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domingo, fevereiro 23, 2014

Mais portugueses!

À entrada do congresso do PSD. Foto: Jornal de Negócios


O primeiro crescimento que temos que cuidar é o crescimento demográfico


A preocupação com a natalidade é tardia, mas mais vale tarde que nunca.

Que vamos a caminho de reduzir a população portuguesa para os níveis da Catalunha é algo que vem em todas as previsões demográficas. Que é possível mitigar o desastre combinado do envelhecimento e simultânea perda de população, é. Mas temos que agir com clareza, determinação e sem mais demora.

Algumas ideias simples:
  1. abertura de uma conta de obrigações de dívida pública em nome de cada nova pessoa nascida em Portugal a partir de dezembro de 2014, no valor de 2000 euros, com rendimento garantido de 3 a 4%, e senioridade perante qualquer hipotética reestruturação da dívida. Estes dois mil euros seriam divididos em títulos a 10 e 20 anos, resgatáveis a favor exclusivo dos seus titulares.
  2. atribuição de um abono de família equivalente a metade do chamado rendimento de inserção social por cada um dos três primeiros filhos biológicos do agregado familiar.
  3. isenção total de taxas moderadoras na prestação de cuidados de saúde até aos 14 anos.
  4. escolaridade obrigatória totalmente gratuita, incluindo todos os manuais escolares, que deverão ser digitalizados, acessíveis online, e produzidos segundo economias tecnológicas e de escala favoráveis à sua atualização permanente e baixo custo de produção.
  5. favorecer a formação profissional e académica superior privilegiando um amplo e rigoroso sistema de bolsas atribuíveis apenas em função do mérito dos candidatos.

Esta medidas devem ser aplicadas independentemente dos níveis de rendimento dos agregados familiares, e devem abranger apenas os primeiros três descendentes de cada agregado familiar.

Esperemos que as palavras de Pedro Passos Coelho não tenham saído da sua boca como mera propaganda eleitoralista.


POST SCRIPTUM

A notícia que entretanto veio nos jornais
Incentivo a natalidade proposto por Passos Coelho exige mais emprego e mudanças na lei laboral — Público, 23/02/2014 - 23:14.

Não se conhecem ainda os pormenores, mas o anúncio de Pedro Passo Coelho, neste domingo, no congresso do PSD, mostrou-se ambicioso quanto baste: criar uma comissão multidisciplinar, chefiada por Joaquim Azevedo, da Universidade Católica, para, em três meses, preparar um plano de acção na área da natalidade
Última atualização: 24/2/2014 12:38 WET

quinta-feira, fevereiro 20, 2014

The Chinese Dominoes Are About To Fall: Complete List Of Upcoming Trust Defaults | Zero Hedge

File:China-Today oil reserves and demand-en.svg

China: a prosperidade infinita afinal é finita


Mais precisamente, começou com a descoberta/exploração das grandes reservas petrolíferas de Daqing, em 1960, mas 50 anos depois, a China tornou-se o segundo maior importador mundial de petróleo, o maior importador mundial de carvão e importa em massa muitas outras matérias primas. Ou seja, o seu crescimento passou a depender criticamente de países terceiros, não apenas enquanto importadores dos seus produtos transformados com custos laborais e sociais mínimos (1), mas também enquanto exportadores de recursos vitais que não tem, ou está a ver desaparecer a um ritmo galopante.

Para segurar uma população que começou a diminuir e a envelhecer sem qualquer rede social de proteção, para segurar uma população ativa urbana sujeita aos ciclos cada vez mais rápidos de expansões curtas e recessões longas, para continuar a crescer, em suma, a ritmos superiores a 4%, a China está já a transformar-se num enorme incómodo planetário. O choque com o Japão é iminente, um choque maior com a Índia, Vietname e Indonésia está claramente no horizonte, os atritos com a Rússia vão acabar por ocorrer à medida que os chineses entram pelo território siberiano abandonado pela declinante população russa, em suma, África e a América Latina acabarão por dar azo a disputas intestinas de recursos.

China? Um Panda com pés de barro.

The Chinese Dominoes Are About To Fall: Complete List Of Upcoming Trust Defaults | Zero Hedge


NOTAS
  1. China: salário mínimo mensal: 119 a 190 euros; salário médio: 357 euros.

terça-feira, dezembro 24, 2013

Boa Nova, Má Nova



Empires decline – revisited from Pedro Miguel Cruz on Vimeo.
Ampliar a janela para melhor apreciar.


2013 está no fim, mas a nossa desgraça não

Portugal is broke, unemployed, Spain’s Mini Me.

"Would you keep your money in Luxembourg, Portugal, Spain, Italy, or Greece? I didn’t think so. Dmitry Medvedev caught many people’s sentiments with the cryptic but unambiguous suggestion that you should “Get all money out of western banks now!”

2013 Year in Review: Austerity is not a policy. David B. Collum // Zero Hedge.

Deixar de trabalhar aos 55 anos e querer viver até aos 90 anos é uma utopia. Castigar socialmente a procriação é uma forma de suicídio coletivo. Qualquer miúda que tenha completado o ensino básico percebe isto.

O Japão enveredou por este caminho. Tentou mitigar o desastre demográfico anunciado substituindo o trabalho por autómatos e robôs. Desprezou a juventude, transformando a parte mais apta em escravos da tecnologia e da produtividade, e a maioria em consumidores compulsivos e deprimidos. O resultado foi a maior dívida pública do planeta e uma dívida externa que disparou a partir do momento que o valor do dólar começou o seu lento eclipse e as principais economias mundiais (Estados Unidos e Europa) entraram no jogo da destruição das taxas de juro. Até com a China a desvalorização competitiva da moeda japonesa perdeu a sua magia assim que Pequim percebeu o mecanismo do yen carry-trade. Em suma, nenhum artifício financeiro, por mais sofisticado que seja, pode esconder eternamente limitações estruturais na economia quando estas se instalam, seja no domínio da energia (peak oil), das alterações climáticas, ou da explosão demográfica que conduz a um desequilíbrio entre a procura agregada mundial (que ainda não deixou de crescer) e a oferta agregada mundial (que atingiu ou está muito perto de atingir limites inultrapassáveis).

1415-2015.

Acresce a tudo isto uma redistribuição geográfica da produção e do consumo para fora dos impérios onde esteve concentrada nos últimos seiscentos anos: Europa e Estados Unidos-Canadá. Esta mudança de padrão geográfico na distribuição da riqueza, maioritariamente a favor da região Ásia-Pacífico, onde há mais gente do que no resto do planeta, terá (está a ter) como consequência inexorável, numa primeira fase, o empobrecimento das populações da América do Norte e da Europa, a degradação dos respetivos sistemas de proteção social, e uma crise económica e demográfica sem precedentes. O eixo deste colapso passa pela extinção de grande parte do setor de serviços.

