo, agosto 31, 2008

Allgarve

Férias à beira do cimento

Os nove dias de praia e grelhados em Olhos de Água terminaram antes da hora prevista, por causa de um inesperado amanhecer fresco e nevoento (1). O famoso mar do Algarve não esteve tão cálido como seria de esperar. Mas nem por isso houve menos veraneantes, sobretudo do norte do país, ingleses, mais espanhóis do que alguma vez vi por aquelas bandas, eslavos, italianos, alemães e franceses. Alguns milhares de veraneantes que optaram este ano pelo "Allgarve" foram seguramente mais sensíveis à leveza das suas contas bancárias do que aos apelos publicitários da mente brilhante do BES e actual ministro do governo "socialista", Manuel Pinho. Consequências, em suma, da crise económica e financeira em curso.

A longa e extraordinária falésia entre Olhos de Água e Vila Moura, que há mais de uma década me fascina continua sob uma criminosa pressão urbanística e automóvel. Os distraídos de Olhão, que certamente não ouviram falar do pico petrolífero, nem da água que deixou de chegar a muitos pomares e quintais, assinaram contratos para construir um autódromo e mais não sei quantos campos de golfe.

Sabiam que um campo de golfe com 18 buracos consome em média 5 metros cúbicos de água por dia, i.e. mais de 1800 milhões de litros de água por ano, o suficiente para satisfazer o consumo médio anual de 2000 pessoas? Quantos campos de golfe portugueses são alimentados com águas recicladas ou dessalinizadas? Está na altura de exigir auditorias regulares aos impactes ambientais destrutivos, quer dos desportos motorizados, quer dos campos de golfe que proliferam como coelhos no nosso país. Outro tipo de auditorias necessárias diz respeito ao próprio negócio multinacional especulativo dos campos de golfe, a maioria dos quais acaba na falência e ao colo dos bancos e sócios que foram no conto do vigário.

Ao que parece, há uma crescente presença da indústria turística espanhola no "Algarbe". Prevejo, pelo andar apressado da carruagem, que los promotores, que em Espanha como cá mandam nos políticos de turno, estejam a ponto de parir um terramoto urbanístico no pouco que resta da costa algarvia ainda livre das barbaridades da dita "construção civil". Quem deu cabo de toda a costa marítima espanhola, prepara-se agora, ao que parece, para rebentar de vez com o Algarve. Espero que os algarvios acordem a tempo e travem a corja que ameaça exportá-los para as degradantes periferias de Lisboa, Setúbal, Huelva e Sevilha. Não tenham dúvidas de que é a sorte que espera os vossos filhos, se não formos capazes de agir a tempo.

O ano passado visitei o horror de Ayamonte, a povoação andaluza vizinha de Vila Real de Santo António. A primeira coisa que vi foram bandos de prostitutas à entrada da povoação. Não me pareciam profissionais sofisticadas, mas antes pobre gente desempregada acudindo em desespero de causa à humilhação. Tinham o mesmo semblante envergonhado que há anos atrás encontrara no Vale do Ave num daqueles anos em que centenas de fábricas fecharam as suas portas. Claro que a "esquerda caviar" do PSOE, que é igual a toda a "esquerda caviar" europeia, i.e. neo-liberal, novo-riquista e aparvalhada, ignora estes pequenos detalhes da civilização e segue alegremente em frente na direcção do precipício social.

O dono de um simpático restaurante algarvio comentava os novos hotéis espanhóis de Olhos de Água: "Eles não compram cá nada! Nadinha mesmo. Até a água trazem de Espanha! É ver os camiões que chegam todas as manhãs ao parque do hotel: leite, pão, água, tomate, fruta, carne... e peixe espanhóis. Tudo espanhol! Uma vergonha. -- Vá lá a Espanha montar um restaurante ou um hotel, e veja se o deixam fazer o mesmo. É ó deixas!! Olhe o Marrachinho foi vendido aos franceses e o Ali-Super vai pelo mesmo caminho! Uma tristeza, sabe. Uma tristeza"

As previsões sempre optimistas do futuro turístico do Algarve esbarram numa realidade cada vez mais dura, que os pequenos políticos não querem ver: o declínio económico-social da Europa. O turismo de massas e o bem estar social foram inventados por causa e sobretudo para as classes médias. No entanto, estas estão a desaparecer rapidamente, tanto nos Estados Unidos, como na Europa, enquanto prometem emergir noutros continentes! Os célebres 150 mil postos de trabalho prometidos pelo "socialista" José Sócrates são empregos maioritariamente temporários, precários, socialmente desprotegidos e mal pagos, que vão substituir nas estatísticas do emprego os profissionais produtivos com anos de formação, e os especialistas, por uma nova espécie de estivadores intelectuais mal pagos, descartáveis e mendicantes. Ou seja, um proletariado novo, socialmente inconsciente (veremos por quanto tempo) e sem qualquer rede social ou sindical a segurá-los. Fantástico, não é? O mal formado engenheiro que faz de primeiro ministro ainda tem a lata de inaugurar "call centers"! O Salazar mandava os seus ministros inaugurar chafarizes. Sempre tinha alguma noção das proporções!

As economias ocidentais estão a transformar-se em economias de telefone, casinos financeiros e prostituição sofisticada (de que a classe política é uma sub-espécie em franco renascimento.) Vêm no entanto substituir empregos outrora úteis à sustentabilidade económica, social e ecológica das sociedades, razoavelmente bem pagos, estáveis e socialmente protegidos. Alguém ouviu o Bloco de "Esquerda" desmontar este truque de prestidigitação do Capitalismo decadente, que está a levar os EUA e a Europa à beira do colapso civilizacional? Não não ouviram! É que o Bloco aprendeu a ser um partido "responsável", rezando agora banalidades de "esquerda" do alto da sua frágil estabilidade parlamentar. Nunca pensaram muito na causa das coisas, mas agora menos. Do que mais gostam é mesmo viajar e exibir a sua ridícula maioridade política. Pobres diabos! Se Manuela Ferreira Leite continuar a dominar a agenda política como fez até agora -- investimentos prioritários para o país, questão social urgente e eficiência do Estado, nomeadamente na prevenção e punição do crime individual e organizado --, pondo o necessário ênfase numa visão clara e pro-activa dos interesses nacionais, sem cedências ao Bloco Central do Betão, e manobrando habilmente os poderes fáticos das grandes famílias (Espírito Santo, Mello e Cª), tenho poucas dúvidas de que a esquerda adormecida que actualmente hegemoniza o parlamento (sem deixar herança que se veja), passará à Oposição em 2009.

No Algarve, desliguei-me da Net. Faz parte da terapia. Mas ainda assim fui lendo a nossa indigente imprensa escrita. Ignorava que estava tão mal fornecida de assuntos, de verdadeiros jornalistas e de escritores. Que desgraça! Em tempos fazia a diferença para a desmiolada televisão. Hoje está mil vezes pior que a desmiolada televisão. Santa Net!

Regresso ao trabalho.



NOTAS
  1. Pode ser que a causa deste Verão esquisito esteja na actividade explosiva de alguns vulcões:
    Vulcão Okmok Caldera (Alasca, USA), 12 Julho 2008
    Vulcão Llaima, (Cherqunco, Chile), 10 Julho 2008
    Vulcão Chaiten (Patagónia, Chile), 02 Maio 2008
    Vulcão Soputan, Sulawesi (Indonésia) 6 Junho 2008
    Vulcão Rabaul, Kokopo (Papua Nova Guiné), 13 Abril 2008
    Vulcão Galeras (Colômbia) 18 Janeiro 2008

OAM 424 02-09-2008 00:32

quarta-feira, agosto 20, 2008

Angola 2

A caminho da democracia

Trinta e três anos de independência e oito de paz (embora com altíssimas taxas de criminalidade de origem sobretudo social) são dados que nos devem ajudar a pensar no futuro de um imenso país, sub-povoado, praticamente destruído por vinte sete anos de guerra civil, crescendo a uma taxa meteórica de 16% ao ano (ainda que o seu actual PIB não chegue a 40% do PIB português), mas presa inevitável da cobiça universal.

As riquezas naturais de Angola são o petróleo, o gás natural, os diamantes, o ferro, o ouro, o café, o algodão e um imenso território apto a receber no futuro as multinacionais agro-energéticas da era pós-petrolífera. A sua maior desvantagem reside na demografia e nas assimetrias antropológicas. A população é escassa para tamanho território e encontra-se profundamente dividida por linhas étnicas, culturais e sócio-económicas que a qualquer momento poderão voltar a submergir o país em dificuldades extremas.

Angola tem 1600 Km de costa atlântica e cinco bons portos que serão certamente ampliados ao longo deste século, por forma a dar escoamento ao caudal de matérias primas e biocombustíveis líquidos de que o resto do mundo precisa. Diria, portanto, que o maior problema deste jovem país a caminho da democracia, deriva menos do nepotismo e da corrupção de que tanto se fala nas "insuspeitas" democracias europeias, do que da ausência de uma percepção clarividente do futuro, no quadro potencialmente cismático da globalização.

O primeiro pensamento que me ocorre sobre o futuro de Angola é este: como estarão a sua economia e as suas populações daqui a 20-25 anos? Quando o mundo caminhar sobre novas plataformas energéticas, não petrolíferas, qual será a principal exportação de Angola? Estarão os angolanos a prever desde já os efeitos do pico petrolífero no seu país? Qual será o lugar da antiga colónia portuguesa na era pós-carbónica que se aproxima?

O mundo dependerá cada vez mais de energias renováveis baseadas em fórmulas avançadas de utilização do vento, do Sol, das ondas do mar, do Pinhão Manso (Jatropha curcas) e outras plantas não comestíveis, bem como do urânio e do tório que alimentará a próxima geração de reactores nucleares. Boa parte da produção eléctrica na segunda metade deste século terá origem, muito provavelmente, em tecnologias nucleares limpas e seguras.

Que lugar estratégico ocupará assim Angola no renovado contexto produtivo mundial? Quais serão as suas alianças dominantes? Ter-se-à deixado colonizar pela China, ou terá decidido, a determinado ponto da sua trajectória democrática, optar por uma estratégia claramente atlântica, privilegiando as suas ligações históricas ao Brasil, a Portugal e ao Golfo da Guiné? Quanto tempo demorará Angola a perceber que a sua posição é de facto central na definição de uma verdadeira potência lusófona? Norton de Matos havia sonhado, em 1912, com um novo império português com capital no Huambo. O mundo entretanto mudou, mas a geografia humana, felizmente, ainda não.

