sexta-feira, outubro 20, 2006

Angola 1

Suiça ameaça cleptocracia mundial
Bloqueados 100 milhões de dólares do presidente angolano.
Que se passa na banca portuguesa, neste como noutros casos de branqueamento de capitais?


Há dez anos que os tribunais suiços iniciaram um longo processo para bloquear os fundos depositados nos seus bancos por ditadores e políticos corruptos de todo o mundo, cujas fortunas, por vezes colossais, foram obtidas através da espoliação de bens públicos pertencentes ao povos que governam, usando para tal os mais diversos expedientes de branqueamento de capitais. O processo começou em 1986 com a devolução às Filipinas de 683 milhões de dólares roubados por Ferdinando Marcos, bem como a retenção dos restantes 356 milhões que constavam das suas contas bancárias naquele país. Prosseguiu depois com o bloqueamento das contas de Mobutu e Benazir Bhutto. Mais tarde, em 1995, viria a devolução de 1236 milhões de euros aos herdeiros das vítimas judias do nazismo. Com a melhoria dos instrumentos legais de luta contra o branqueamento de capitais, conseguida em 2003 (também em nome da luta contra o terrorismo), os processos têm vindo a acelerar-se, com resultados evidentes: 700 milhões de dólares roubados pelo ex-ditador Sani Abacha são entregues à Nigéria em 2005; dos 107 milhões de dólares depositados em contas suiças pelo chefe da polícia secreta de Fujimori, Vladimiro Montesinos, 77 milhões já regressaram ao Perú e 30 milhões estão bloqueados; os 7,7 milhões de dólares que Mobutu depositara em bancos suiços estão a caminho do Zaire; mais recentemente, foram bloqueadas as contas do presidente angolano José Eduardo dos Santos, no montante de 100 milhões de dólares. É caso para dizer que os cleptocratas deste mundo vão começar a ter que pensar duas vezes antes de espoliarem os respectivos povos. É certo que há mais paraísos fiscais no planeta, mas também é provável que o exemplo suiço contagie pelo menos a totalidade dos off-shores sediados em território da União Europeia, diminuindo assim drasticamente o espaço de manobra destas pandilhas de malfeitores governamentais.

No caso que suscitou este texto, o bloqueamento de 100 milhões de dólares depositados em contas de José Eduardo dos Santos, presidente de Angola há 27 anos, pergunta-se: que fez ele para se tornar o 10º homem mais rico do planeta (segundo a revista Forbes)? Trabalhou em quê para reunir uma fortuna calculada em 19,6 mil milhões de dólares? Se usou o poder para espoliar as riquezas do povo que governa, deixando-o a viver com menos de dois dólares diários, que devem fazer os países democráticos perante tamanho crime de lesa humanidade? Olhar para o outro lado, em nome do apetite energético? Que autoridade terão, se o fizerem, para condenar as demais ditaduras e estados falhados? Olhar para o outro lado, neste caso, não significa colaborar objectivamente com a sobre-exploração indigna do povo angolano e a manutenção de um status quo anti-democrático e corrupto que apenas serve para submeter a esmagadora maioria dos angolanos a uma espécie de domínio tribal não declarado?

Na Wikipedia lê-se:
Os habitantes de Angola são, em sua maioria, negros (90%), que vivem ao lado de 10% de brancos e mestiços. A maior parte da população negra é de origem banta, destacando-se os quimbundos, os bakongos e os chokwe-lundas, porém o grupo mais importante é o dos ovimbundos. No Sudoeste existem diversas tribos de boximanes e hotentotes. A densidade demográfica é baixa (8 habitantes por quilómetro quadrado) e o índice de urbanização não vai além de 12%. Os principais centros urbanos, além da capital, são Huambo (antiga Nova Lisboa), Lobito, Benguela, e Lubango (antiga Sá da Bandeira). Angola possui a maior taxa de fecundidade (número de filhos por mulher) e de mortalidade infantil do mundo. Apesar da riqueza do país, a sua população vive em condições de extrema pobreza, com menos de 2 dólares americanos por dia.

O recente entusiasmo que acometeu as autoridades governamentais e os poderes fáticos portugueses relativamente ao “milagre angolano” (crescimento na ordem dos 21% ao ano) merece assim maior reflexão e sobretudo alguma ética de pensamento.