Os camponeses emigraram para as cidades, nos séculos 19 e 20, para alimentar de trabalho a indústria e depois os serviços. Hoje são centenas de milhões de seres humanos sem um palmo de terra a que se agarrarem, frequentemente endividados, e para quem o desemprego só não significará miséria imediata enquanto os estados tiverem eles próprios poupança suficiente para acudir à desgraça crescente. Na realidade, já deixaram de ter tal poupança. Por isso começaram a tomar de assalto os contribuintes indefesos e a negar os contratos sociais. Até já nos serviços financeiros mais sofisticados, onde predominou até há um ou dois anos o conforto e as remunerações altas, a ordem é para reduzir os custos com pessoal e evitar gastos que não sejam plenamente justificados. A avaliação de desempenho e a auto-avaliação são constantes, assim como a rotação dos recursos humanos, por mais experientes e bem preparados que sejam.

É este o palco da crise das dívidas pessoais, empresariais e soberanas.

A crise sistémica em curso desde 2006-2008, que só terá fim quando todo o sistema monetário colapsar, dando lugar a uma nova ordem monetária mundial, depois de uma violentíssima transferência das poupanças e bens materiais das classes médias para as elites financeiras, a par da destruição de boa parte da riqueza virtual acumulada pelos especuladores, é sobretudo fruto de um excesso de dinheiro criado a partir do nada com a finalidade de manter vivo por mais algum tempo o crescimento fictício de sociedades que praticamente deixaram de produzir e apenas consomem. Nem produzem, nem se reproduzem. Vivem apenas na ansiedade do consumo e do envelhecimento, cada vez mais aflitas e desorientadas, agarradas aos telemóveis, como se fossem amuletos.

Jesus expulsando os banqueiros judeus do templo.

O fascismo fiscal e o assalto puro e simples à riqueza dos povos, perpetrado pelas elites governamentais e partidárias corrompidas a mando das elites financeiras, está em marcha, é o corolário da crise sistémica escancarada, e passa nomeadamente por:

  • fechar a torneira dos empréstimos (impedindo assim que a diarreia monetária canalizada para os bancos gere inflação)
  • colocar a salvo as elites financeiras
  • resgatar os bancos, numa primeira fase, com dinheiro público
  • resgatar os bancos, numa segunda fase, assaltando descaradamente os depósitos dos clientes
  • resgatar os bancos, controlando os movimentos de capitais (aconteceu em Chipre, e o JP Morgan já começou a fazê-lo...)
  • resgatar os bancos atolados em dívida soberana, classificada como lixo, através de dinheiro público resultante da aplicação de taxas sobre depósitos bancários em toda a zona euro (para começar, 10%, propõe o FMI)
  • resgatar os bancos, numa terceira fase, deixando subir as taxas de juro e a inflação
  • diminuir a despesa pública, nacionalizando as pensões privadas
  • diminuir a despesa pública, convertendo as pensões em dívida pública
  • diminuir a despesa pública, acabando com a indexação das pensões à inflação
  • trocar os direitos económicos e as poupanças da maioria por bens tangíveis (energia, água, terra agrícola e florestal, propriedade imobiliária e metais preciosos/ jóias) através de execuções fiscais e judiciais de todo o tipo, a favor das elites.

O grande drama desta crise é que a mesma não é portuguesa, nem europeia, nem americana, mas sim, verdadeiramente, uma crise malthusiana global, ou de fim de uma longa era de crescimento, acelerada pela transferência da riqueza real produzida do Ocidente para o Oriente. Depois de tudo o que li nestes últimos dez anos, a última coisa que um povo habituado ao medievalismo, ao cesarismo (como me escrevia um amigo há dias) e a partir quando não pode mais, será capaz de fazer é uma revolução capitalista burguesa indígena, ou uma revolução cultural burguesa indígena. Vivemos dos ecos destas duas revoluções, que sempre vimos como estrangeirismos.

Seremos arrastados na onda seja ela qual for, e se for como a que apanhou os pescadores afoitos de robalos na Costa da Caparica, pior para todos nós :(

Não há alternativa a uma quebra consistente da oferta agregada global com a consequente destruição da procura, com tudo o que isto implica: desemprego, implosão financeira, falência e colapso dos regimes, quebra abrupta da demografia, conflitos sociais e guerras de grandes proporções. O travão do Quantitativa Easing (diarreia financeira) nos Estados Unidos (Tapering) poderá ser o princípio do default do último império da Era Moderna e Contemporânea (1415-2015) e, se assim for, a destruição da dívida americana induzida pela própria destruição do dólar (por exemplo, desvalorizando abruptamente, ou dando mesmo passo a um novo dólar...) será uma maremoto de proporções inimagináveis que chegará às praias lusitanas e europeias num instante.

Se houver muita confusão na Europa, se a Alemanha e o euro tremerem mesmo, mais de um golpe de estado ocorrerão na Europa, desde logo em Espanha e... em Portugal.

Os partidos políticos portugueses, na sua confrangedora ignorância intelectual, mediocridade cultural, irresponsabilidade política e egoísmo corporativo atroz, não serão os principais causadores da tragédia que se aproxima, mas serão duramente responsabilizados por tudo o que já deveriam ter feito, por tudo que têm que fazer e continuam a não fazer, em suma, por tudo o que não fizerem para defender Portugal, como estado, como nação e como povo, das consequências mais trágicas de uma metamorfose inexorável.

Formular votos de um Bom Natal com este desastre à porta prova que não perdemos o sentido de humor e que nos resta algum amor para dar.

Oxalá estivera completamente equivocado nas palavras que escrevi!

O bacalhau demolha no frigorífico. Amanha de manhã vou comprar uma pescada, couves e pão fresco. Depois de um passeio pela praia, passarei umas horas a ler. Alguns telefonemas depois, quando forem dez da noite, a consoada será servida com pompa e circunstância. O resto da história já conhecem.

Um Bom Natal, meus queridos leitores!

Última atualização: 24/12/2013 11:40 WET

domingo, novembro 24, 2013

Repovoamento ou morte

A crise não é para velhos?

O problema não é constitucional

“Portugal tem actualmente 26,6% da população [cerca de 2,8 milhões de pessoas] com mais de 65 anos, mas até 2050 esse valor deverá ultrapassar os 40% (...).” UNFPA/Sol, 1/10/2013.