José Eduardo dos Santos, que não conheço, tem no decurso das eleições dos próximos dias 5 e 6 de Setembro uma oportunidade de ouro para lançar as bases institucionais e culturais da democracia angolana do século 21, peça chave de uma das zonas mais influentes do planeta -- o Atlântico --, e condição, não duvide o senhor Presidente, da sobrevivência e estabilidade a prazo do seu imenso país.

A unidade de Angola é um bem insofismável para si própria, para a África e para a prosperidade e segurança atlânticas, de que os povos irmãos de Portugal, Brasil, Guiné, Cabo-Verde e São Tomé e Príncipe (para não falar de Moçambique e até de Timor) saberão tirar o melhor partido, retribuindo pelo lado da cooperação e da solidariedade indefectíveis.

Nas vossas primeiras eleições verdadeiramente democráticas desejo-vos, como se diz por cá, uma boa hora !

OAM 423 20-08-2008 17:08

terça-feira, agosto 19, 2008

Portugal 44

Intensidade energética e declínio

A mais completa prova estatística de que a obsessão por auto-estradas e automóveis foi a pior escolha estratégica que Portugal alguma vez poderia ter feito está nesta insuspeita página da OCDE, de 17 de Abril de 2007.

Lendo com atenção este exaustivo repositório da OCDE sobre a intensidade energética (IE) da economia portuguesa conclui-se sem margem para dúvidas que temos vindo a piorar desde 1971 relativamente a todos os países do mundo, e não apenas face aos nossos parceiros da União Europeia.

Em todo o mundo, excepto Portugal, há um esforço visível para diminuir a intensidade energética das economias -- isto é, a quantidade de energia primária necessária para produzir uma unidade de Produto Interno Bruto (PIB). Brasileiros, holandeses, mexicanos, polacos, americanos ou chineses, todos, menos nós, procuram tornar as suas economias mais eficientes, começando, claro está, por racionalizar, em nome dos respectivos interesses nacionais, os seus sistemas de transportes, as suas matrizes energéticas e as suas políticas de endividamento público e privado. O caso lusitano, porém, é dramático e ridículo ao mesmo tempo.

Sem outra alternativa que não seja importar 90% da energia que consome, nenhum governo se lembrou até agora de poupar, a não ser na população activa, que alegremente exporta para Espanha, Reino Unido, Suiça, Noruega, etc., ou nos salários dos mais pobres e remediados. A proliferação de novos bairros de exclusão social e étnica, onde a violência cresce diariamente, vem aliás mostrar os resultados previsíveis de um desenvolvimento económico que em vez de ter apostado no crescimento consolidado dos recursos, das realizações e das expectativas, preferiu promover uma economia de clientelas, especulativa, informal, corrupta e irresponsável.

Nisto se perderam exactamente 33 preciosos anos. Agora, com a recessão americana e europeia a destruir boa parte dos expectáveis efeitos favoráveis do último quadro comunitário de apoio (2007-2013), e a aproximação vertiginosa dos efeitos catastróficos do pico petrolífero e do aquecimento global, que nos resta?

Para já, uma democracia distorcida e um país desamparado, cuja classe política, incapaz de pensar ou dizer o que pensa, pouco pode oferecer. Um punhado de jovens socialistas, verificada que foi a inutilidade da esperança depositada em Manuel Alegre, publicitou no Expresso a sua manifesta oposição à escandalosa desfiguração neoliberal do PS. Alberto João Jardim ensaiou, da pacata praia de Porto Santo, lançar um Grito do Ipiranga a favor de um partido nacional federalista (ou será que disse regionalista?), depois das próximas eleições para a Assembleia da República. São sinais claros do fim de um regime, ou pelos menos de um ciclo partidário cuja recomposição se fará no quadriénio 2009-2013, se não antes. A actual crise constitucional em volta das declarações de Carlos César e do populismo parlamentar dominante pode agravar-se. Se tal ocorrer, então teremos certamente mais partidos a disputar as legislativas de 2009. No fundo, ganhar-se-ia tempo, que é o bem mais escasso em épocas de crise.

Voltemos, para já, ao problema da falta de uma visão adequada à transição de paradigma energético em curso, e à falta de um modelo de mobilidade adequado às energias do futuro.

Em Portugal, os transportes levam 36% de toda a energia consumida. Por sua vez, 90% desta energia vai direitinha para o transporte rodoviário. Ou seja, dependemos completamente da evolução dos preços do petróleo. Como o preço deste verdadeiro ouro negro deverá continuar a subir a uma média de 30% ao ano, adivinham-se consequências trágicas para o nosso país no decorrer dos próximos anos.

As tão badaladas barragens hidroeléctricas, decididas única e exclusivamente para transferir mais riqueza nacional para os bolsos de alguns conglomerados energéticos privados, ainda que sob pretextos cândidos (contribuir para a independência energética de Portugal!), acrescentarão apenas uns ridículos 3% à capacidade própria de produção de energia eléctrica, em nada contribuindo, por isso, para resolver os problemas energéticos existentes e que irão levar-nos ao colapso económico e social se não houver uma inversão de 180 graus na estratégia energética até agora promovida pelo bloco central do betão. O boicote dos camionistas foi apenas um pequeno e honesto aviso aos débeis timoneiros que afirmam governar o país.

As novas barragens hidroeléctricas ameaçam equilíbrios ecológicos, eventuais indústrias de turismo residencial de qualidade, e a paisagem, contribuindo marginalmente (3%) para o aumento da produção energética nacional. Por outro lado, além de não criarem nenhum emprego estável local, destroem as economias existentes e provocam assinaláveis perdas na biodiversidade regional. Espero sinceramente que as populações e os políticos das zonas abrangidas acordem a tempo de evitar mais este atentado histórico às suas cada vez mais preciosas autonomias económicas, sociais e culturais.

As energias eólica e solar voltaica são uma boa decisão, mas é preciso ver quem faz o quê, como, por que preço e a favor de que dono. A tão propalada maior central solar do mundo, a da Amareleja, além de não ser tal quando estiver concluída, começou por ser uma iniciativa do alcaide de Moura, mas hoje é um negócio 100% pertencente à empresa espanhola ACCIONA, que por sua vez, para conseguir fornecer os necessários painéis foto-voltaicos a tempo, teve que os importar da China! Que falhou neste negócio? A banca portuguesa? A célebre classe empresarial lusitana? Ou simplesmente a pressa de Manuel Pinho? Alguém falou com os alemães (maior produtor europeu de energia foto-voltaica) sobre o assunto? Gostaria de saber.

O programa de eficiência energética em curso é uma boa ferramenta para mitigar o sério problema energético que se avizinha. No entanto, peca por tardio e por andar embrulhado numa teia burocrática ao serviço de clientelas partidárias e empresariais indígenas, obscura, trapalhona, e cujo resultado palpável é a execução lenta do mesmo.

Os biocombustíveis roubam terra arável necessária à produção de alimentos e não resolvem o problema da extrema dependência petrolífera dos transportes rodoviários. Além do mais, andam de mão dada com o lóbi nefasto dos Organismos Geneticamente Modificados (OGM), imprescindíveis à rentabilidade das explorações agro-energéticas. Resumindo: os biocombustíveis não resolvem o problema energético de nenhum pequeno país e ameaçam a independência alimentar dos que os acolhem.

Mais auto-estradas, em vez das "autovías" que existem há muito em Espanha, apenas contribuirão para aumentar o insustentável fluxo de tráfego rodoviário existente, prejudicando decisivamente as possibilidades de o esforço orçamental do país ser reencaminhado para onde mais falta faz, menos nódoa ambiental causa, e é mais reprodutivo: o transporte ferroviário e o transporte marítimo-fluvial.

As cidades aeroportuárias e em geral a desmiolada política aeroportuária deste governo ficará bem patente quando José Sócrates inaugurar o novo aeroporto de Beja. A indústria aeronáutica está perante um verosímil cenário de colapso, do qual a TAP dificilmente se salvará. Ou seja, na dúvida, construir uma cidade aeroportuária e um novo aeroporto intercontinental em Lisboa para 2015 ou 2017, é daquelas decisões que qualquer político, mesmo idiota, adiaria para as calendas gregas. Vamos ver o que ocorre na aldeia lusitana.

Finalmente, em vez de TGVs (ou AVEs), do que precisamos é de um novo plano ferroviário urgente, pensado, desenhado e construído com pés e cabeça. O maior desafio de Portugal nos próximos 20 anos é este: FAZER A TRANSIÇÃO ENERGÉTICA DE UMA TARDIA ECONOMIA DE CONSUMO PARA UMA NOVA ECONOMIA DE PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL.


OAM 422 20-08-2008 01:40

sexta-feira, agosto 15, 2008

Eurasia adiada - 4

Guerra Fria?

15-08-2008. "Infelizmente, depois do que aconteceu, é improvável que os ossetianos e abecazes consigam viver dentro do mesmo Estado que os georgianos" -- Dmitry Medvedev (Estadao.com.br).

15-08-2008. "Esperamos que os responsáveis russos reconheçam que um futuro de cooperação e de paz será benéfico para todas as partes. A guerra fria terminou." -- George W. Bush (AFP).

15-08-2008. Poland has signed a preliminary deal with the US on plans to host part of its new missile defence shield. Under the agreement, the US will install 10 interceptor missiles at a base on the Baltic coast in return for help strengthening Polish air defences. -- BBC.
A probabilidade de um isolamento internacional da Rússia é quase nula (1) e tem uma explicação simples: o próximo maior mercado do mundo não se chamará Europa, nem Estados Unidos, mas Ásia -- e está a chegar!

O PIB da China, segundo Albert Keidel, ultrapassará o dos EUA em 2035 e duplicá-lo-á em 2050. Para atingir estas metas, Pequim conta naturalmente com o petróleo e o gás natural do Irão e do Mar Cáspio, para o que criou uma aliança alternativa à NATO, chamada The Shanghai Cooperation Organization (SCO), da qual fazem parte a China, a Rússia, o Cazaquistão, o Quirguistão, o Tajiquistão e o Uzbequistão. A Índia e o Irão são dois dos países observadores que em breve poderão juntar-se ao novo clube de milionários.

Entretanto, à hora que escrevo esta crónica, a orgulhosa China leva 12 medalhas de ouro olímpicas de vantagem sobre os Estados Unidos. Os símbolos contam!

Por sua vez, o preço do petróleo continuará a subir a uma média dificilmente inferior a 30% ao ano, apesar da queda pronunciada das últimas semanas (2). Isto significa que em Agosto de 2009 o barril de crude não deverá custar menos do que 144 USD, em Agosto de 2010, 187 USD, em Agosto de 2010, 243 USD, etc. Países como Portugal têm um futuro imediato bem difícil (3).

