terça-feira, maio 29, 2012

A caminho da Grécia?

Lisboa deveria seguir o exemplo de Pequim, para não morrer de pobreza e estupidez

Precisamos de duas cidades-região: Lisboa e Porto

Governo exige impostos e taxas no máximo a câmaras em ruptura
O Governo quer obrigar as cerca de 70 autarquias em situação de ruptura financeira a aumentar todos os impostos municipais e taxas para níveis máximos, como condição para aceder à linha de financiamento de mil milhões de euros destinada a pagar as suas dívidas de curto prazo. O acordo foi ontem firmado entre o Governo e a Associação Nacional de Municípios e estabelece ainda que, para se candidatarem, as autarquias devem desistir de processos que tenham interposto ao Estado — in Negócios on-line, 29-05-2012 0:09.

Tal como o Negócios tinha também já avançado, na retenção do IMI houve recuo do Governo: os 5% já foram retidos nas transferências efectuadas este mês. Os municípios conseguiram, porém, assegurar que a verba adicional de IMI, resultante da reavaliação de imóveis, fica mesmo nos cofres das câmaras. Em causa estão 250 milhões de euros — in Negócios, 28-05-2012 20:48.

Em vez de exigir a reforma imediata dos maus hábitos autárquicos, o fim de empresas municipais manhosas, das comissões por baixo da mesa, das mordomias, dos automóveis de alta cilindrada, e de outras palermices ruinosas, o Relvas exige, vejam só, que se aumente a carga fiscal sobre os indígenas municipais! É caso para suspirar... se estes continuarem embasbacados com a "a nossa seleção", encolhendo uma vez mais os ombros a propósito das coisas que deveriam chamar a sua atenção, terão o que merecem :(

Se não impusermos, por imperativo democrático, poupança, regras de transparência e competência de gestão aos autarcas, e não forçarmos em lei uma supervisão sistemática dos gastos municipais, serão os nossos credores a fazê-lo. Se este governo pensa que pode ensinar os dez milhões de burros que pagam impostos a não comer, nem beber, desengane-se. À medida que forem perdendo peso, pagarão menos impostos, e depois de mortos ainda custarão, pelo menos, um caixão cada um!

O ministro Miguel Relvas é um cadáver adiado. Logo Passos de Coelho, das duas uma, ou o substitui ou não terá qualquer reforma autárquica, nem privatização da RTP, nem coisa nenhuma daqui para a frente, a não ser dores de cabeça que irão aumentar até se tornarem insuportáveis.

O governo deve desenhar com os deputados a inadiável reforma autárquica de uma ponta à outra, em vez de mercadejar remendos de merceeiro aos alcaides ("...as autarquias devem desistir de processos"). E deve discuti-la no parlamento e nas autarquias, e deve promover o debate público sobre o tema, e deveria mesmo levá-la a referendo. Se o povo não quiser racionalizar a administração local, então pagará do seu bolso o preço do imobilismo e da ignorância. O exemplo grego está aí para todos vermos como vão ser os futuros estados falhados da Europa.

O principal da reforma autárquica deve começar pelas regiões de Lisboa e do Porto, e não pelas freguesias rurais! É em Lisboa e no Porto que se deve eliminar a principal gordura autárquica, fundindo freguesias, e sobretudo criando duas cidades-região como são hoje todas as grandes cidades que funcionam bem: Londres, Paris, Pequim...

No caso de Lisboa, o ponto de partida deveria ser o regresso ao conceito de uma cidade-região decalcada do mapa da antiga Região de Lisboa e Vale do Tejo, o qual só foi abandonado para efeitos estatísticos e de angariação de fundos do QREN (por causa do embuste aeroportuário da Ota?).

Esta cidade-região seria, como a de Paris, ou a de Pequim, organizada em anéis ou semi-circulares, de Lisboa para a Grande Lisboa e desta para a região de Lisboa, marcada por dois grandes rios: o Tejo e o Sado. Uma assembleia com 50 deputados, um por cada um dos concelhos, um executivo formado por um presidente e nove vice-presidentes, e 30 ou 40 unidades técnicas de gestão (Pequim tem 47), dariam coerência, riqueza conceptual, coesão, e grande força democrática às decisões estratégicas. As freguesias da cidade-região deveriam reunir-se anualmente em congresso, tecnicamente bem assessorado, com a missão clara de reforçar o exercício local da democracia e garantir um desenvolvimento equilibrado de todo o território municipal. A poupança, a eficiência e a capacidade de idealizar e desenhar a nova metrópole sustentável (urbana, suburbana e rural) para o clube das grandes cidades-região polinucleares mundiais seria quase imediato. Numa década a criação das cidades-região de Lisboa e do Porto, marcadas pela sua história e urbanidade, mas também pelos seus estuários e pelas suas cuidadas zonas e riquezas agrícolas mudariam radicalmente a performance estrutural do país.

Pequim é assim (LINK):

I — Cidade antiga (da Cidade Proibida até ao 2ª anel)
  • Xicheng: 46,5 km2; 1.243.000 hab.; 26.731 hab./km2
  • Doncheng: 40,6 km2; 919.000 hab.; 22.635 hab./km2
II — Zona urbana entre os 2º e 5º anéis
  • Haidian District: 426.0 km2; 3.281.000 hab.; 7,702 hab./km2
  • Chaoyang District: 470,8 km2; 3.545.000 hab.: 7.530 hab./km2
  • Fengtai District: 304,2 km2; 2.122.000 hab.; 6.043 hab./km2
  • Shijingshan District: 89,8 km2; 616.000 hab.; 6.860 hab./km2
III — Subúrbios urbanos próximos (6º anel)
  • 7.490 km2; 6.322.000; 844 hab./km2
IV — Subúrbios exteriores e áreas rurais
  • 7.947,9 km2; 1.574.000; 198 hab/ km2
Cidade-região
  • 16.815,8 km2; 23.452.000 hab.; 1.395 hab./km2

Lisboa é assim (segundo o modelo LVT):

Mapa da cidade-região de Lisboa (LVT)
ampliar

I — Lisboa
  • 83,84 km2; 547.631.000 hab.; 6.531,9 hab./km2
II — Área Metropolitana de Lisboa
  • 2.940 km2; 2.819.000 hab.; 959 hab./km2
III— Região de Lisboa e vale do Tejo
  • 11.741 km2; 3.664.000 hab.; 312hab./km2

Comparando as superfícies das duas cidades-região, nem sequer são tão díspares quanto se poderia supor. Pequim tem cerca de dezassete mil quilómetros quadrados, enquanto a região de Lisboa tem quase doze mil. Onde as diferenças resultam muito fortes é nas sucessivas áreas densa ou mediamente urbanizadas e na densidade populacional de cada uma das cidades.

Esta comparação com Pequim serve apenas de exemplo do exercício que é preciso fazer, e do que deve fundamentar as discussões e as decisões políticas. Em vez da gritaria parlamentar, sempre esvoaçando por cima da espuma da realidade, ou destas reuniões caricatas entre autarcas sabidos e ministros tão ambiciosos quanto desastrados, precisamos de discussões adultas sobre os problemas.

Portugal está a um ou dois passos de entrar no clube dos estados falhados da Europa. Haverá alguém capaz de explicar a gravidade da situação ao rapaz que o PSD colocou a representar o papel de primeiro ministro de Portugal?

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