Nada poderá salvar o nosso 'estado social' se perdermos quase 300 mil pessoas em vinte anos (2010-2030), se a população decair quase 37% entre 2011 e 2100 (ver tabela da ONU publicada pelo The Guardian), ou ainda se a emigração continuar ao ritmo a que tem vindo a crescer desde 1983. É preciso ter a consciência de que esta é a primeira vez na nossa história que a população deixa de crescer e atinge aparentemente um pico demográfico. Portugal, segundo a previsão da ONU terá apenas 10,3 milhões de pessoas em 2030, contra os 10.562.178 apurados no Censos 2011, e os 6.754.000 previstos para 2100, ou seja, perderá mais de 3,8 milhões de residentes nos próximos 89 anos. Basta atentar no facto de a EDP ter garantido rendas excessivas do Estado português até 2085 (ler Os Piratas da Energia), para percebermos as consequências e a inevitabilidade da rejeição frontal dos contratos criminosos assinados por José Sócrates. Quanto ao famoso 'estado social', das duas uma, ou repovoamos o país, ou a sua morte é inevitável, e nada nem ninguém poderá evitar tão triste fado.

Previsão da ONU
Sem percebermos o que vai ser dos fundos de pensões, privados e públicos, em Portugal, nenhuma estratégia de mitigação da crise sistémica em curso, nem nenhuma política de desenvolvimento, poderá ser desenhada e discutida democraticamente, e sobretudo de maneira consequente.

O terrorismo fiscal, aumentar a idade da reforma, cortar nas pensões, ou aumentar o salário mínimo nacional garantindo com tal imposição mais desemprego e maior destruição do tecido empresarial, são falsas soluções para um problema com a dimensão descrita. Eu só vejo duas vias possíveis: deixar morrer rapidamente os velhos e mais fascismo fiscal (que repudio como políticas criminosas), ou lançar um programa de repovoamento de aldeias, vilas, pequenas e médias cidades, com recurso a um programa de imigração orientada, acompanhado de uma redução clara e racional das burocracias.

Tendo em conta que a média de vida dos portugueses em 2011 era de 80 anos, boa parte dos baby-boomers (nascidos entre 1945 e 1964), em 2030, já terão desaparecido. O problema, porém, persiste, na medida em que dos 10,3 milhões de residentes que se estima virem a existir em 2030, três milhões terão mais de 65 anos — ou seja, mais 200 mil reformados e menos 300 mil residentes!

Em 2011 por cada 100 pessoas em idade activa, existiam 52 dependentes. E em 2030, como será?

Este é o lado puramente demográfico do problema. Mas há outro igualmente terrível, que um artigo publicado no Zero Hedge —“Why Your Pension Fund Is Doomed In Five Easy Charts”— explicita para o caso americano, mas que entre nós só poderá ser mais aflitivo: enquanto as responsabilidades dos fundos de pensões crescem a bom ritmo, os rendimentos das aplicações financeiras, do capital e sobretudo do trabalho diminuem.

Zero Hedge: um gráfico sobre o fim do Welfare State.

Bridgewater's Ray Dalio: “The reason why public and all other pension funds are the least discussed aspect of modern finance, is that while Bernanke has done his best to plug the hole in the asset side of the ledger resulting from poor asset returns, it is nowhere near sufficient since the liabilities have been compounding throughout the financial crisis since the two grow independently. Which means that anyone who does the analysis sees a very disturbing picture.

Indeed, while the asset side can and has suffered massively as a result of the great financial crisis, the liabilities are compounding on a base that has grown steadily. As Dalio notes, each year a growing percentage of assets are paid out in the form of distributions, leaving less assets to compound at a given return.”

Há adaptações importantes a fazer no sistema de pensões, sobretudo no plano da equidade e da limitação das responsabilidades públicas com pensões — criando limites inferiores e superiores para as mesmas (por exemplo, indexando as pensões mínimas a 80% do salário mínimo, e as pensões mais altas a 500% do mesmo salário), mantendo a idade da reforma nos 65 anos, mas permitindo a subida voluntária da mesma até aos 70 anos, favorecendo a mobilidade funcional dos trabalhadores em função da idade, etc.

É fundamental retirar este debate público do maniqueísmo partidário e sindical que tem vindo a contaminar todas as discussões sérias que o tema merece.

POST SCRIPTUM — Algumas ideias para um futuro programa de repovoamento do país:
  1. Subsídio de família, pelo período de 2 anos, para os primeiros dois filhos de cada agregado familiar, equivalente ao salário mínimo nacional.
  2. Definir uma faixa de neutralidade fiscal, energética e de telecomunicações, de 20 a 40 Km, ao longo de toda a fronteira com Espanha, por forma a que os custos de interioridade não sejam agravados pela competitividade fiscal, energética e de telecomunicações do país vizinho.
  3. Definir quotas de imigração por país de origem, idade, origem social e competência profissional, criando simultaneamente condições duradouros favoráveis à fixação de jovens famílias de agricultores, apicultores, artesãos e tecnólogos (esta medida seria suportada por uma bolsa de terrenos florestais, agrícolas e propriedades urbanas na posse do Estado e/ou não reclamadas pelos seus putativos proprietários, concedidas por períodos de 90 anos às famílias de imigrantes).
  4. Implementação de regimes fiscais preferenciais aos municípios com mais de 10 mil e menos de 30 mil habitantes por forma a estimular a agregação dos municípios mais pequenos e o dinamismo dos concelhos medianos (ver lista de município por população).
  5. Acabar com os regimes fiscais ilusórios dirigidos aos investidores de rapina e denunciar, investigar e punir os políticos corruptos envolvidos nesta negociata de espoliação.
  6. Gratuitidade absoluta para o ensino pré-primário e secundário através de transferências dos orçamentos públicos ponderadas de acordo com os custos reais e locais de cada unidade escolar pública, privada ou associativa.
  7. Liberalização dos sistemas de ensino profissional e superior, com o fim da interferência do Estado neste setor. Os bons alunos que demonstrem não ter meios económicos para prosseguir a sua formação terão direito a bolsas de estudo e liberdade total de escolha do estabelecimento de ensino, em qualquer parte da União Europeia.

domingo, setembro 30, 2012

Petróleo no Beato?

O grande impulso dado pelo petróleo ao crescimento económico e demográfico ocorre entre 1950 e 1970

A festa acabou! Precisamos de aprender a crescer devagar.

“How much uranium or thorium would be required to power an industrial civilization comparable to that now powered by the fossil fuels? And does this quantity exist in a form that is readily obtainable?”

M King Hubbert (1956)

 A humanidade só começou a aumentar de número, acima dos meio por cento ao ano, depois do aparecimento das máquinas movidas a vapor gerado sob pressão em caldeiras aquecidas a carvão.

Esta época marca também crescimentos no consumo da energia e do produto interno bruto acima dos 1%. A fase de transição do carvão e do gás (usado sobretudo na iluminação) para o uso intensivo do petróleo (1920-1940) traduziu-se numa quebra acentuada dos ritmos de consumo energético e de crescimento económico, que só cinco anos depois da Segunda Guerra Mundial (1939-45), disparam para valores nunca antes alcançados na história humana. Entre 1950 e 1970 a população mundial começa a crescer a taxas anuais próximos dos 2%, ao mesmo tempo que os consumos energéticos e a produção crescem entre 3,85% e 5,02% ao ano. Mas depois deste período que coincide com a emergência da primeira crise petrolífera, todas as três taxas de crescimento —demografia, energia e produção— entram numa fase de declínio relativo, que só a especulação financeira e o endividamento ocorridos na década passada (2000-2010) permitiram ilusoriamente inverter, com as consequências agora conhecidas.