Até 2010, Estados Unidos e Europa andarão às voltas com as suas respectivas recessões, pouco dispostos a alimentar mais aventuras militares inconsequentes (4).

A probabilidade de uma paragem da globalização e subsequente divisão do mundo em dois hemisférios proteccionistas é pois mais alta do que estamos preparados para admitir neste momento. À medida que o casino dos chamados mercados de derivados começar a destruir a economia ocidental, a necessidade de um novo Tratado de Tordesilhas tornar-se-à evidente para todos.

Estados Unidos e Europa têm que mudar de vida quanto antes, tornando-se mais eficientes no uso da energia, menos consumistas e mais produtivos. Para aí chegar terão que abandonar alguns famosos instrumentos outrora cruciais ao seu exercício imperial, mas que já hoje são caros e irrelevantes, ou caminham para a falência: G8, FMI, Banco Mundial e Organização Mundial de Comércio. Para poder retomar a paridade estratégica que está a caminho de perder, Estados Unidos e Europa só dispõem de uma alternativa: voltar ao proteccionismo comercial, ainda que seguindo modelos selectivos, porventura originais.

A retórica americana e europeia sobre a Geórgia e a independência da Ossétia e da Abcácia não passa de uma terrível hipocrisia. Depois de tudo o que fizeram no Cosovo, no Afeganistão e no Iraque, e deixaram fazer na Palestina, depois do modo indecoroso como a União Europeia tolerou aos Estados Unidos toda a espécie de crimes (5), ou permitiu, sem um reparo, o acosso imperial permanente da Rússia pós-soviética, Washington e Bruxelas não têm qualquer autoridade para condenar a acção punitiva de Moscovo contra uma "democracia cor-de-rosa" que, na realidade, nada mais é do que um tentáculo dos Estados Unidos. Talvez por isto mesmo, Washington tenha tamanha dificuldade em engolir a ensaboadela que inesperadamente está a levar.

Tanto na Rússia, como na China, ou na Coreia, e não apenas, portanto, no vasto mundo muçulmano, cresce uma revolta surda contra os Estados Unidos. São sobretudo os mais jovens que protagonizam esta crescente hostilidade cultural. As suas acções de guerrilha electrónica revelam, aliás, o imenso potencial de crítica e agressividade em gestação.
Online grassroots communities have united and set up websites in Russian offering software available for download to initiate DDOS attacks. The Georgian government's website was hacked on Monday, with the front page replaced with images of Adolf Hitler. Georgian hackers have retaliated with their own cyber attacks on Russian websites, but as in the physical world they have been largely out-gunned and bloggers who have attempted to post photos of the advance of the Russian military machine have rapidly found their own websites under counter fire. -- Georgia under web fire. By Martin J Young, in Asia Times.
Numa palavra, a estratégia da supremacia imperial praticada pelos Estados Unidos faliu e só poderá dar desgostos a quem a seguir. A Europa de Leste foi entalada pela sua própria estupidez e pela falta de tino e capacidade de decisão da União Europeia. O cretinismo político dos polacos e dos checos conduziu ambos os países a um beco sem saída. Poderá Bruxelas fazer alguma coisa? Ou iremos, pelo contrário, assistir à implosão definitiva do Tratado de Lisboa? Durão Barroso, para já, está a banhos algures no Algarve. Eu também vou para lá, até ao fim do mês!

Deixo aos que me lêem, três leituras recomendáveis, a propósito da decadência irreversível dos paradigmas militares e diplomáticos da América.

Geopolitical Chess: Background to a Mini-war in the Caucasus. By Immanuel Wallerstein.

15-08-2008. It is perfectly true, as everyone observed at the time, that the Yalta rules were abrogated in 1989 and that the game between the United States and (as of 1991) Russia had changed radically. The major problem since then is that the United States misunderstood the new rules of the game. It proclaimed itself, and was proclaimed by many others, the lone superpower. In terms of chess rules, this was interpreted to mean that the United States was free to move about the chessboard as it saw fit, and in particular to transfer former Soviet pawns to its sphere of influence. Under Clinton, and even more spectacularly under George W. Bush, the United States proceeded to play the game this way.

There was only one problem with this: The United States was not the lone superpower; it was no longer even a superpower at all. The end of the Cold War meant that the United States had been demoted from being one of two superpowers to being one strong state in a truly multilateral distribution of real power in the interstate system. Many large countries were now able to play their own chess games without clearing their moves with one of the two erstwhile superpowers. And they began to do so. -- in Geopolitical Chess: Background to a Mini-war in the Caucasus, by Immanuel Wallerstein.

The Limits of Power: The End of American Exceptionalism. By Andrew Bacevich.

Iraq and Afghanistan remind us that war is not subject to reinvention, whatever Bush and Pentagon proponents of the so-called Revolution in Military Affairs may contend.

War's essential nature is fixed, permanent, intractable, and irrepressible. War's constant companions are uncertainty and risk. "War is the realm of chance," wrote the military theorist Carl von Clausewitz nearly two centuries ago. "No other human activity gives it greater scope: no other has such incessant and varied dealings with this intruder ... " - a judgment that the invention of the computer, the Internet, and precision-guided munitions has done nothing to overturn.

So the first lesson to be taken away from the Bush administration's two military adventures is simply this: War remains today what it has always been - elusive, untamed, costly, difficult to control, fraught with surprise, and sure to give rise to unexpected consequences. Only the truly demented will imagine otherwise.

The second lesson of Iraq and Afghanistan derives from the first. As has been the case throughout history, the utility of armed force remains finite. Even in the information age, to the extent that force "works", it does so with respect to a limited range of contingencies.

Although diehard supporters of the "war on terror" will insist otherwise, events in Iraq and Afghanistan have demonstrated definitively that further reliance on coercive methods will not enable the United States to achieve its objectives. Whether the actual aim is to democratize the Islamic world or subdue it, the military "option" is not the answer.

The Bush Doctrine itself provides the basis for a third lesson. For centuries, the Western moral tradition has categorically rejected the concept of preventive war. The events of 9/11 convinced some that this tradition no longer applied: old constraints had to give way. Yet our actual experience with preventive war suggests that, even setting moral considerations aside, to launch a war today to eliminate a danger that might pose a threat at some future date is just plain stupid. It doesn't work.

History has repeatedly demonstrated the irrationality of preventive war. If the world needed a further demonstration, Bush provided it. Iraq shows us why the Bush Doctrine was a bad idea in the first place and why its abrogation has become essential. For principled guidance in determining when the use of force is appropriate, the country should conform to the just war tradition - not only because that tradition is consistent with our professed moral values, but also because its provisions provide an eminently useful guide for sound statecraft.

Finally, there is a fourth lesson, relating to the formulation of strategy. The results of US policy in Iraq and Afghanistan suggest that in the upper echelons of the government and among the senior ranks of the officer corps, this has become a lost art.

Since the end of the Cold War, the tendency among civilians - with Bush a prime example - has been to confuse strategy with ideology. The president's freedom agenda, which supposedly provided a blueprint for how to prosecute the "war on terror", expressed grandiose aspirations without serious effort to assess the means required to achieve them. Meanwhile, ever since the Vietnam War ended, the tendency among military officers has been to confuse strategy with operations.

Here we come face-to-face with the essential dilemma with which the United States has unsuccessfully wrestled since the Soviets deprived us of a stabilizing adversary. The political elite that ought to bear the chief responsibility for crafting grand strategy instead nurses fantasies of either achieving permanent global hegemony or remaking the world in America's image. Meanwhile, the military elite that could puncture those fantasies and help restore a modicum of realism to US policy fixates on campaigns and battles, with generalship largely a business of organizing and coordinating materiel.

The four lessons of Iraq and Afghanistan boil down to this: Events have exposed as illusory American pretensions to having mastered war. Even today, war is hardly more subject to human control than the tides or the weather. Simply trying harder - investing ever larger sums in even more advanced technology, devising novel techniques, or even improving the quality of American generalship - will not enable the United States to evade that reality.

As measured by results achieved, the performance of the military since the end of the Cold War and especially since 9/11 has been unimpressive. This indifferent record of success leads some observers to argue that we need a bigger army or a different army.

But the problem lies less with the army that we have - a very fine one, which every citizen should wish to preserve - than with the requirements that we have imposed on our soldiers. Rather than expanding or reconfiguring that army, we need to treat it with the respect that it deserves. That means protecting it from further abuse of the sort that it has endured since 2001.

America doesn't need a bigger army. It needs a smaller - that is, more modest - foreign policy, one that assigns soldiers missions that are consistent with their capabilities. Modesty implies giving up on the illusions of grandeur to which the end of the Cold War and then 9/11 gave rise. It also means reining in the imperial presidents who expect the army to make good on those illusions. When it comes to supporting the troops, here lies the essence of a citizen's obligation.

-- Andrew Bacevich, professor of history and international relations at Boston University, retired from the US Army with the rank of colonel. This piece is adapted from his new book, The Limits of Power: The End of American Exceptionalism (Metropolitan Books, 2008). He is also the author of The New American Militarism, among other books. In Asia Times.


Second Chance
. By Zbigniew Brzezinski (actual conselheiro de Barak Obama...)

Given America's growing global indebtedness (it now borrows some 80 percent of the world's savings) and huge trade deficits, a major finantial crisis, especially in an atmosphere of emotionally charged and globally anti-American feeling, could have dire consequences for America's well-being and security. The euro is becoming a serious rival to the dollar and there is talk of an Asian counterpart to both (6). A hostile Asia and a self-absorbed Europe could at some point become less inclined to continue financing the U.S. debt.

(...)

At the onset of the global era, a dominant power has therefore no choice but to pursue a foreign policy that is truly globalist in spirit, content, and scope. Nothing could be worse for America, end eventually the world, than if American policy were universally viewed as arrogantly imperial in a postimperial age, mired in a colonial relapse in a postcolonial time, selfishly indifferent in the face of umprecendented global interdependence, and culturally self-righteous in a religiously diverse world. The crisis of American superpower would then become terminal.

-- in Second Chance: Three Presidents and the Crisis of American Superpower, 2007.



