quarta-feira, agosto 08, 2012

Espanha, uma bomba-relógio

Este é porventura o mapa mais terrível da Europa em 2011 :(

Cortar o rabo (Espanha) e duas orelhas (Grécia e Irlanda) à Europa, só depois de morta!

It's also interesting to see how unemployment often does not follow national borders. Northern Italy, for example, seems to have more in common with the German-speaking area of Europe than with southern Italy. Sometimes, however, the national borders make a big difference, e.g. between Spain and Portugal. The European Unemployment Map, in Flute Thoughts (2012-08-07).

Se a Alemanha deixar cair a Grécia, acender-se-à o rastilho de uma verdadeira bomba-relógio chamada Espanha. É que em cima das dívidas que não param de crescer e aparecer de onde declaradamente não existiam —por exemplo, da rica Catalunha e da flamejante Comunidade Valenciana— o explosivo nível de desemprego no país vizinho mostra que o paraíso das autonomias que o mundo conheceu nas últimas três décadas poderá, de um orçamento de estado para o outro, desaparecer. O mapa dramático do desemprego é o mapa de uma Espanha de novo dividida em duas, onde a Esquerda e a Direita continuam a expor feridas dolorosas que não cicatrizam.

Longe vá o agoiro, mas à medida que a situação piora, e não tem deixado de piorar desde 2008, a nossa apreensão, enquanto país cujo grau de aproximação económica, financeira e cultural a Espanha nunca foi tão intensa, só poderá aumentar. Alguns dos meus grandes amigos são espanhóis, da Galiza, da Extremadura, das Astúrias, de Madrid, de Sevilha, de Barcelona. Temo, com eles, o que aí vem.

Sabemos todos que as mudanças democráticas na Ibéria (como na Grécia) foram superficiais, que debaixo das novas formas institucionais democráticas, o estado autoritário das elites financeiras sem concorrência, das elites rendeiras, das burocracias familiares, das corporações empresariais, profissionais e sindicais, continuou estruturalmente intacto, apesar dos novos sistemas representativos adoptados depois das quedas das ditaduras e ditadores nos idos anos setenta. Os partidos políticos, depois de capturados pela velha cultura das encomiendas, tornaram-se os novos veículos de uma inércia institucional antiga, de onde os velhos poderes não só não foram arredados, como cresceram em poder e sofisticação.

Em Portugal, por exemplo, o espírito medieval da espoliação plasma-se ainda e escandalosamente no modo quase pueril como os corruptos governos da indigente e demo populista democracia que temos encarregam o quase monopólio que fornece energia ao país —a EDP— de cobrar impostos dissimulados e taxas através das faturas emitidas mensalmente aos seus clientes. Que a EDP seja hoje uma empresa maioritariamente controlado pelo estado chinês não preocupa nada a burguesia compradora local, quem nos governa, e muito menos os narcisos partidários que diariamente se exibem nos múltiplos canais de propaganda do regime.

Não vale pois a pena esconjurar os males históricos que persistem e que são nossos, a nossa comum menoridade institucional, isto é, a falta de verdadeiras democracias na Ibéria, com teorias da conspiração sobre a Alemanha, de quem esperamos como coisa natural, que não é, a qualidade, robustez e fiabilidade dos seus produtos. E já agora não convém esquecer que a Alemanha é a última interessada na expulsão dos PIIGS. Seria preciso que as elites corruptas, o atavismo burocrático e as corporações oportunistas destas democracias enviesadas fossem completamente imutáveis para que tamanho desastre se tornasse inexorável. Por enquanto existem forças de mudança que podem fazer a diferença.

Uma explicação clara sobre o interesse alemão na defesa do euro e da unidade europeia decorre da sua dependência do grande mercado interno comunitário. Este, a transformar-se num mercado externo, acabaria por prejudicar seriamente as exportações alemãs. Como escreve Charles Hugh Smith, “Germany [...] aligned its largest import market, Europe, with its own currency.”

Mais esta citação:

There is a terrible irony in export-dependent nations being viewed as “safe havens.” Their safe haven status pushes their currencies higher, which then crushes their export sector, which then weakens their entire economy and stability, undermining the very factors that created their safe haven status.

As long as Germany stays within the Eurozone, Japan is the primary example of this dynamic. Should Germany leave the euro and return to its own currency, it too will begin orbiting the financial black hole of declining exports driven by a strengthening currency in a global recession.

Charles Hugh Smith
While All Eyes Are on Europe, Japan Circles a Black Hole (August 7, 2012)

Os que genuinamente lutaram contra as ditaduras e desejaram a democracia na península ibérica já não têm forças suficientes para lutar. E os mais novos, que julgam viver em plena e saudável democracia, acabam de descobrir, espantados, uma realidade inesperada que mal conseguem perceber e contra a qual ainda não estão preparados para lutar. É aliás mais provável que emigrem antes de pensarem mudar os estados falhados onde afinal viveram até agora sem o saberem.

Esperam-nos a todos tempos difíceis. Mas por enquanto, repito, ainda existem algumas forças de mudança que podem fazer a diferença. Assim as saibamos reunir!


Última atualização: 8 agosto 2012 10:03

2 comentários:

Karocha disse...

Caro António Maria

Ele há anos, que ouço o meu rapaz dizer que a Espanha era uma "Bomba relógio" para Portugal!!!

Vera Tanger disse...

Como é possível ter-se chegado a este estado em tantos países ao mesmo tempo.... Dá que pensar.