M. King Hubbert detetou em 1956, com grande exatidão, o pico do petróleo americano: 1970-71

M. King Hubbert detetou em 1956 o pico mundial do petróleo convencional:1995-2000 (na realidade verificou-se em 2008)

A partir de meados da década de 1980, cresce mais depressa o consumo do que a a produção de petróleo (ASPO)



Colin Campbell: o pico global do petróleo e gás em todas as suas formas exploradas ocorreu em 2008

O cruzamento das informações mais recentes (2012) confirmam a data do pico global da produção de combustíveis líquidos: 2008.

O tempo e os gráficos têm vindo a confirmar sensivelmente as previsões do geólogo americano M. King Hubbert (1), sendo pouco mais do que propaganda pueril o que António Costa e Silva escreveu esta semana no Expresso sobre a corrida ao xisto (2). Mas a melhor confirmação do acerto das previsões de Hubbert são as decisões estratégicas que o governo americano então tomou:
  1. criação de uma rede de centrais nucleares espalhada pelo território americano, com início em 1957 (3);
  2. criação de uma rede de bases militares destinadas a garantir o acesso e transporte de petróleo das principais bacias mundiais até aos Estados Unidos da América e reforço da aliança diplomática e militar com Israel;
  3. fim da convertibilidade do dólar em ouro (Nixon Shock, 1971), três anos depois da formação da OPEP, e dois anos antes do Embargo de 1973, responsável pela primeira grande crise associada ao fenómeno conhecido por Pico do Petróleo;
  4. acordo entre Arábia Saudita e os EUA sobre o uso exclusivo do dólar nas transacções e denominação do preço do petróleo, a troco de apoio militar americano — dando origem ao nascimento do chamado petrodólar (1973); OPEP no seu conjunto adere ao petrodólar em troca de armamento e protecção (1975).
     
Estas quatro decisões são inteiramente coerentes com a percepção das consequências do gráfico da Fig. 21 do estudo apresentado por M. K. Hubbert — o qual veio a revelar-se de uma enorme precisão.

Uma vez reconhecidos os limites das reservas petrolíferas americanas, nomeadamente das suas reservas de petróleo barato e de boa qualidade, a decisão só poderia ter sido esta: poupar as reservas, diminuindo a extração interna, e importando cada vez mais do exterior.

Mas para chegar aqui, com a garantia de que obteriam preços razoáveis pelo crude importado, os Estados Unidos teriam que conseguir preencher dois requisitos: ter muito dinheiro disponível e proteger os investimentos que viessem a realizar em países estrangeiros ricos em petróleo. Para além dos custos de prospeção, desenvolvimento e produção, os EUA teriam ainda que garantir a segurança diplomática e militar das novas fontes petrolíferas espalhadas pelo mundo. A que preço?

Bom, ao preço de uma desvalorização progressiva da sua moeda, ainda que retardada pela imposição do dólar como moeda de reserva mundial — nomeadamente através dos acordos que conduziram ao estabelecimento do petrodólar. No entanto, os custos reais desta substituição/proteção das reservas petrolíferas nacionais não deixaram de aumentar exponencialmente desde que a percepção do pico petrolífero americano foi tecnicamente reconhecido, com a consequente e imparável inflação da massa monetária e sobretudo do agregado conhecido por M3 (Williams, 2008).

O crescimento da massa monetária M3 (sobretudo em 1970-71 e 2006-08) dá bem a ideia do grau de monetização da economia americana.

Historical inflation adjusted oil price per barrel, (Brent equivalent in 2011$), based on amounts shown in BP’s 2012 Statistical Review of World Energy. Our Finite World, 26 set 2012.

Trabalho caro e energia cada vez menos barata fazem uma combinação fatal, só parcialmente compensada pela criação de dívida através da escrituração contínua e virtual de dólares, com a qual a América garantiu ao mesmo tempo uma capacidade aparentemente infinita de importação de petróleo, e a criação de um explosivo mercado interno de consumo conspícuo, alimentado por importações crescentes, já não apenas de matérias primas, nomeadamente energéticas, mas também e cada vez mais, de bens manufacturados. A perda crescente e irreparável de empregos foi temporária e parcialmente compensada por uma espécie de burocratização e terciarização mediática da economia, alimentadas pela especulação bolsista. Em 2008, esta bolha rebentava com estrondo, ao mesmo tempo que os sinais inequívocos do Pico do Petróleo adquiriam uma dimensão mundial.

M. King Hubbert desenhou em 1956 um gráfico assustador, através do qual a abundância energética que possibilitou os "tempos modernos" aparece como um brevíssimo episódio da nossa história.

Ao contrário de Donella H. Meadows e dos demais autores de The Limits to Growth (1972), para quem os limites do crescimento podem revelar-se catastróficos se a humanidade for incapaz de corrigir os custos e as distorções da sua própria expansão demográfica, M. King Hubbert viu na indústria nuclear (4) a única saída possível e duradoura para a inexorável crise de crescimento causada pela exaustão de recursos energéticos finitos.

Enquanto a China e outras economias emergentes podem suportar preços do petróleo acima dos $100-110 (5), já nos Estados Unidos e na Europa, quando os preços sobem e se mantêm acima dos $90 as economias entram em recessão ou crescem bem abaixo dos 3%. Em sentido contrário temos os países da OPEP, que precisam de vender o barril do petróleo acima dos $80, e cada vez mais perto dos $100, sob pena de verem degradar a sua estabilidade social e política. A solução, para países como os EUA, Japão e Europa, seria pois diminuir drasticamente a dependência do petróleo. Mas como, se 70-75% do petróleo que importam vai para o sector dos transportes (80-85% nos EUA)? A migração para o transporte eléctrico é uma saída, mas vai levar tempo, pois existem mais de 800 milhões de automóveis no planeta dependentes de combustíveis líquidos!

Sabemos hoje que muitas outras ameaças colocaram a humanidade em risco de desaparecer, ou ver diminuída a sua presença no planeta em algumas centenas de milhões de almas. E se os gráficos dos crescimentos exponenciais nos ensinam algo, é que as fases de colapso são muito mais desagradáveis do que as de expansão.

A dicotomia feliz entre "esquerda" e "direita" não serve para resolver nenhum dos problemas sérios colocados pela presente crise sistémica do capitalismo, a qual é antes de mais uma crise do modelo energético, tecnológico, social e cultural de crescimento e desenvolvimento da humanidade.