NOTAS
  1. Ou será que a China também poderá estar interessada numa nova "cortina de ferro" entre a Rússia e a Europa (Alemanha)? - Ler China seeks Caucasian crisis windfall.
  2. A subida repentina do preço do crude para níveis bem superiores às previsões mais pessimistas, ao longo da primeira metade de 2008, conduziu a uma espiral inflacionista, que apressou a esperada recessão americana e europeia e provocou depois uma inevitável, embora pontual, destruição da procura dos produtos petrolíferos. Sabendo-se o peso que a especulação tem tido nesta fuga precipitada do casino imobiliário para as matérias primas industriais e alimentares, percebe-se melhor o dramatismo das oscilações. O mundo, sobretudo a Europa e os Estados Unidos, estão metidos numa camisa de sete varas: a chegada, cada vez mais evidente, do pico petrolífero, empurra os preços da energia para cima; mas a espiral inflacionista das "commodities", por sua vez, arruína a economia, levando à quebra dezenas de bancos, milhares de empresas e milhões os orçamentos familiares. Ou seja, a primeira consequência previsível do pico petrolífero é o regresso, porventura em doses nunca sofridas, da estagflação.
    August 16 2008. "...our future affair with oil may be within an overall trend of declining supply and rising demand, with volatility of prices from the anxiety of the market in which demand surges higher over supply. But the prices will be intermittently buffeted up and down by the fluctuations of economic growth and its levels of fluctuating demand for oil. As investors vie for advantage, they too will aggravate the gyrating price trends." -- James Leigh, Rollercoaster of oil prices: between a rock and a hard place", Energy Bulletin.

  3. O bloco central do betão, protagonizado ao mais alto nível por António Vitorino ("socialista") e Ângelo Correia ("social-democrata"), está em guerra antecipada contra Manuela Ferreira Leite e Cavaco Silva. Mas são estes que vão ganhar a partida, sobretudo se tiverem, no momento certo, os generais com a inteligência táctica e a voz grossa necessárias para colocar nos eixos a clientela anafada que ao longo das últimas décadas se encarregou de colocar Portugal numa trajectória de falência potencial.
  4. Este meu optimismo deve ser moderado por outros pontos de vista, nomeadamente sobre a articulação entre o actual colapso da economia americana e a solução bélica proposta por alguns estrategas dos EUA (Republicanos e Democratas!) O bloqueio do Estreito de Ormuz será, segundo esta perspectiva, a fuga militar perfeita da aliança EUA-Reino Unido-França-Israel às presentes dificuldades económicas, e a resposta antecipada ao ascenso da China. Nesta perspectiva, a fabricada crise da Geórgia, serve apenas como manobra de diversão, para isolar a Rússia e preparar psicologicamente o Ocidente para o ataque em larga escala, em preparação, contra o Irão. Recomendo, a propósito, a leitura de dois artigos: Putin Walks into a Trap, de Mike Whitney, e Wag the Dog: How to Conceal Massive Economic Collapse, assinado por Ellen Brown.

    O de Mike Whitney começa assim:
    August 14, 2008. The American-armed and trained Georgian army swarmed into South Ossetia last Thursday, killing an estimated 2,000 civilians, sending 40,000 South Ossetians fleeing over the Russian border, and destroying much of the capital, Tskhinvali. The attack was unprovoked and took place a full 24 hours before even ONE Russian soldier set foot in South Ossetia. Nevertheless, the vast majority of Americans still believe that the Russian army invaded Georgian territory first. The BBC, AP, NPR, the New York Times and the rest of the establishment media has consistently and deliberately misled its readers into believing that the violence in South Ossetia was initiated by the Kremlin. Let's be clear, it wasn't. In truth, there is NO dispute about the facts except among the people who rely the western press for their information. Despite its steady loss of credibility, the corporate media continues to operate as the propaganda-arm of the Pentagon. -- in Global Research.

    Por sua vez, Ellen Brown escreve:
    The underlying problem is little discussed but impossible to repair – a one quadrillion dollar derivatives scheme that is now imploding. Banks everywhere are facing massive writeoffs, putting the whole banking system on the brink of collapse. Only public bailouts will save it, but they could bankrupt the nation. -- in Global Research.

  5. O Tribunal Penal Internacional (que os EUA não reconhecem, obviamente!) deveria ter colocado os Estados Unidos e meia Europa no banco dos réus a partir do momento em que o Iraque foi militarmente atacado, invadido e ocupado sem nenhum pretexto válido. Deveria ter emitido mandatos de captura contra o senhores Bush, Cheney e Rumsfeld, no momento em que o mundo teve conhecimento das torturas e humilhações infligidas na prisão militar americana de Abu Ghraib, no campo de concentração de Guantanamo (Cuba) ou nos recentemente divulgados campos de concentração americanos para jovens e crianças, em pleno Iraque (vídeo). No entanto, parece que o TPI não passa de mais uma instância impotente da justiça internacional, forte com os fracos, e fraca com os fortes.
  6. 17-08-2008. Mais cedo do que se esperava, aí está a internacionalização do Yuan. É a consequência directa da falência dos dois gigantes semi-estatais que seguravam os riscos bancários no casino imobiliário americano: Fannie Mae e Freddie Mac. Estes mamutes financeiros colapsaram (enquanto outros --Lehman Brothers, etc.-- vão na mesma direcção) e estão agora na unidade de cuidados intensivos da Casa Branca. Uma das maneiras de impedir a falência declarada é passar a factura aos consumidores americanos sob a forma de inflação, outra, é imprimir mais umas toneladas de dólares sem valor. Mas a que terá alguma credibilidade junto dos países ricos (China, Singapura, Rússia ou Emiratos Árabes Unidos) é a troca de uma parte da imensa dívida americana por pedaços de terra que se vejam: a Formosa, o Irão, ou o Tibete, por exemplo! Apesar do latir de Sarkozy, os europeus terão que abandonar de vez as suas revoluções cor-de-rosa falidas na antiga Europa de Leste, sob pena de mergulharem numa depressão sem fim. Ler estes 3 artigos: U.S. likely to recapitalize Fannie, Freddie (Reuters); Analysts expecting large loss from Lehman (Herald Tribune), e China mulls first offshore currency market The Finantial Express).

OAM 421 15-08-2008 19:02 (última actualização: 18-08-2008 13:40)

Portugal 43

Linha do Norte pode acelerar

"Green Train", da Bombardier, corre a 295 Km/h sobre carris convencionais e consome menos 20-30% de energia

August 7, 2008 — Berlin.Banverket, the Swedish Railway Administration and Bombardier Transportation, together with other partners today presented the results of their Gröna Tåget (“Green Train”) project at a test ride between Västerås and Stockholm.

... Using a BOMBARDIER REGINA train, the rail vehicle research program is aimed at developing a new generation of high speed trains that meet the special technical and traffic requirements in the Nordic Countries. The Gröna Tåget is also unique in that it is equipped with components of the new BOMBARDIER ECO4 technologies that maximise total train performance and energy efficient operation.

Per Kyhle, Senior Technical Strategist Banverket, commented: “The main aims of the project are to achieve 20 to 30 per cent less energy consumption, reduce travel times and achieve fewer operational costs. We also want to operate as fast and efficiently as possible using the present infrastructure, which often means sharing single tracks with cargo and regional trains. The tests have proven that these aims are realistic. We have made significant progress in enhancing the competitiveness of rail compared to other modes of transportation.” -- in Bombardier website.

Num país pobre, antes de nos pormos a deitar dinheiro que não é nosso à rua, devemos tirar o maior partido do que há. No caso da ligação ferroviária rápida entre Lisboa e Porto, seguramente a mais movimentada do país, e que assim continuará a ser por muitos e bons anos, o que há a fazer imediatamente é terminar as obras de melhoria da linha, há mais de uma década em curso, possibilitando ao actual Alfa percorrer a distância entre as duas maiores cidades do país em menos de 2 horas. Por outro lado, como faltam comboios para dar resposta a uma demanda que não pára de crescer, por efeito do pico petrolífero, mas também das consciências que começaram a mudar, talvez fosse bom estudar a nova solução da Bombardier. Parece mais barata, muito mais barata, do que o Power Point da nova linha de Alta Velocidade entre Lisboa e o Porto, além de poder responder em tempo à pressão da procura.

Só de pensar que os nossos inteligentes governantes correram com esta empresa canadiana de ponta do nosso país, fico furioso!

OAM 420 15-08-2008 02:57

quinta-feira, agosto 14, 2008

Eurasia adiada - 3

Afinal, um Irão nuclear até dava jeito!
Jul 30, 2008
Russia takes control of Turkmen (world?) gas
By M K Bhadrakumar

From the details coming out of Ashgabat in Turkmenistan and Moscow over the weekend, it is apparent that the great game over Caspian energy has taken a dramatic turn. In the geopolitics of energy security, nothing like this has happened before. The United States has suffered a huge defeat in the race for Caspian gas. The question now is how much longer Washington could afford to keep Iran out of the energy market.

Gazprom, Russia's energy leviathan, signed two major agreements in Ashgabat on Friday outlining a new scheme for purchase of Turkmen gas. The first one elaborates the price formation principles that will be guiding the Russian gas purchase from Turkmenistan during the next 20-year period. -- in Asia Times.

Este artigo é particularmente oportuno para entender a crise militar, ou melhor, a guerra em curso na Geórgia e na Ossétia do Sul. Eu escrevera já que o braço de ferro no Médio Oriente e no Mar Cáspio, tal como as guerras no Afeganistão e no Iraque, ou a ameaça ao Irão, têm única e exclusivamente que ver com as reservas estratégicas de petróleo e gás natural existentes naquela vasta região.

Ao contrário do que pensam Nuno Rogeiro e muitos outros comentadores de televisão mal preparados, os jogos de estratégia não são passatempos para jornalistas e jogadores de Playstation, mas instrumentos complexos destinados a obter resultados práticos de política nacional. No caso, e pelo menos desde o princípio do século 20, a definição dos poderes dominantes mundiais fez-se essencialmente à custa do domínio militar das principais zonas petrolíferas do planeta e respectivas rotas de acesso. O Grande Jogo, há muito proposto por Brzezinski, não fala de outra coisa, ainda que sob a capa da integração pacífica da Rússia numa Eurásia pró-atlântica e pró-americana com o seu centro de gravidade na Europa Ocidental.

Perante o ascenso da China e da Ásia em geral, a visão do polaco-americano faz sentido.

Só que a realização efectiva de um tal desiderato pressupõe a existência de uma verdadeira Europa, cujo vórtice não poderá deixar de estar no eixo Paris-Berlim, ainda que secundado por um reforçada aliança atlântica, protagonizada, do lado europeu, por países como o Reino Unido, Espanha e Portugal. Os neo-cons, por julgarem poder operar toda a estratégia a partir e no interesse exclusivo de Washington, dispensaram e sabotaram mesmo a União Europeia, usando o Reino Unido como seu cão de fila, e Javier Solana, espécie de cadáver adiado do Tratado de Lisboa, como proxy dissimulado das suas intenções.