Os fundos comunitários europeus aproximam-se do fim. Os portugueses, entretanto, não foram capazes de preparar o país para o futuro difícil que se aproxima. São muito pouco competitivos no contexto europeu. As suas elites políticas, empresariais e científicas são demasiadamente fracas e dependentes do estado clientelar que as alimenta e cuja irracionalidade por sua vez perpetuam irresponsavelmente, para delas se poder esperar qualquer reviravolta estratégica. Quem sabe fazer alguma coisa e não pertence ao bloco endogâmico do poder vai saindo do país para o resto de uma Europa que se alarga, suprindo necessidades crescentes de profissionais nos países mais desenvolvidos (que por sua vez começam a limitar drasticamente as imigrações ideologicamente problemáticas): Espanha, Alemanha, Luxemburgo, Suiça, Reino Unido, Holanda, Dinamarca, Noruega... No país chamado Portugal vão assim ficando os velhos, os incompetentes e preguiçosos, os indecisos, os mais fracos, os ricos, os funcionários e uma massa amorfa de infelizes agarrados ao futebol e às telenovelas, que mal imaginam a má sorte que os espera à medida que o petróleo for subindo dos 60 para 100 dólares por barril, e destes para os 150, 200 e por aí a fora...

A recente subida em flecha do petróleo e do gás natural (mas também do ouro, dos diamantes e do ferro) trouxe muitíssimo dinheiro à antiga colónia portuguesa. Seria interessante saber que efeitos esta subida teve na conta bancária do Sr. José Eduardo dos Santos. E que efeitos teve, por outro lado, nas estratégias de desenvolvimento do país. O aumento da actividade de construção já se sente no deprimido sector de obras e engenharia português. As empresas, os engenheiros e os arquitectos voam como aves sedentas de Lisboa para Luanda. É natural que o governo português, desesperado com a dívida... e com a sombra cada vez mais pesada dos espanhois pairando sobre os seus sectores económicos estratégicos, se agarre a qualquer aparente tábua de salvação. E os princípios? E a legalidade?

Se a saída do ditador angolano estiver para breve, ainda se poderá dizer que a estratégia portuguesa é, no fundo, uma estratégia para além de José Eduardo dos Santos. Mas se não for assim, e pelo contrário viermos a descobrir uma teia de relações perigosas ligando a fortuna ilegítima de José Eduardo dos Santos a interesses e instituições sediados em Lisboa (1), onde fica a coerência de Portugal? Micheline Calmy-Rey, ministra suiça dos Negócios Estrangeiros, veio lembrar a todos os europeus que tanto é ladrão o que rouba como o que fica à espreita ou cobra comissões das operações criminosas.



NOTAS

* Fonte original deste post: El País, 19 Out 2006. Link
* José Eduardo dos Santos manda refutar acusações.

1 — Em 19 de Outubro de 2005 rebenta entre nós um escândalo sobre o presumível envolvimento de vários bancos portugueses numa megafraude fiscal e branqueamento de capitais. A coisa, apesar de escancarada em todos os média, foi rapidamente abafada, deixando porém atrás de si a evidência de que Portugal é uma boa praça para operações de fraude fiscal, branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. Ver este link. E este. Vale também a pena ler o relatório do Finantial Task Force sobre a luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, dedicado à situação actual portuguesa, publicado em Outubro de 2006, e de que destacamos esta passagem:
Adequate powers are available to investigative authorities to gather evidence and compel the production of financial records and files from financial institutions and DNFBPs. Portuguese authorities have sufficient powers to prosecute ML and TF offences; however, the structures, staffing and resources to investigate these offences are also responsible for examining a range of crimes. While legal measures are available to investigate and prosecute for ML [money laudering] or TF [terrorism financing] offences, a relatively small number of cases have been successfully prosecuted. ” — Texto integral (pdf)

Referências
In Angola, new evidence from IMF documents and elsewhere confirm previous allegations made by Global Witness that over US$1 billion per year of the country's oil revenues - about a quarter of the state's yearly income - has gone unaccounted for since 1996. Meanwhile, one in four of Angola's children die before the age of five and one million internally-displaced people remain dependent on international food aid. This report highlights the latest revelations from the ‘Angolagate’ scandal, in which political and business elites in France, Angola and elsewhere exploited the country's civil war to siphon off oil revenues. Most recently, evidence has emerged in a Swiss investigation of millions of dollars being paid to President Dos Santos himself. The government continues to seek oil-backed loans at high rates of interest which are financed through opaque and unaccountable offshore structures. A major concern exists that Angola's elite will now simply switch from wartime looting of state assets to profiteering from its reconstruction.” — in “Time for Transparency”, March, 2004. Global Witness

Os Homens do Presidente. A história devastadora das indústrias petrolíferas e bancárias na guerra privatizada de Angola. Os Homens do Presidente é o resultado de dois anos de investigações da Global Witness e apresenta uma actualização da campanha a favor de transparência total nos sectores bancário e petrolífero, dando prosseguimento às revelações iniciadas em Dezembro com o relatório Um Despertar Cru, sobre o mecanismo de saque estatal generalizado em Angola. Texto integral, PDF (2.7 Mb)

OAM #147 19 OUT 2006

6 comentários:

Anónimo disse...