Podemos encher as ruas, mas se não percebermos o que realmente está em causa, apenas agravaremos a ansiedade em que as pessoas e as comunidades já se encontram neste momento. Sem procurarmos as causas profundas desta crise, acabaremos por perder as nossas energias na busca e castigo dos bodes expiatórios.

Porque que é que deixou de haver trabalho? Porque é que o trabalho que ainda existe é caro para a economia, e ao mesmo tempo mal remunerado e precário para quem trabalha, ou até manifestamente artificial e inútil? Para que servem os impostos quando os governos aumentam cada vez mais a pressão fiscal, e prestam cada vez menos serviços?

E se for necessário crescer melhor, mas mais devagar? Estaremos preparados para voltar a partilhar a herança comum à humanidade e às outras formas de vida com quem cooperamos neste planeta?


POST SCRIPTUM, 11 out 2012

“What matters is if our hourly wage once bought eight gallons of gasoline and now it buys only four gallons. This is called purchasing power, and rather naturally the Status Quo has worked mightily to cloak the reality that our purchasing power of the bottom 95% of wage earners has been declining for decades.”

in “Energy Higher, Earnings Lower” by Charles Hugh Smith (Of Two Minds, oct 10, 2012)

Mais um gráfico que ajuda a estabelecer a correlação entre o preço da energia e os rendimentos

Três gráficos muito importantes para percebermos o impacto do preço do petróleo na deterioração dos rendimentos americanos (o caso europeu é paralelo) ao longo dos últimos 43 anos, e uma ajuda para perceber a causa das coisas, nomeadamente no que se refere à Grande Depressão em curso nos EUA e na Europa....

“Despite the improvement from 1994, real wages are around the levels reached in 1969, 43 years ago, and 1980, 32 years ago.”

Alternativas para mitigar esta tendência irreversível na deterioração económica e financeira de Portugal, causada pelo Pico do Petróleo:

1) Estabelecimento urgente de um Plano Nacional de Eficiência Energética;

2) Liberalização e estímulo do uso dos veículos a gás e dos veículos elétricos (trolleys, tram-trains, elétricos, metros, comboios);

3) Impedir os monopólios energéticos, que fornecem combustíveis líquidos para veículos automóveis, e eletricidade às empresas e lares, de porem o pé sequer no abastecimento de gás às empresas e populações!

4) Rebaixar as rendas excessivas da EDP e empresas similares, eliminando das faturas todas as alcavalas oportunistas que o estado lá enfiou;

5) Rebaixar o imposto sobre os combustíveis (o estado hipertrofiado tem que encolher!);

6) Aumentar em mais 30% a desmaterialização da administração pública no prazo de uma legislatura;

7) Criar uma Fiscalidade Verde favorável à poupança energética, penalizando ao mesmo tempo os fatores condutores da excessiva intensidade energética da economia portuguesa;

8) Prioridade absoluta ao transporte ferroviário nacional e internacional, de modo a duplicar a quota deste modo de transporte nos próximos 10 anos, e triplicá-la nos próximos 20 anos.

9) Lançamento de um programa de investigação sobre a energia nuclear baseada no tório;

10) Criar um ministério da energia com igual ascendência sobre os demais ministérios e departamentos governamentais à do ministério das finanças.

NOTAS
  1. Nuclear Energy and the Fossil Fuels, M. K. Hubbert, Presented before the Spring Meeting of the Southern District. American Petroleum Institute, Plaza Hotel, San Antonio, texas, March 7-8-9, 1956 (PDF).
  2. O artigo "A revolução energética do gás de xisto", publicado por António Costa e Silva no Expresso de 29/9/2012, parece querer apenas induzir a substituição de uma bolha que rebentou —das eólicas subsidiadas— por um nova bolha de inspiração americana —a ilusória e muito perigosa bolha do xisto! A verdade é que o gás de xisto, tal como o petróleo de xisto, são dois monumentais fracassos comerciais, embalados por bolhas financeiras especulativas que irão rebentar nos próximos dois ou três anos! Travar qualquer operação nesta perigosa e ilusória área tecnológica de negócio, em Portugal, é uma prioridade. Já ouvi falar em buracos horizontais nas imediações do Mosteiro de Alcobaça. Se é verdade, é urgente denunciar e parar este crime! Sobre a bolha de xisto, vale a pena ouvir John Hemming sobre o tema.
  3. Rede nuclear energética americana
    • 1951 — primeiro reactor nuclear experimental destinado a produzir energia eléctrica
    • 1956 — Nuclear Energy And The Fossil Fuels, by M. King Hubbert.
    • 1957 — Shippingport, Pennsylvania, primeira central nuclear comercial para produção de electricidade.
    • 1960-70 — período de expansão da energia nuclear nos EUA.
    • 1979 — Three Mile Island, Dauphin County, Pennsylvania, EUA, accidente nuclear com derretimento parcial do núcleo.
    • 1991 — EUA têm mais de 1/4 de todas as centrais nucleares do planeta em funcionamento.
  4. Apesar da tragédia nuclear japonesa de Fukushima, há quem veja futuro numa energia nuclear limpa, desde que o ciclo produtivo passe reatores de tório, em vez de reatores de urânio. A China está na dianteira desta nova corrida pela energia nuclear verde
  5. An brief economic explanation of Peak Oil, Chris Skrebowski, ODAC, Oil Drum.


Última atualização: 11 out 2012, 0:20

sábado, setembro 15, 2012

Bolha chinesa

Sany, um gigante chinês em dificuldades...

Ciclo de crescimento empinado da China, no fim?

China's Sany seeks covenant waiver on $510 million debt: Basis Point

“Unpaid bills owed to companies in China’s coal, steel and heavy machinery sectors jumped by a fifth in the six months to June as growth in the world’s second-largest economy slowed, reducing manufacturing, and demand for a range of commodities.”

Reuters, 14 set 2012

Sany, a maior empresa chinesa de máquinas pesadas, está em dificuldades. Se faltava um prova decisiva sobre a interrupção do milagre chinês, aqui está: a acumulação dos atrasos e incumprimentos dos seus clientes levaram o gigante privado chinês a pedir aos seus credores a não execução voluntária de cláusulas contratuais relativas à substituição de créditos vencidos por ativos.

Miner Fortescue's Problems Run Deep

“Other people’s money helped Australia’s Fortescue Metals become the fourth-largest iron-ore miner in the world by output. But with iron-ore prices slumping fast, US$10 billion in debt and borrowing facilities is a worryingly heavy burden.

Last week the price of ore fell below US$90 a ton for the first time since late 2009. At current prices, Fortescue cannot turn a profit, says brokerage CBA.”