Há quem lute ainda pela Agenda de Lisboa. Mas a lentidão do processo é tal, que corre o risco de implodir perante o relógio da História. Paradoxalmente, o artigo de Bhadrakumar permite extrair uma ilação imprevista: seria agora do interesse da Europa Ocidental e dos próprios Estados Unidos recuperar o Irão para sua órbita de simpatia. Aliás, é do interesse europeu e americano, não apenas permitir, como mesmo estimular a rápida transformação do Irão numa potência nuclear, desde que, ao mesmo tempo, claro, a Europa se decida de uma vez por todas a desenvolver um sistema de forças adequado ao século 21!

Este debate foi aberto no grupo Democracia Virtual por JMS. Se estiver interessado em aprofundar a discussão, bata à porta do grupo de discussão. Se vem por bem, será bem-vindo ;-)


OAM 419 14-08-2008 12:55

Portugal 42

Factos consumados de uma visão corrupta da política
Metro: prolongamento da Amadora-Este à Reboleira
O novo troço da Linha Azul do metro de Lisboa irá servir cerca de quatro milhões de passageiros, num investimento de 58 milhões de euros para a construção de 595 metros de linha e que hoje foi assinado com o consórcio da Zagope, Soares da Costa, Teixeira Duarte e Tâmega. -- in Jornal de Negócios.
A Linha de Metro anunciada vai custar em média 100 milhões de euros (20 milhões de contos) por Km! Na vizinha Espanha, em Madrid, o preço médio de construção de uma linha de metropolitano é de 30 milhões de euros (6 milhões de contos antigos) por Km, ou seja, 3 vezes mais barato!

As empresas espanholas constroem pois 3 vezes mais barato, apesar de os salários mínimo e médio espanhóis estarem 40 e 38% acima dos vencimentos portugueses. É por estas e por outras que há dezenas de milhar de portugueses a fugir para Espanha, enquanto os anémicos empresários portugueses e a corrupta clientela partidária que temos se queixam de não ganhar nenhum concurso nas terras de Cervantes.

Todos se devem ainda lembrar da figura triste que o antigo presidente Jorge Sampaio fez em Madrid, chorando pela abertura do mercado espanhol aos portugueses. Está aberto! Quem quiser trabalhar e investir, não terá problemas. Quem quiser apenas reproduzir esquemas grosseiros de delapidação dos impostos pagos em democracia, terá que fazer um upgrade sobre tráfico de influências! Onde há transparência administrativa e tribunais a funcionar, esquemas como o agora apresentado pela senhora Ana Paula Vitorino seriam imediatamente escrutinados até à exaustão.

OAM 418 14-08-2008 12:12

quarta-feira, agosto 13, 2008

Portugal 41

Efeitos do pico petrolífero

CP não tem comboios para responder à procura
13.08.2008 - 09h11 Carlos Cipriano

A CP Longo Curso, responsável pelos comboios Alfa Pendular e Intercidades, bateu um recorde de passageiros no mês de Julho, ao transportar 497 mil clientes (mais 11,1 por cento do que no período homólogo de 2007) e tem tido desde Maio um aumento continuado da procura no serviço de longa distância. Mas a empresa está nos seus limites em termos de oferta e precisa urgentemente de novos comboios, o que já está previsto há um ano, mas para o que ainda não obteve a imprescindível autorização conjunta dos ministérios das Finanças e dos Transportes e Comunicações. -- Público.

COMENTÁRIO: antes de mais, este mesmo problema afecta neste preciso momento o transporte ferroviário entre Setúbal e Lisboa, a cargo da Fertagus. Faltam comboios e horários mais amplos e com mais frequências para responder à procura crescente do transporte colectivo. Todos os suburbanos deveriam passar a circular entre as 5:00 e as 2:00 da manhã, com intervalos nunca superiores a 30mn.

Como bem escreveu quem me chamou a atenção para esta notícia do Público, isto é uma demonstração concludente do Pico Petrolífero a funcionar. O petróleo barato acabou, e como se isto não fosse suficiente para mudar de vida, temos uma recessão que veio para durar! É tempo de as araras parlamentares, do governo e da presidência da república acordarem e remarem para o mesmo lado, pelo menos nesta crucial questão. Estou farto de escrever que é preciso declarar o Estado de Emergência Energética, e com base numa tal disposição (que falta conceber e desenhar) lançar um conjunto de medidas inteligentes e draconianas para mitigar os impactos desastrosos que o fim do paradigma carbónico (e consumista) terá em toda a economia, na sobrevivência das cidades e na paz social.

A primeira coisa que é preciso fazer é travar imediatamente a pressão escandalosa do Bloco Central do Betão e reavaliar meticulosamente TODOS os grandes investimentos mendigados insistentemente pelas burguesias e burocracias clientelares deste país. A acção desta gentinha preguiçosa e egoísta ameaça, se não for travada, lançar Portugal numa fatal espiral de dívidas que deitará a perder a nossa própria independência política. Já não estamos a falar de opiniões técnicas, mas de conspiração e traição!

Barragens inúteis e contraproducentes (sobretudo as anunciadas para os rios Tua e Sabor), auto-estradas a pagar em 75 anos (!), uma nova travessia do Tejo que ameaça destruir um potencial portuário único na Europa, uma cidade aeroportuária idealizada pelo incompetente boy do PS que inventou o aeromoscas de Beja, ou um TGV a ligar a Gare do Oriente a Campanhã, são enormidades a suspender sem mais discussão. São demasiado desmioladas para que lhe dediquemos mais atenção e recursos (a malta dos estudos adora polémicas!)

Não apenas a corrupção, mas também a estupidez e a irresponsabilidade políticas devem estar sujeitas a tribunal. Não devemos focar a nossa atenção apenas no senhor Vale e Azevedo. Os governantes responsáveis por actos de destruição da riqueza pública também devem ser chamados a prestar contas e pagar pelas leviandades praticadas.

OAM 417 13-08-2008 12:30

Crise Global 18

Recessão mundial já começou

Ou seja, os governos de quase todo o mundo vão ter que rever os seus planos de investimento e obras públicas, muito para além do que temiam.

Se descontarmos a contabilidade criativa que abunda nas estatísticas políticas oficiais de boa parte dos países, nomeadamente Portugal, a recente revisão em baixa do nosso crescimento para 0,5% é uma anedota típica de Verão. Estamos em recessão, ponto final!

Leia-se o que Nouriel Roubini acaba de escrever sobre o assunto:

The Perfect Storm of a Global Recession

There is now an increasing probability that the global economy - not just the US - will experience a serious and protracted recession. Macro developments in the last few weeks suggest that now all of the G7 economies (the group of the major advanced economies including US, UK, Japan, Germany, France, Italy and Canada) are already in a recession or close to tipping into one. Other advanced economies or emerging markets (the rest of the Eurozone including Spain. Ireland and the other Euro members; New Zealand, Iceland, Estonia, Latvia and some other South-East Europe economies) are also on the tip of a recessionary hard landing.

And once this group of twenty plus economies enters into a recession there will be a sharp growth slowdown in the BRICs (Brazil, Russia, India and China) and other emerging market economies. The IMF defines a global recession as a global growth rate below 2.5% as emerging market economies usually grow much faster (6%) than advanced economies where growth averages about 2%. For example, a country like China - that even with a growth rate of 10% plus has officially thousands of riots and protests a year - needs to move 15 million poor rural farmers to the modern urban industrial sector with higher wages every year just to maintain the legitimacy of its regime; so for China a growth rate of 6% would be equivalent to a recessionary hard landing. It now looks like that, by the end of this year or early 2009, the global economy will enter a recession. -- in Nouriel Roubini's Global EconoMonitor.

As fabulações de José Sócrates e do dromedário das obras públicas sobre novas auto-estradas que já custam 40% mais do que o governo estimou (antes de haver um único risco, uma única conta de merceeiro e qualquer candidato), aeroportos intercontinentais rodeados de cidades aeroportuárias (capitaneados pelo grande vice-Rei do aeromoscas de Beja), pontes lunáticas entre o Barreiro e Chelas, e TGVs a desembarcar na Gare do Oriente depois de arrasar meia zona oriental da capital, bem terão que esperar por melhores dias, como creio que tive a oportunidade de avisar há três anos atrás!

OAM 416 13-08-2008 02:53

Crise Global 17

Banqueiro arrependido

London Banker é o heterónimo de um ex-banqueiro com responsabilidades passadas em mais de uma instituição financeira. O seu blogue, recente, é particularmente oportuno para a compreensão da presente crise financeira mundial. Além do mais, escreve num inglês admirável.

Recomendo-o vivamente ao nosso presidente da república, pois sei que gosta e entende as subtilezas da economia, e por isso mesmo está naturalmente muito preocupado com a situação portuguesa, a pressão cega e estúpida do Bloco Central do Betão, e a leviandade pseudo-keynesiana incorrigível do actual governo "socialista".

Deixo-vos, por ora, mais uma leitura de férias na forma de duas citações deste surpreendente escritor.

Thursday, 31 July 2008
Fisher's Debt-Deflation Theory of Great Depressions and a possible revision

I have been both a central banker and a market regulator. I now find myself questioning whether my early career, largely devoted to liberalising and deregulating banking and financial markets, was misguided. In short, I wonder whether I contributed - along with a countless others in regulation, banking, academia and politics - to a great misallocation of capital, distortion of markets and the impairment of the real economy. We permitted the banks to betray capital into “hopelessly unproductive works”, promoting their efforts with monetary laxity, regulatory forbearance and government tax incentives that marginalised investment in “productive works”. We permitted markets to become so fragmented by off-exchange trading and derivatives that they no longer perform the economically critical functions of capital/resource allocation and price discovery efficiently or transparently. The results have been serial bubbles - debt-financed speculative frenzy in real estate, investments and commodities.

Since August of 2007 we have been seeing a steady constriction of credit markets, starting with subprime mortgage back securities, spreading to commercial paper and then to interbank credit and then to bond markets and then to securities generally. While the problem is usually expressed as one of confidence, a more honest conclusion is that credit extended in the past has been employed unproductively and so will not be repaid according to the original terms. In other words, capital has been betrayed into unproductive works.

The credit crunch today is not destroying capital but recognising that capital was destroyed by misallocation in the years of irrational exuberance. If that is so, then we are entering a spiral of debt deflation that will play out slowly for years to come.