Os Bancos Suiços são uns santinhos...

Falta dizer, que na altura em que o presidente Ferdinando Marcos estava no poder, a seu pedido, o Credit Suiss, fez deslocar uma delegação para as Filipinas, com o proposito exclusivo, de transferir (roubar) o dinheiro das doações, dos paises que se proposeram, a ajudar o povo Filipino.

Como é que pensa que o dinheiro, foi parar aos cofre dos bancos Suiços?
Então eles sabiam que o país estava na miséria, e não perguntavam donde vinha tanto dinheiro?
Claro que não, eles sabiam donde vinha o dinheiro, não era necessário perguntar.

Depois veem armar-se em santos... Mas há alguma seriedade no actual sistema financeiro actual?

Um abraço a todos

António Maria disse...

O importante, neste caso, não é sublinhar a duplicidade do sistema bancário suiço, mas o facto de o sistema judiciário suiço ter começado a agir, e dessa acção ter resultado a devolução de centenas de milhões de dólares aos países roubados. Os processos de investigação e de devolução continuam. Pelo que não convem confundir tudo e todos, lançando desta forma poeira para os olhos da opinião pública. O Sr José Eduardo dos Santos --presidente de Angola-- é um ladrão sem escrúpulos, tem "sócios" em todo o mundo, nomeadamente em Portugal, pelo que o importante é ir dizendo a esse senhor (e aos seus cúmplices) que talvez venha a ter a mesma sorte de Marcos, Fujimoro, Montesinos, Mobutu, etc., i.e.: ficar sem o dinheiro que roubou ao povo que governa e passar o resto da vida fugindo de país para país, como cão com sarna.

Anónimo disse...

É verdade o que hoje o jornal suiço que divulgou a notícia sobre um dos maiores larápios do planeta, que chegou ao poder de mãos vazias e agora construiu um império à custa do derramamento de sangue e sofrimento de pessoas. José Eduardo dos Santos é o maior entrave para a democracia em Angola. Se o presidente do maior partido da oposição retirar, algumas das palavras do seu mais recente discurso, então diria de forma cabal e peremptória que estamos perante um retrocesso de democracia. Será que um comunista irá implementar uma verdadeira democracia neste planeta ?

Anónimo disse...

a situaçao em angola esta cada vez mais pior do que em tempo de guerra , os roubos dos assaltantes assassinos que estao no poder, as esperanças da juventude estao se esgotando ,nao ha escolas ,nao ha empregos , as casas que constroem nao e em beneficio do povo. tanto petroleo, tanto diamante pra que pra nada ... eu gostaria tanto que alguem tira-se esse sr jose eduardo do poder , o povo esta cansado deste malfeitor sanguinario que tem unicamente a exclusiva missao de acabar o povo angolano e na minha este povo nao e seu povo ...esse gajo e alma doutro mundo, sera que e humano ? duvido que seja , o cara nao tem vergonha e nem um pingo de sensibilidade... da vontade de chorar,se nao acreditas venha ver o sofrimento deste povo, este povo esta sofrendo....

Anónimo disse...

eu nao sei se o senhor jose eduardo tem acompanhado os traçados da historia dos malfeitores que pareciam deuses mas tiveram fins tragicos , o seu companheiro mobutu, fujimori, pinochet,saddam, hitler,e tantos outros que ele deve conhecer melhor, morreram sem gloria, viveram o resto da vida envergonhados, roubaram tanto mais depois ficaram pobres... ha coisas que valem mais do que dinheiro roubado como o respeito, a dignidade, a reputaçao e ja perdeste essas virtudes a muito tempo mas vais a tempo de recuperar com um pedido de desculpas ao povo e devolver todo dinheiro que roubaste...fui

Anónimo disse...

o mundo não pode estar indiferente do que esta a acontecer em angola nesta fase da campanha eleitoral, eu considero que existe fraude eleitoral, vejamos os valores atribuidos aos partidos politicos para a campanha eleitoral demonstra a cobardia do regime. para os outros são cerca de USD 16.000.000.00, equanto que o MPLA e o José Eduardo dos Santos tenhem empresas e fortunas destinadas para mentir o povo através do marketing eleitoral. por favor ajudem este povo deste regime.