The Wall Street Journal, Updated September 3, 2012, 6:45 a.m. ET

Se conjugarmos o aperto da Sany com o pandemónio que vai pelas minas sul-africanas depois do Massacre de Marikana, no qual a polícia assassinou 36 mineiros, ou ainda com as dificuldades de liquidez da quarta maior empresa mineira do mundo, a australiana Fortescue, teremos o quadro geral da recessão mundial, agravada pela monetização das dívidas americana, britânica e da UE, mas causada em primeiro lugar, embora de forma subterrânea, pelo fim inexorável do petróleo barato, e em geral pela pressão de mais de 7 mil milhões de pessoas sobre os recursos naturais —minerais, energéticos e alimentares— disponíveis.


O quadrado desconfortável...

sábado, abril 14, 2012

O mundo vai acabar amanhã

Donnella Meadows (1941-2001) na sua quinta

A nossa sociedade é insustentável e, desde 2008, ingovernável

Há uns anos atrás, mais precisamente em 1990, expus numa galeria de arte em Lisboa uma espécie de alto-relevo realizado com tubos fluorescentes verdes. Os tubos representavam as silhuetas de duas cadeiras de frente uma para a outra, a uma distância de alguns metros. Ao alto e entre as mesmas lia-se uma frase: O MUNDO VAI ACABAR AMANHÃ!

O título desta alegoria é Os Dois Filósofos. A frase é simultaneamente falsa e verdadeira. Para quem morre, o mundo acaba (é o ponto de vista subjectivo), mas para quem está vivo, o mundo continua (é o ponto de vista objectivo). As cadeiras estão vazias, assinalando desta forma a natureza puramente teórica e lógica da aporia. Nenhum filósofo e todos os filósofos estão, por assim dizer, sentados alternadamente numa ou noutra das cadeiras. O conteúdo da obra será relativo, mas a sua forma, pelo contrário, tal como a proposição que exibe, é absoluta.

Vem esta divagação cultural a propósito da gigantesca crise em que estamos mergulhados em Portugal, na Grécia, em Espanha, na Itália, no Reino Unido, nos Estados Unidos, e em breve também em França, na China, na Alemanha, etc. Este colapso começou por ser financeiro, mas neste momento alastra como um fogo sem fim pela pradaria humana do planeta, ameaçando minar as suas bases económicas e os próprios regimes políticos. Tal como quando a monarquia francesa caia aos bocados, e Maria Antonieta recomendava que dessem croissants ao Povo, pois faltava o pão, também hoje assistimos incrédulos à notícia do quadril partido do rei de Espanha durante uma caçada de elefantes no Botswana — na mesma semana em que o seu reinado esteve a beira do precipício financeiro e do colapso social!

No entanto, todos ralham e ninguém tem razão, ou pelo menos toda a razão.

O endividamento mundial é simultaneamente público e privado, tem origens especulativas, mas também deriva dos populismos eleitorais, ou, pelo contrário, do esforço desesperado dos fundos de pensões, para contrariar a queda imparável dos rendimentos das poupanças por efeito da destruição suicida das taxas de juro.

Esta crise, sobre a qual já ninguém se entende, é uma consequência antecipada do que M. King Hubbert prognosticou em 1956 (o Pico do Petróleo), e  Donella Meadows e a sua equipa previram no tão célebre à época quanto esquecido depois The Limits to Growth (1972), isto é, que a exaustão dos recursos e o crescimento exponencial da economia e população mundiais se cruzariam algures entre 2030 e 2050, daí resultando, se nada fosse entretanto acautelado, o colapso da civilização industrial e pós-industrial e a vida como a conhecemos, sobretudo no Ocidente, ao longo dos últimos cem anos —numa história cuja escrita tem mais de sete milénios.

Tenho pois más notícias para todos vós. Eram conhecidas, mas a iliteracia da maioria dos humanos, incluindo economistas e políticos, impediu-nos de ouvir e ver a realidade dos factos e das projeções matemáticas. Talvez o desenho animado There's No Tomorrow, na mesma linguagem iconográfica e oral que serviu para vender os tempos modernos e o sonho americano, nos acorde a todos para a dura realidade.



Como escreveu Edward Hugh, em Portugal Gradually Shuffles Its Way Towards the Front of the Debt Queue, não conseguiremos debelar o nosso grave endividamento privado, público e externo antes de 2016 se não crescermos, pelo menos, a 3% ao ano.

(…) debt dynamics are (other things being equal) quite dependent on economic growth rates. Just how dependent can be seen from the chart below, prepared by Jürgen Michels and his team at Citi. As can be easily seen, it only needs a growth rate of one percentage point on average below the troika baseline scenario for debt to be sent uncontrollably upwards, and the more the average growth rate deviates downwards the more rapidly debt rises.

Mas esta é precisamente uma taxa de crescimento muito elevada se a colocarmos no mapa do crescimento mundial. Basta reparar como qualquer pequeníssimo sinal de retoma do crescimento nos Estados Unidos, na Europa, ou de regresso da China a taxas anuais acima dos 9%, ou ainda o mínimo sinal de instabilidade política nas zonas petrolíferas, faz disparar os preços do petróleo e a inflação para níveis pré-explosivos!

A inflação vai chegando, aliás, aos bolsos de cada um, não só pela via da subida dos preços da energia e dos bens alimentares, como sobretudo e cada vez mais por uma desvalorização silenciosa do dinheiro, bem como pela perda de rendimentos diretos e indiretos.

Estamos numa encruzilhada fatal. Mas enquanto não a reconhecermos, diminuirão também as possibilidades de evitarmos o pior :(

sábado, julho 09, 2011

O fim de uma era

Verão 2011: depois do sonho, um pesadelo inesperado - I



A corrida espacial foi iniciada pelos russos e tudo leva a crer que serão os últimos a fechar a porta. Mais de 8000 despedimentos, directos e indirectos, são esperados na NASA. Até que a promessa de Obama, à laia de compensação, se cumpra —levar os americanos a Marte e a mais um asteróide qualquer— a América andará à boleia do vai-e-vem russo, fazendo ao mesmo tempo muitos votos para que o turismo espacial arranque!

É possível que os bilionários globais do futuro ganhem massa crítica suficiente para sustentar um tal negócio imbecil. Tenho, porém, sérias dúvidas de que tal venha a ocorrer. O que na realidade este último lançamento da nave espacial Atlantis assinala é o fim de uma era e o prenúncio de uma longa e desconhecida crise social à escala planetária, de que o colapso do sistema financeiro mundial, em curso desde 2007-2008, é o epifenómeno.

As causas deste colapso são de ordem sistémica, sendo por isso impossível travar semelhante derrocada. Ao longo dos últimos duzentos anos a humanidade cresceu demais, envelheceu e tornou-se uma espécie predadora perigosa para todas as demais formas de vida, à excepção das bactérias e dos vírus, além de assustadoramente autofágica. O empinar da sua longa curva de crescimento demográfico deveu-se principalmente ao descobrimento e aproveitamento tecnológico de três fontes de energia abundantes e baratas até meados da década de 1970: o carvão, o petróleo e o gás natural. Mas à medida que, por um lado, o consumo humano das reservas energéticas, dos recursos minerais e dos solos vivos da Terra crescia exponencialmente, acompanhando a explosão demográfica e o enriquecimento de uma parte da humanidade, por outro, estas mesma base finita do desenvolvimento desigual cedo começaria a dar sinais de esgotamento.