Friday, 8 August 2008
Snake Oil and Deflation

If the core problem leading to the current seizure of the credit markets is the misallocation of credit into unproductive works during the boom years, then no amount of new credit will solve the problem unless the distortions promoting misallocation are redressed through fiscal and regulatory policy changes. Bailouts and recapitalisation of failed policies of the past are only digging a deeper hole, betraying more capital of younger generations into the unproductive works financed by the current generation.

Correcting the bias toward betrayal of capital will not be popular or easy. Correcting the bias toward unproductive investments will require a massive change of political structures, financial intermediation channels, savings and consumption habits, and economic incentives which challenge virtually every assumption made by at least two generations of American businessmen and consumers and exported globally.

... Consumer credit is viewed as a fundamental necessity by virtually all classes of the workforce. Weaning the populace from borrowing to saving would require a huge shift of policy and popular culture. Few of the generations raised on instant gratification of desire will gracefully or voluntarily shift to living within their means and saving for their future requirements.

In short, there are no easy answers. We have hypothecated our future prosperity to repayment of our current debts. We will live less well in future, as will our children for a time. Whether by inflation or deflation our debts must be extinguished. Savings must be encouraged and must be allocated to productive investments that will yield not just future prosperity but social equity to minimise political conflicts. -- in London Banker.

OAM 415 13-08-2008 02:21

terça-feira, agosto 12, 2008

Eurasia adiada - 2

O regresso da Rússia

12-08-2008 10:15. O Presidente russo Dmitri Medvedev anunciou hoje a decisão de pôr fim à operação russa na Geórgia, segundo as agências de notícias russas.

"O objectivo da operação, de impor a paz, foi cumprido. A segurança das tropas de paz e de cidadãos russos está garantida", adiantou Medvedev, segundo a agência russa Interfax.

Medvedev fez o anúncio durante uma reunião com o ministro da Defesa, Anatoli Serdiukov, e o Chefe do Estado-Maior do exército russo, Nikolai Makarov. "O agressor sofreu baixas significativas. As suas forças armadas estão desorganizadas", explicou. -- Expresso.

A Rússia deu por terminada a sua acção de defesa da independência, mais do que histórica e justificada, da Ossétia do Sul. Após a saída airosa dos americanos de um teatro por eles desenhado e de uma guerra suja por eles provocada, e depois dos protestos hipócritas da NATO e do gatinhar ridículo da União Europeia, o garnisé de Paris teve oportunidade de exibir uma vez mais a sua inócua pequenez.

Os Estados Unidos, Israel e a NATO instigaram os idiotas que dirigem os destinos da Geórgia a desencadearem um genocídio na Ossétia do Sul (e Abcácia, caso a primeira ofensiva passasse impune), em nome dos interesses petrolíferos do Reino Unido, dos Estados Unidos, de Israel, do Japão, da Turquia, da França e da Itália. Ou seja, em nome dos accionistas do pipeline conhecido por BTC, que liga Baku (capital e maior porto do Azerbeijão, no Mar Cáspio) ao porto turco de Ceyhan, passando pela capital georgiana Tbilisi (Tíflis, em russo). O tiro saiu-lhes inesperadamente pela culatra. Pior do que isso: a União Europeia fica, a partir desta exposição ao ridículo, numa posição extremamente frágil perante, não apenas a Rússia, mas sobretudo face à generalidade dos países que há exactamente 17 anos, perante a implosão da União Soviética, acreditaram que a Europa e o "mundo livre" lhe trariam mais pão, saúde, felicidade e paz. O que estes povos hoje sabem é que perderam tudo o que de bom a União Soviética lhes dera (emprego, educação, saúde e paz), e do Ocidente livre e democrático apenas receberam a destruição das suas economias, emigrações em massa, estados e governos inteiramente corruptos e agora, à medida que a União Europeia definha e entra num longo período de recessão, leis punitivas contra os imigrantes, xenofobia, desemprego estrutural, inflação, desmantelamento das leis sociais e super-exploração. Saudades do império soviético? Não diria tanto. Mas a saudade de uma grande Rússia, politicamente moderna, próspera, militarmente renovada, ávida de gente nova que reponha os seus depauperados níveis demográficos, certamente! Ora essa grande Rússia sabe que tem pouco mais de uma década para se realizar. O sinal da Ossétia pode muito bem ser o início de uma viragem decisiva nas relações entre a Rússia e os países vizinhos, que da União Europeia só podem esperar más notícias, enquanto da Rússia podem ambicionar quase tudo, a começar por uma nova cultura de liberdade. Se Berlim e Paris desperdiçaram uma vez mais a possibilidade de liderar a Eurásia, pois que sejam os Russos a fazê-lo. Para nós, portugueses, é uma excelente oportunidade para nos virarmos de novo para o mar!

A disputa em torno dos preciosos recursos petrolíferos do Médio Oriente, com particular destaque para o Iraque, o Curdistão, o Irão e a vasta região do Mar Cáspio tem-se vindo a agravar desde a primeira invasão do Iraque pelo pai do actual presidente dos Estados Unidos.

Vistos à distância, todos os conflitos que se lhe seguiram, nomeadamente na Palestina (onde Israel tem procurado reduzir a pó, de forma criminosa, qualquer possibilidade de criação e reconhecimento internacional de um estado Palestiniano), formam o padrão cada vez mais claro de uma guerra global que, a qualquer momento, poderá derivar para uma III Guerra Mundial. A diferença entre guerra global e guerra mundial é, na minha perspectiva, a seguinte: enquanto uma guerra global é, no essencial, uma guerra de proxis, feita de episódios sucessivos e/ou simultâneos de guerra convencional, e assimétrica, onde os principais protagonistas utilizam exércitos, forças irregulares e países terceiros para prosseguirem um grande jogo estratégico, a guerra mundial envolve directamente os protagonistas numa confrontação maciça dos respectivos povos, economias e arsenais bélicos.

A tentação americana, inglesa e israelita é seguramente a de precipitar a passagem da guerra global em curso para uma guerra mundial. O problema é que uma tal decisão implicará necessariamente o uso de armas nucleares. As guerras não se ganham no ar, a menos que o terror nuclear entre em acção. É por isso que os americanos não ganharam o Vietnam, não ganharam o Iraque e não irão ganhar o Afeganistão. O mesmo é verdade para a tentativa sionista de erradicar os povos da Palestina. Para ganhar uma guerra convencional são necessárias forças terrestres de combate e de ocupação prolongada. Se os países definidos como inimigos forem países populosos, como a Rússia, ou a China, então o problema torna-se praticamente insolúvel, salvo se for aplicada uma qualquer "solução final"! Ora, também por questões de ordem demográfica, já para não falar das motivações morais, o Ocidente perderia qualquer guerra mundial por si desencadeada. Isto é verdade hoje, e será uma evidência esmagadora daqui a dez ou quinze anos. Assim sendo, se existe empate técnico no grande jogo de estratégia em curso, a única alternativa decente é começarmos a pensar no mundo como uma entidade única, cujos desafios a todos dizem respeito e só poderão ser resolvidos na base de princípios inovadores e activos de harmonia e cooperação. Talvez seja a hora de trocar Carl von Clausewitz por Confúcio.




REFERÊNCIAS

Reportagens televisivas que não verá na subserviente televisão portuguesa (pelo menos enquanto durar a crise)

Embaixador russo denuncia apoio americano à aventura militar da Geórgia
Os Estados Unidos terão apoiado a operação militar da Geórgia contra a auto-proclamada república separatista da Ossétia do Sul que provocou a intervenção do exército russo. A informação é avançada pelo embaixador russo junto da ONU, Vitaly Tchurkine. -- RTP.

Rússia rejeita as criticas por parte da OTAN em relação à operação militar
11-08-2008. A Rússia considera que a OTAN , com sua experiência de bombardeiros na ex-Jugoslávia, é o organismo menos adequado para criticar a operação russa de imposição da paz na Ossétia do Sul. O secretário geral da Aliança Jaap de Hoop Scheffer, destacou ontem que a Rússia “violou a integridade territorial da Geórgia e usou Força militar enorme” no território da Ossétia do Sul.

“Estamos dispostos a escutar a opinião das entidades defensora dos direitos humanos mas não a de um bloque militar”, diz uma nota emitida por representação permanente perante a Aliança. Se a OTAN se empenha em ensinar a Rússia, ela “irá obrigada a recordar-lhe o suposto sentido da medida à hora de usar a força contra o povo e Exército da Sérvia , quando os benefícios democráticos se levavam mediante a destruição dos cidades sérvios , bombardeiros de Belgrado, liquidação de pontos e outras infra-estruturas do país”.

Na noite entre 7 e 8 agosto as tropas georgianas invadiram a autoproclamada república da Ossétia do Sul e bombardearam com artilharia a capital, Tsikhinvali, quase destruindo totalmente a cidade, causando mais de 2 mil vítimas mortais e mais de 30 mil refugiados. Para defender a população , a maioria da qual é da cidadania russa , o contingente russo de paz , com ajuda do 58 Exército e outras tropas efetuou as ações militares adequadas. -- Pravda.

Putin: Promotor deve investigar crimes de guerra
08/11/2008. Na sua reunião com Presidente Dmitry Medvedev no Domingo, o Primeiro-ministro da Federação Russa, Vladimir Putin, disse que o Promotor da Justiça deve investigar os crimes de guerra perpetrados pelo lado georgiano em Ossétia Sul, onde 40.000 civis foram forçados a fugir das suas casas e onde cerca de 2.000 foram chacinados pelo bombardeamento georgiano e acções de limpeza étnica. -- Pravda.

Contextualizando o conflito Rússia-Geórgia
O governo mafioso da Geórgia, apoiado e armado pelo imperialismo estado-unidense, agrediu dia 8 de Agosto a República da Ossétia do Sul. Este conflito tem implicações sérias para o oleoduto Baku-Tíflis-Ceyhan (BTC), que transporta petróleo do Cáspio para mercados ocidentais. O BTC custou US$3 mil milhões e é possuído em 30% pela British Petroleum (1).

A Geórgia tem um papel importante na geopolítica dos pipelines. O país, em si próprio não tem reservas significativas de petróleo ou de gás natural. No entanto, o seu território é uma peça chave para o escoamento da produção da Bacia do Cáspio. Na verdade, é o único caminho prático que evita tanto a Rússia como o Irão.

Os 1770 km do oleoduto BTC entraram em serviço há apenas um ano. Através dele são bombeados diariamente mais de 1 milhão de barris, desde Baku (no Azerbaijão) até Yumurtalik (na Turquia). Ali é carregado em super-petroleiros a fim de ser transportado para os EUA e a Europa. Cerca de 249 km da rota do BTC passa através da Geórgia e parte dele, apenas 55 km, na Ossétia do Sul.