Lentamente, entre 1973 e 2007, até chegar ao pára-arranca actual da economia mundial, as previsões de Thomas Malthus, M. King Hubbert, Rachel Carson, do trio Donella Meadows, Jorgen Randers e Dennis L. Meadows, ou ainda do médico, ornitólogo e ambientalista Jared Diamond, ganharam uma actualidade crítica dificilmente disputável. As subidas dos custos da energia fóssil afectam imediatamente o crescimento, obrigando este a ajoelhar até à recessão; a recessão baixa temporariamente o preço do petróleo, até que a economia dá sinais de melhoria, mas à medida que estes sinais se traduzem em mais encomendas de matérias primas e consumo humano à escala global, a pressão da procura sobre as reservas energéticas acaba por reenviar as economias para taxas de crescimento anémicas e para a estagnação, provocando finalmente novas recessões. Mas ao contrário deste sobe-e-desce, o desemprego, a falta de emprego, a inflação real e a perda imparável do poder de compra da esmagadora maioria das pessoas, de que a destruição das classes médias no Ocidente é um sinal mais do que evidente e dramático, instalaram-se como os novos e reveladores invariantes do declínio cada vez mais evidente do paradigma de desenvolvimento humano decorrente do abuso sem precedentes das riquezas naturais disponíveis à face da Terra.

Sem este cenário de fundo corremos o risco de ir simplesmente atrás da espuma dos dias e das intrigas palacianas a que a propaganda mediática se entrega como sua própria condição de sobrevivência.

À medida que os salários e em geral os custos sociais do trabalho foram aumentando nos Estados Unidos e na Europa, sobretudo após a guerra mundial de 1939-1945, a par de uma subida paulatina dos preços da energia, das matérias-primas e dos alimentos oriundos das antigas colónias americanas, asiáticas, do Médio Oriente e africanas, as economias ocidentais, embora muito competitivas e produtivas no interior dos respectivos países e alianças de comércio livre, viram baixar drasticamente a competitividade das suas exportações para o resto do mundo. As mesmas moedas fortes —o dólar, a libra inglesa, o franco suíço e o marco alemão— que serviam para controlar os preços das importações de preciosos recursos oriundos dos países pobres, manipulando-os enquanto pareciam sem fim, impediam as nações mais fracas de aceder às manufacturas cada vez mais tecnológicas do Ocidente.

A opção dos Estados Unidos e da Europa foi então, sobretudo depois da longa crise económico-financeira que vai do colapso de 1929 até ao fim da Segunda Guerra Mundial, expandir a procura interna e o consumo popular nos seus grandes espaços económicos. Mas para atingir este desiderato, a principal medida de estratégia económica e financeira adoptada foi expandir consistentemente a oferta e a circulação monetárias, aumentando ao mesmo tempo para níveis sem precedentes em tempo de paz os tectos do endividamento público. O chamado deficit spending não nasceu, portanto, neste século, mas com o New Deal (1933-1936) de Roosevelt, e com o Plano Marshall (1948-1951).

O que aconteceu entretanto foi que esta estratégia deixou, sobretudo a partir da década de 1960 (por alturas da formação da OPEP), de assentar num certo equilíbrio entre produção e consumo, passando a estar ancorada cada vez mais na combinação fatal entre dois tipos de inflação inusitada: a inflação do consumo (elevada entretanto a uma verdadeira cultura do consumo conspícuo), e a inflação do crédito, conseguida através do abandono do padrão ouro e de uma imparável política de diminuição das taxas de juro. Mas os preços crescentes das matérias primas solicitadas por uma demografia planetária em crescimento explosivo, apoiada nos equilíbrios diplomáticos saídos da derrota da Alemanha (bipolarização EUA-Europa versus URSS, ou EUA-Europa versus URSS+China), começaram a erodir de forma grave as expectativas de lucro das empresas e dos investidores ocidentais, tornando-os cada vez mais sensíveis aos custos directos e indirectos do trabalho que dentro dos EUA e na Europa esmagavam de forma imparável as suas margens de lucro. Numa primeira fase, Washington, Londres e Berlim começaram a abrir as suas fronteiras aos produtos industriais —nomeadamente os automóveis, máquinas e material electrónico em geral— muito mais baratos, oriundos do Japão. Depois abriram-se aos produtos coreanos, e finalmente aos chineses. A fase seguinte, na realidade uma decisão fatal, foi a imposição estratégica do processo da globalização comercial e financeira, promovendo através desta destruição das barreiras alfandegárias à escala mundial, três processos destinados a atrasar o declínio social do Ocidente, sem atacar verdadeiramente as suas causas:
  1. transferência dos processos produtivos, tecnologias e marcas para os países de trabalho barato, ausência de regras e moedas subavaliadas;
  2. aumento exponencial da disponibilidade de liquidez no sistema financeiro, nomeadamente através da diminuição deslizante dos rácios de solvabilidade dos bancos e sociedades de investimento não reguladas —ver aqui a longa série (1975-2011) do stock de moeda da Reserva Federal, conhecido por M1;
  3. criação de produtos derivados financeiros cada vez mais complexos, com o objectivo inconfessável de expandir até limites inimagináveis a capacidade de endividamento das antigas potências coloniais: o valor nocional do mercado de derivados financeiros OTC era em Dezembro de 2010 de aproximadamente 10xPIB mundial (BIS).
Resumindo: a humanidade, liderada por um Ocidente irresponsável, atingiu o planalto insustentável de três curvas de exaustão: o Pico do Petróleo, o Pico Demográfico e o Pico da Liquidez Especulativa. Para sair daqui não bastam os Memorandos de Entendimento com o FMI, o BCE e a Comissão Europeia. É preciso muito mais!

(continua)

quinta-feira, janeiro 06, 2011

O pico da tragédia

Não é preciso lançar o pânico. Mas é preciso uma solução

A China extrai 95% da produção mundial de metais raros, e já começou a açambarcar e a restringir as exportações — Telegraph.

Bens alimentares batem preços recordes em todo o mundo
Os preços dos bens alimentares atingiram em Dezembro um máximo histórico por todo o mundo, alertou ontem a FAO, a organização das Nações Unidas para a agricultura e alimentação. O índice que reúne 55 matérias-primas alimentares negociadas nos mercados internacionais subiu em Dezembro para 214,7 pontos, o valor mais elevado desde a criação desta série estatística em 1990. O anterior recorde (213,6 pontos) remonta a Junho de 2008, em plena crise de alta de preços dos bens alimentares, o que gerou uma vaga de protestos nos países mais pobres de África e Ásia. O açúcar e o milho foram os que mais encareceram. A FAO alertou ainda que "continua a existir potencial para os preços dos cereais subirem". — DN, 6 jan 2011.