O Ocidente, os EUA em particular, atiçaram a guerra regional. A cimeira da NATO em Bucareste, este ano, pressionou a Geórgia e a Ucrânia a aderirem à Aliança. A medida foi bloqueada por países europeus mas a NATO comprometeu-se a oferecer aos dois países a condição de membro da Aliança numa fase posterior. Esta oferta foi encarada por Moscovo como um desafio. Desde então a Rússia tornou claro, por atitudes e acções, que fará tudo o que estiver ao seu alcance para impedir a expansão da NATO nos seu flanco Sul.

O conflito tem implicações sérias para o relacionamento da Rússia com os EUA e o Ocidente em geral. O conflito pode propagar-se à Abkhazia, que pretende separar-se da Geórgia. Tanto a Ossétia do Sul como a Abkhazia têm mais razões para se tornarem repúblicas independentes do que o "país" que a NATO criou artificialmente no Kosovo.

Após a intervenção da Força Aérea russa e do bloqueio naval à Geórgia, iniciado a 10 de Agosto pela frota russa do Mar Negro, o agressor georgiano apressou-se a pedir um cessar fogo. O bloqueio naval destina-se a impedir a Geórgia de receber mais armamento dos países da NATO. Por outro lado, aviões russos bombardearam a base militar de Vazania, no arredores da capital georgiana e próxima do oleoduto BTC e a frota russa do Mar Negro bombardeou o terminal petrolífero do porto de Poti.

[1] Os accionistas do BTC Co. são: BP (30.1%); AzBTC (25.00%); Chevron (8.90%); Statoil (8.71%); TPAO (6.53%); Eni (5.00%); Total (5.00%), Itochu (3.40%); INPEX (2.50%), ConocoPhillips (2.50%) e Amerada Hess (2.36%). (fonte: BP) -- Pravda.

War in the Caucasus: Towards a Broader Russia-US Military Confrontation? By Michel Chossudovsky
During the night of August 7, coinciding with the opening ceremony of the Beijing Olympics, Georgia's president Saakashvili ordered an all-out military attack on Tskhinvali, the capital of South Ossetia.

The aerial bombardments and ground attacks were largely directed against civilian targets including residential areas, hospitals and the university. The provincial capital Tskhinvali was destroyed. The attacks resulted in some 1500 civilian deaths, according to both Russian and Western sources. "The air and artillery bombardment left the provincial capital without water, food, electricity and gas. Horrified civilians crawled out of the basements into the streets as fighting eased, looking for supplies." (AP, August 9, 2008). According to reports, some 34,000 people from South Ossetia have fled to Russia. (Deseret Morning News, Salt Lake City, August 10, 2008)

... Let us be under no illusions. This is not a civil war. The attacks are an integral part of the broader Middle East Central Asian war, including US-NATO-Israeli war preparations in relation to Iran.

... Russian forces are now directly fighting a NATO-US trained Georgian army integrated by US and Israeli advisers. And Russian warplanes have attacked the military jet factory on the outskirts of Tbilisi, which produces the upgraded Su-25 fighter jet, with technical support from Israel. (CTV.ca, August 10, 2008)

When viewed in the broader context of the Middle East war, the crisis in Southern Ossetia could lead to escalation, including a direct confrontation between Russian and NATO forces. If this were to occur, we would be facing the most serious crisis in US-Russian relations since the Cuban Missile crisis in October 1962. -- in Global Research.

In Russia-Georgia Conflict, Balkan Shadows, By Robert McMahon
August 11, 2008. Circumstances in two separatist Georgian border regions—South Ossetia in the north and Abkhazia in the northwest—brought Russia and Georgia into open conflict (RFE/RL) this month. Yet beyond the immediate triggers, some analysts see two international developments in the past six months as major catalysts for Russia's biggest military campaign outside its borders since the fall of the Soviet Union. And the fighting could have consequences far beyond Georgia's borders for the West and Russia.

The first catalyst was recognition of Kosovo's February declaration of independence (NYT) by the United States and European powers. Vladimir Putin, then Russia's president and now its powerful prime minister, had warned for years of the danger of recognizing Kosovo without Serbia's agreement. After it occurred, James Traub writes in the New York Times, "Mr. Putin responded by leveling a blow at America's Caucasus darling." Putin set in motion moves to recognize South Ossetia and Abkhazia, and stepped up patrols of Russian forces—ostensibly peacekeepers—in those regions. Russia expert Dmitri Simes of the Nixon Center told a CFR meeting late last year that Western recognition of Kosovo would have to be followed by a "quid pro quo in the Caucasus or where we are [is] a new era in international relations" between Russia and the West.

Now, just days into Russia's offensive, writes the Financial Times' Quentin Peel, the events in Georgia have become "Russia's Kosovo," including Russian portrayals of President Mikheil Saakashvili as a dangerous rogue in the mold of Serb leader Slobodan Milosevic. An analysis from the Russian news agency RIA Novosti described Saakashvili as unstable but a master propagandist. Soon after fighting broke out in South Ossetia, Russian Foreign Minister Sergei Lavrov was voicing concern over Georgian "ethnic cleansing (Reuters)" of the region, conjuring a term from 1990s Bosnia and Kosovo.

A second international catalyst for Russia's offensive in Georgia was a decision at NATO's Bucharest summit in April. The alliance, in a bow to Russia, declined to consider Georgia and Ukraine right away for a Membership Action Plan, or MAP. But a NATO statement pledging to reconsider the two countries' bids in December infuriated the Kremlin (FT). Russia followed that decision by stepping up moves to upgrade its relations with the two breakaway Georgian regions, which it already provided with crucial economic support. Analysts have linked the strong Russian reaction with a growing feeling of isolation as countries on its periphery join Western institutions. That is now coupled with newfound Russian "prosperity and self-confidence and geopolitical entitlement" that give it an opportunity to reverse this trend, says CFR Senior Fellow Stephen Sestanovich in a new interview.

... Much depends on whether the August military campaign represents a turning point for Russian foreign policy. Former top Clinton administration officials Ronald D. Asmus and Richard Holbrooke write that this moment could be the end of an era (WashPost) in Europe when "spheres of influence were supposed to be replaced by new cooperative norms." CFR Adjunct Fellow Jeffrey Mankoff's recent profile of Russia's foreign policy elite notes that the "neo-imperialist" camp, keen for Russia to challenge the West for leadership, appears well positioned to grow in influence. -- in Council on Foreign Relations.

Russia marks its red lines, By F William Engdahl
August 13, 2008. What is playing out in the Caucasus is being reported in the United States media in an alarmingly misleading light, making Moscow appear the lone aggressor after it sent troops into the breakaway Georgian region of South Ossetia following a Georgian offensive on that territory.

The question is whether President George W Bush and Vice President Dick Cheney are encouraging Georgian President Mikheil Saakashvili to force the next US president to back the North Atlantic Treaty Organization (NATO) military agenda of the current Bush administration. Washington may have badly misjudged the possibilities, as it did in Iraq, and there are even possible nuclear consequences.

The underlying issue is the fact that since the dissolution of the Warsaw Pact in 1991, one after another former member as well as former states of the Soviet Union have been coaxed and in many cases bribed with false promises by Washington into joining the counter organization, NATO.

Rather than initiate discussions after the 1991 dissolution of the Warsaw Pact about a systematic dissolution of NATO, Washington has steadily converted NATO into what can only be called the military vehicle of an American global imperial rule, linked by a network of military bases from Kosovo to Poland to Turkey to Iraq and Afghanistan. -- in Asia Times Online.

US & Israel Created Georgia War With Russia, Bt Elaine Meinel Supkis
Georgia wishes to drag everyone into this business. The US is very tempted to join in because this means the military/industrial complex can make more money. The Iraqis and Afghanis are not armies, they are civilians fighting the US military death machine. But RUSSIA can shoot down our jets, sink our ships and do other massive damage! Whoopee for our Daddy Warbucks from Cheney on down! They rub their hands with glee. This will be an übermassive opportunity to make big bucks. Forget the nickel and dime business of building crummy structures in Iraq with bad wiring and flimsy doors! Just one jet shot down and the stock for Boeing will go through the roof! Imagine that.

The idea this can launch WWIII and end up with all of us dead doesn't occur to these monsters licking their chops over the idea of the US plunging deep into a very destructive war! They only see the profits. - in Elaine Meinel Supkis, "War and Peace".


OAM 414 12-08-2008 14:06 (última actualização 13-08-2008 10:24)

segunda-feira, agosto 11, 2008

Eurásia adiada

O fim do Tratado de Lisboa e a resposta russa; preâmbulo da campanha americana no Irão

Os alanos constituíam um povo bárbaro (isto é, não falavam latim), com origem no nordeste do Cáucaso, entre o rio Don e o Mar Cáspio, que realizou uma transmigração em direcção ao ocidente nos séculos IV e V.

Em 360, os hunos destruíram o seu império, obrigando muitos a atravessar a Europa até à Península Ibérica (em 409). Nesta migração, acabaram por se juntar aos suevos e aos vândalos que ocuparam simultaneamente com estes a Hispânia.

Os alanos que permaneceram a nordeste do Cáucaso passaram a designar-se por Tártaros. Aqueles que se estabeleceram na península Ibérica fundaram um reino na Lusitânia, sediado em Pax Julia, a actual cidade de Beja, em Portugal... -- in Wikipédia.

Os ossetas são um grupo étnico iraniano, natural da Ossétia, região do Cáucaso. Os ossetas estão localizados, em sua maior parte, na Ossétia do Norte, situada na Rússia, e na Ossétia do Sul, que apesar de ter declarado sua independência permanece reconhecida internacionalmente como parte da Geórgia. Falam o osseto, um idioma indo-europeu da família iraniana.

... Os ossetas descendem dos alanos, uma tribo sármata. Tornaram-se cristãos durante o início da Idade Média, por influência dos georgianos e dos bizantinos. No século VIII um reino alano já consolidado, chamado nas fontes contemporâneas de Alânia, surgiu no norte das montanhas do Cáucaso, na região das atuais Circássia e Ossétia do Norte. Em seu apogeu, a Alânia foi uma potência regional, com uma forte presença militar, e uma vasta riqueza obtida com a Rota da Seda.

Forçados de sua terra natal, ao sul do rio Don, durante a conquista mongol, cruzaram as montanhas rumo ao território do outro lado das cordilheiras do Cáucaso, onde formaram três entidades territoriais distintas (reunidas no que hoje é designada por Ossétia do Sul) -- in Wikipédia.

Ossétia do Sul, localização (mapa 1); Ossétia do Sul (mapa 2); Ossétia do Sul, áreas controladas pelo estado da Geórgia (mapa 3); rota das migrações do Alanos e Vândalos nos séculos IV e V (mapa 4); grupos etno-linguísticos na região do Cáucaso (mapa 5).

Dividir para reinar (divide ut regnes ou divide et impera) tem sido o lema comum a muitos estados e impérios, sobretudo quando não conseguem seduzir as nações e povos dominados para uma efectiva comunhão patriótica de objectivos. A imprensa ocidental mais submissa aos canais de propaganda anglo-americana tem vindo a sugerir que a resposta russa à invasão militar da Ossétia do Sul, pelas tropas da Geórgia, é uma grave violação de soberania (Carld Bildt, ministro dos negócios estrangeiros sueco), ou uma reacção desproporcionada (George W. Bush) e a prova de que a Rússia quer recuperar a sua dimensão imperial. Nada mais falso! O que eu vejo, isso sim, é a frenética actividade dos Estados Unidos, com o apoio discreto de uma Europa sumamente hipócrita, tentando provocar divisões territoriais em toda a parte do planeta. Do Afeganistão ao Iraque, da Palestina ao Irão, da Bolívia à China, e agora no Cáucaso. Em todos os casos afloram duas questões primordiais: a disputa pelos principais recursos energéticos do planeta (petróleo, gás natural) e o enorme esforço de manutenção da actual, embora ameaçada, supremacia americana.

Não estranharia nada que a provocação georgiana tivesse sido preparada pelos serviços secretos norte-americanos, fazendo parte, tal como a desestabilização do Tibete, dos Jogos Olímpicos de Pequim, e da província chinesa de Xinjiang por separatistas muçulmanos (1), da agenda preparatória dum ataque, porventura nuclear, ao Irão. O lóbi sionista americano tem realizado uma pressão enorme para fazer aprovar no Congresso a Resolução 362 (2), destinada a impor unilateralmente sanções draconianas ao Irão, as quais poderão conduzir ao bloqueio económico e naval do estreito de Ormuz.

Não estou por conseguinte certo das análises optimistas (3) que se limitam a ver na tragédia da Ossétia mais uma derrota da família Bush. Na realidade, depois de reunir uma série de pontas soltas, isto parece-em ser mais um episódio, porventura decisivo, da guerra em preparação contra o Irão, que por sua vez será uma guerra contra a Rússia, um aviso à China e um grande retrocesso para o sonho europeu. O facto de a França estar neste preciso momento à frente da União Europeia inspira-me aliás os maiores receios. Não devemos esperar nada de bom, nem do garnisé de Paris, nem do dandy que pomposamente dirige os assuntos externos da França e, por mais alguns meses, da Europa!

O Tratado de Lisboa, que permitiria a criação dum directório europeu franco-alemão, falhou. Falhou, por um lado, porque a aliança anglo-americana sabotou uma vez mais a tentativa de delimitação de um centro de gravidade europeu. E falhou, por outro lado, porque a Europa no seu conjunto foi incapaz de cooperar de forma séria com a Rússia pós-soviética, tendo revelado uma total submissão à estratégia aventureira do nosso amigo americano.

Berlim procurou alargar rapidamente o território da União Europeia e sobretudo o território da moeda única. Mas Bruxelas permitiu aos Estados Unidos vender a ideia peregrina de que a NATO, uma aliança militar criada para o Atlântico Norte, deveria alastrar até aos antigos países da órbita soviética (Bulgária, República Checa, Estónia, Hungria, Islândia, Letónia, Lituânia, Polónia, Roménia, Eslováquia, Eslovénia,) até à Turquia e mesmo até ao Cazaquistão! Ou seja, em vez de se ter estabelecido uma zona desmilitarizada entre a Rússia e a Europa ocidental, que pudesse servir de mediador para uma progressiva integração euro-asiática, fazendo desta imensa zona geográfica uma formidável força de cooperação e pacificação mundiais, os oportunistas da Europa abriram as pernas aos aventureiros americanos, escangalhando de novo a paz europeia!

O acosso permanente da Sérvia e a independência fabricada do Cosovo (entregue a um bando de chulos, traficantes de droga e ladrões descarados), bem como a instalação de uma das maiores bases militares americanas na Macedónia, e ainda a tentativa provocatória de instalar radares e mísseis na República Checa e na Polónia, tiveram finalmente uma resposta à altura por parte da Rússia. Tendo seguramente o apoio da China, com quem assinou em 21 de Julho passado o tratado que finalmente regulariza a delimitação da fronteira de 4300 Km entre os dois países (4), sanando por fim o diferendo existente há quarenta anos em torno das ilhas Heixiazi e Yinlong, situadas na confluência dos rios Ussuri e Amur, no Nordeste da China, a Rússia decidiu finalmente responder ao cerco que a NATO, ou melhor, os Estados Unidos com o apoio dissimulado da União Europeia, vêm montando junto das fronteiras russas. Berlim, Londres e Paris foram avisados sobre a possibilidade de ficarem sem gás de um dia para o outro. Entretanto, em plena cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim, a Rússia resolve colocar os Estados Unidos em sentido, explicando-lhes que não irão tolerar o controlo do Mar Cáspio por uma manada de cowboys. Apesar de o oleoduto da BP que transporta petróleo do Mar Cáspio para o Mediterrâneo, de onde segue para a Europa e para os Estados Unidos, ter sido sabotado dias antes pelos separatistas curdos do PKK, a verdade é que a Rússia, que quer a BP fora do Cáspio quanto antes (aha!), está a tomar posições tácticas decisivas para a eventualidade de um ataque surpresa de Israel ou dos Estados Unidos ao Irão.

Os países detentores das principais reservas estratégicas mundiais de petróleo e gás natural (recursos energéticos insubstituíveis nos próximos 15 a 20 anos) -- Arábia Saudita, Rússia, Cazaquistão, Irão, Venezuela, Bolívia, Nigéria, Angola, Brasil, etc. -- têm vindo a nacionalizar paulatinamente os seus haveres estratégicos. Os países produtores de alimentos, como a Índia e o Brasil, mostraram que não hesitarão em suspender as exportações de arroz e soja, se tal for necessário, perante uma escalada de preços dos bens alimentares. Por outro lado, os E.U.A. e a Europa, que têm vindo a perder competitividade económica face à China e à Índia, não só estão mergulhados numa profundíssima crise financeira, como caminham a passos largos para recessões duras e prolongadas. A fragilidade energética dos Estados Unidos e da União Europeia é muito crítica e vai piorar nos próximos anos, não se vislumbrando no horizonte qualquer visão política séria do problema. A actual queda do preço do petróleo deriva em grande medida da destruição da procura americana e europeia. Mas isto apenas empobrece e desarma a Europa! A China e a Rússia agradecem!!

Nesta história da Ossétia estou completamente ao lado dos ossetas do Sul, porque são povo, nação e estado há muito mais tempo do que todos as democracias europeias. Ainda nós, portugueses, estávamos a sete séculos de sermos quem somos, e já os antepassados deste singular povo caucasiano deixavam a sua semente genética e civilizacional no Alentejo. Formulo assim votos de sucesso a João Soares para que honre a razão e a história no papel de mediador que foi chamado a desempenhar nesta hora difícil para a Ossétia e para a Europa.



NOTAS
  1. According to Stratfor, a US based think tank on intelligence issues, the Turkestan Islamic Party (TIP) which claimed responsibility for the pre-Olympic terror attacks belongs to the broader East Turkestan Islamic Movement (ETIM), based in the Xinjiang-Uygur autonomous region.

    The ETIM is known to be covertly supported by Pakistan Inter Services Intelligence (ISI), acting in close coordination with the CIA. -- in PsyOp: Is Washington Intent on Sabotaging the Beijing Olympics? - Pre-Olympics PsyOp creates Atmosphere of Fear and Insecurity, by Michel Chossudovsky.
  2. ... (the Congress) demands that the President initiate an international effort to immediately and dramatically increase the economic, political, and diplomatic pressure on Iran to verifiably suspend its nuclear enrichment activities by, inter alia, prohibiting the export to Iran of all refined petroleum products; imposing stringent inspection requirements on all persons, vehicles, ships, planes, trains, and cargo entering or departing Iran; and prohibiting the international movement of all Iranian officials not involved in negotiating the suspension of Iran's nuclear program; (.) -- in H. CON. RES. 362 - Expressing the sense of Congress regarding the threat posed to international peace, stability in the Middle East, and the vital national security interests of the United States by Iran's pursuit of nuclear weapons and regional hegemony, and for other purposes.
  3. After the catastrophic invasions and occupations of Iraq and Afghanistan, the neocons have just lost a third war, in Georgia. -- The warmongers have lost yet another war, by Jerome a Paris, Sun Aug 10, 2008 at 05:04:06 AM PDT.

    # First, let's be clear: there are two reasons only we care about Georgia: the oil pipelines that go through its territory, and the opportunity it provides to run aggressive policies towards Russia.

    # Second, let's also be very explicit: this conflict is not unexpected: it is a direct consequence of our policies, in particular with respect to Kosovo (and to all those that will claim that "no one could have predicted" this, let me point out to this comment, or this earlier one, or this article). I would even go so far as to say that it was egged on by some in Washington: the neocons.

    # Third, our claims to have the moral high ground are totally ridiculous and need to be fought, hard. This is not about democracy vs dictature, brave freedom lovers vs evil oppressors, but a nasty brawl by power-hungry figures on both sides, with large slices of corruption. The fact that this is turned into a cold-war-like conflict between good and evil is a domestic political play by some in Washington to reinforce their power and push certain policies that have little to do with Russia or Georgia. That needs to be understood.

    The reason the current conflict is not about the oil is because, now that the pipeline is built, that game is, in effect, over. Now, the only thing that could stop the flow of oil is, other than localised attacks (like the one conducted by the Kurds, something that has long been expected, and which was mitigated by building the pipeline on a route that avoids kurdish territory) would be for Russia to actually invade all of Georgia and physically take control of the pipeline, ie an outright act of war not just against Georgia, but also against the US.

    The reason for that is that, as part of the process to put in place the pipeline, Georgia invited the US military to set up a base on its territory, near the route of the pipeline. Thus, any attack on the pipeline by Russia would become an attack on the USA. -- Georgia: oil, neocons, cold war and our credibility, by Jerome a Paris.
  4. Russia, China End Decades-Long Border Dispute, in World Politics Review.

OAM 413 11-08-2008 15:11