Rare Earths: China´s not-so-secret secret weapon
"… Without an immediate fix of China rare earths,  Japan´s automotive, electronic, military, scientific, medical and even green industries  were suddenly facing  imminent collapse." — Alan Parker, Toronto SUN, Thursday, January 6 2011.

World faces hi-tech crunch as China eyes ban on rare metal exports
Beijing is drawing up plans to prohibit or restrict exports of rare earth metals that are produced only in China and play a vital role in cutting edge technology, from hybrid cars and catalytic converters, to superconductors, and precision-guided weapons. — Ambroise Evans-Pritchard, Telegraph, 24 Aug 2009.

Pico Alimentar: tenho insistido, de acordo com um número crescente de analistas e de observadores sérios, no estado objectivo de emergência para que caminhamos todos. A convergência entre o Pico Petrolífero, o Pico Demográfico e o Pico Alimentar, de que o Buraco Negro dos Derivados Financeiros e a crise sistémica financeira mundial são epifenómenos, imporá inevitavelmente uma dramática desorganização social nas várias escalas da organização humana: global, regional, nacional, e local.

Consequências a curto prazo: à medida que os países produtores de matérias primas (nomeadamente energia, minerais convencionais e raros, e cereais) se forem apercebendo dos sinos da escassez, interromperão ou condicionarão drasticamente as exportações.

A China já o anunciou relativamente às terras ou metais raros, o México deixará de exportar petróleo dentro de um ou dois anos, seguir-se-à a Venezuela e o Brasil, e quando isto acontecer o Médio Oriente e o Mar Cáspio formarão o vórtice explosivo das actuais e já muito graves tensões estratégicas mundiais. Ou a guerra permanente, ou uma divisão do mundo em grandes regiões de influência —com o consequente fim da globalização e o regresso a novas formas, porventura mais articuladas, de proteccionismo—, são inevitáveis.

Novo Tratado de Tordesilhas: a ideia de um Novo Tratado de Tordesilhas, que há muito defendo, pode tornar-se em breve inevitável. Só falta imaginar a geografia desta divisão — uma tarefa nada fácil, e que exigirá muita imaginação, que é coisa que escasseia nos toutiços da esmagadora maioria dos actuais dirigente políticos mundiais. Desde logo, uma Europa de Lisboa a Vladivostok é o que mais convém à Eurásia. Só uma Alemanha de novo irracional e suicida poderia deixar-se provocar pelo eixo anglo-americano que, uma vez mais tenta encurralar Berlim, atacando em várias frentes. A guerra contra o euro é presentemente a mais encarniçada e perigosa de quantas os serviços secretos norte-americanos, ingleses e israelitas têm entre mãos!

Morte deste regime e refrescamento partidário: entre nós, portugueses, é fundamental que os responsáveis políticos e cidadãos atentos olhem para a realidade com olhos de ver. A proliferação de candidatos presidenciais anti-sistema (1) é um sinal claro de que o regime está podre e precisa urgentemente dum refrescamento partidário e institucional (regras simples mas eficazes anti-corrupção, fim das mordomias inaceitáveis de que gozam a generalidade dos agentes político-partidárias e a burocracia de topo, restrição da acção do Estado ao que é essencial e socialmente justificável, libertação da sociedade civil, baixa imediata da carga fiscal sobre o trabalho e as empresas, etc.)

Um novo partido: é necessário, pelo menos, mais um partido político, formado por dissidentes da nomenclatura actual, mas para onde confluam rapidamente caras novas, e sobretudo a imensa juventude qualificada deste país, estrangulada pela situação objectiva e pelo populismo demo-burocrático dominante. Esta juventude licenciada, com os seus mestrados e doutoramentos, que hoje tem que mentir diariamente sobre a suas qualificações (não como Sócrates, que as empolou fraudulentamente, mas auto-diminuindo os seus CVs, por imposição do desqualificado tecido empresarial existente), quando perceber que o mercado da emigração está esgotado, fará a diferença. Mas precisamos de criar muito rapidamente o contexto partidário e de cidadania activa capaz de acolher esta energia explosiva em formação.

Esquerda-Direita: esta dicotomia, há muito esgotada, é o principal véu que cobre a mentira da nossa sociedade. Por baixo existe um sórdido regime de corrupção e burocracia que é preciso desfazer e substituir por uma verdadeira democracia. A democracia que temos é cada vez mais uma democracia formal, institucional, burocrática, endogâmica, nepotista, cabotina, populista, autoritária e profundamente irresponsável, ignara e incompetente. Curar uma tal monstruosidade não vai ser tarefa fácil. Mas se o não fizermos, o corpo que esta minocracia parasita morrerá da sangria imparável que lhe vem sendo infligida há décadas.

História: Durante todo o século 18 Portugal "importou" 850 toneladas de ouro do Brasil. Quando as estourou, nomeadamente na sequência da resistência às invasões Napoleónicas, e da independência do Brasil, expropriaram-se as Ordens Religiosas, o país foi à falência, assassinou-se o rei, e a I República concluiu o festim mergulhando de novo Portugal na bancarrota. Salazar e a sua ditadura refizeram as finanças públicas, voltando a encher os cofres de ouro (em 1974 existiam 865,936 toneladas de ouro), desta vez vendendo volfrâmio a ambos os contendores da segunda grande carnificina mundial, e explorando os quase escravos moçambicanos que eram enviados para as minas de ouro da África do Sul. Após o colapso político da ditadura e a perda do que existia ainda do império colonial (1974-1999), Portugal entrou outra vez no caminho da bancarrota, desta vez ao som de uma democracia de telenovela.

Desde 1974, os respeitáveis governadores do Banco de Portugal foram vendendo paulatinamente o ouro que tínhamos, em nome da democracia, claro! Venderam-se 483,396 toneladas, restando agora nos depósitos da Reserva Federal americana (local para onde Salazar enviou, à cautela, o metal precioso) qualquer coisa como 382,540 toneladas (resta saber se algum deste ouro se encontra ou não comprometido em SWAPS)

Menos mal que a venda do que resta do nosso ouro já não depende apenas da leviandade do regime, mas precisa de aprovação superior do BCE!

NOTAS
  1. Ao contrário do que dizem os "analistas" políticos ao serviço das agendas mediáticas da nomenclatura, todos os candidatos anti-sistema são bons, e é fundamental votar em qualquer deles: Defensor de Moura, Fernando Nobre e José Manuel Coelho. Os outros são farinha estragada do mesmo saco. E a abstenção não chega!